PF: Por que a operação de ontem complica Bolsonaro

Surgiram indícios claros de que ABIN paralela, de Ramagem, alimentava as articulações golpistas e as milícias digitais – além de espionar autoridades e jornalistas. Por isso, dados das investigações foram compartilhados. Era isso que o bolsonarismo temia

Por Leonardo Miazzo, em Outras Palavras/CartaCapital

A operação deflagrada nesta quinta-feira 11 pela Polícia Federal na investigação sobre o suposto esquema de monitoramento ilegal por meio da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, tem o potencial de deteriorar a situação de Jair Bolsonaro (PL) e de militares de alta patente.

A PF pediu ao ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes o compartilhamento de provas produzidas em outras três investigações que se converteram em uma dor de cabeça para Bolsonaro: os inquéritos das fake news, dos atos antidemocráticos e das milícias digitais. Moraes acolheu a solicitação.

Os investigadores apontam uma conexão entre os procedimentos. Segundo a PF, as ações clandestinas da Abin Paralela situam-se, potencialmente, “no nexo causal dos delitos que culminaram na tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito”.

Um parecer da Procuradoria-Geral da República endossa essa tese, sob o argumento de que a estrutura infiltrada na agência seria “apenas uma célula de uma organização criminosa mais ampla, voltada ao ataque de opositores, de instituições e de sistemas republicanos”.

A PGR diz especificamente que a atuação dessa organização não se restringia aos episódios relacionados à Abin, “mas que poderia ecoar em outros procedimentos investigatórios”.

Moraes, por sua vez, concordou com essa avaliação e enfatizou, com base no trabalho da PF, que uma organização criminosa utilizou sistema de inteligência da Abin para espionar autoridades que poderiam, em tese, se opor aos interesses do Núcleo Político do esquema, além de monitorar pessoas à frente de investigações contra familiares de Bolsonaro.

Assim, de acordo com o ministro, diante do “escopo de questionar a credibilidade do sistema eleitoral, verifica-se a existência de conexão probatória entre a presente investigação e os procedimentos investigatórios que tramitam nesta Corte“.

A nova operação sobre a possível arapongagem também é uma má notícia — simbólica e juridicamente — para militares graúdos. A decisão de Moraes proíbe o contato dos alvos da ação desta quinta com os investigados na petição relacionada à conspiração golpista de 2022. Entre eles, estão:

  • Jair Bolsonaro;
  • o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos;
  • o ex-comandante do Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira;
  • o general e ex-ministro Augusto Heleno, a quem a Abin se subordinava; e
  • o general e ex-ministro Walter Braga Netto.

A investigação sobre a trama golpista de 2022 está em vias de terminar, conforme demonstrou CartaCapital. Neste caso, a PF pode colar em Bolsonaro os crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa.

Além disso, o relatório em que a PF indiciou o ex-presidente por três crimes no caso das joias sauditas menciona cinco vezes uma “tentativa de golpe de Estado”.

Nota-se, portanto, que a PF avalia haver uma ligação concreta entre diversos casos protagonizados por Bolsonaro e integrantes das Forças Armadas. A PGR, instituição à qual cabe o eventual oferecimento de denúncia, poderá ou não seguir essa linha.

Em última instância, recairá sobre o Supremo, sob forte de influência de Moraes, julgar esse emaranhado de processos. A prevalecer o entendimento de que os casos guardam uma profunda conexão entre si, o cerco sobre Bolsonaro tende a se fechar em várias direções.

Imagem: Luciano Salles / TaquiPraTi

 

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