Quilombo Porto Velho sofre com a ação de garimpeiros clandestinos e empreendedores autorizados pelo governo federal
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública para proteger o quilombo Porto Velho, localizado entre as cidades de Itaóca e Iporanga (SP), do avanço da mineração sobre o Vale do Ribeira. O território da comunidade tradicional é cobiçado por empreendedores do ramo que, de maneira oficial ou clandestina, vem estabelecendo lavras e atividades de pesquisa na área. A ação do MPF tem como alvos a União, a Agência Nacional de Mineração (ANM) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
As investidas dos mineradores no quilombo Porto Velho contrariam leis, normas e tratados internacionais que resguardam a autodeterminação de comunidades tradicionais e a necessidade de que esses grupos sejam consultados previamente sobre qualquer atividade com potencial de interferir em seu modo de vida. Boa parte dessas violações passa pela ANM. A autarquia vem conduzindo procedimentos administrativos de concessão e autorização de lavras e pesquisa minerária no território quilombola sem cumprir as exigências legais para isso.
Na ação, o MPF pede que a Justiça Federal determine a imediata suspensão de todos esses procedimentos. Segundo a ANM, há quatro casos em tramitação na agência para exploração e pesquisa em áreas sobrepostas ao território do quilombo Porto Velho, relacionados à extração de calcário, minério de ouro e areia. Além de desrespeitar a legislação, o prosseguimento das atividades configura descumprimento de uma sentença que, a pedido da Defensoria Pública da União, já havia proibido a ANM de emitir novas autorizações se os direitos dos quilombolas não fossem assegurados.
Também em caráter liminar, o MPF quer que a União seja obrigada a realizar, por meio do Ibama, uma análise pericial dos danos socioambientais que a mineração causou ao quilombo. A avaliação deve considerar a contaminação do solo, de lençóis freáticos e de cursos d’água, os prejuízos à fauna local e os impactos sobre o modo de vida dos quilombolas. Segundo os pedidos do MPF, a ordem judicial deverá ainda determinar à União e ao Ibama o reforço da fiscalização sobre a área para a coibição do garimpo clandestino.
Ao final da tramitação do processo, o Ministério Público requer que a União e a ANM sejam condenadas a, entre outras obrigações, pagar indenização por danos morais coletivos de pelo menos R$ 1 milhão, valor a ser aplicado em projetos e iniciativas que se revertam em benefícios ao próprio quilombo. A ação pede também a fixação de indenizações individuais aos moradores por danos materiais, considerando-se o ônus da atividade mineradora que a comunidade vem suportando.
“A União, por intermédio da ANM, permitiu que particulares desenvolvessem atividades minerárias (pesquisa e lavra) dentro de território quilombola, auferindo os respectivos lucros sem qualquer forma de participação, consentimento ou mesmo compensação à comunidade, que passou a arcar tão somente com o passivo ambiental e os riscos inerentes à mineração”, ressaltou o procurador da República André Libonati, autor da ação do MPF.
Em 2020, diversos quilombos do Vale do Ribeira, entre eles o Porto Velho, já haviam se manifestado contrariamente às atividades de mineração na região. Ao assinarem um protocolo de consulta prévia sobre o assunto, as comunidades destacaram a contaminação do solo e da água, o desmatamento e os impactos sociais entre as consequências nocivas da exploração mineral. “Hoje, lutamos por nossos territórios para que sejam livres de mineração de maneira direta e indireta”, frisou o documento.
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Arte: Secom/PGR