23,5 milhões vivem em áreas com facções ou milícia: ‘reflete carência do Estado e de políticas públicas’, diz pesquisador

Leonardo Carvalho comenta os dados revelados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública nesta segunda (2)

por Kaique Santos, em Brasil de Fato

Uma pesquisa divulgada nesta segunda-feira (2) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) revelou dados preocupantes em relação à percepção das pessoas sobre o local onde vivem. Pelo menos 23,5 milhões de brasileiros com mais de 16 anos vivem em áreas com a presença de facções criminosas ou milícias.

O levantamento, encomendado pelo Fórum em parceria com o jornal Folha de São Paulo, foi realizado pelo Instituto Datafolha.

“Essa pesquisa impactou bastante pelos resultados, sobretudo pela percepção da população sobre a presença de facções criminosas e milícias no seu cotidiano, no seu bairro. Esse número chama bastante atenção, reflete um pouco o desenvolvimento dessas facções, de milícias, que estão cada vez mais presentes, se fazendo perceber seja pela oferta de serviços ilícitos ou pelo uso da violência”, declara Leonardo Carvalho, pesquisador sênior do FBSP.

A pesquisa também traz dados a respeito da existência de cemitérios clandestinos no Brasil e do desaparecimento de pessoas. Enquanto 14 milhões de pessoas reconhecem a existência dos cemitérios ilegais em sua cidades, outros 10 milhões tiveram um parente ou um conhecido que desapareceu ao longo dos últimos 12 meses.

Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 30 milhões de pessoas declararam viver em bairros que contam com serviços de vigilância privada prestados por policiais de folga. Os dados escancaram uma ausência do Estado e de políticas públicas, denuncia Carvalho.

“A pesquisa é bem completa, porque ela traz perguntas de diferentes aspectos que vão formando um cenário no campo da segurança pública. Tem um ponto que é comum a todos os elementos pesquisados: esses elementos de violência – seja a segurança privada, atuação de facção, milícia, a presença de cenas abertas de uso de drogas, as cracolândias no cotidiano da população – refletem a necessidade e a carência de uma presença do Estado.”

Para o pesquisador, não bastaria apenas a presença da polícia, mas uma atuação completa do poder público para atuar diante dessa realidade, com ações de políticas públicas.

“Quando eu falo de políticas públicas, eu não estou me referindo só à presença de polícia. O Estado tem que entrar por meio de política de assistência social pra essa população vulnerável que carece de medidas de saúde para lidar com uma doença, com o vício, para lidar com uma questão de ordenamento urbano. Então, para gerar algum tipo de ordenamento que torne o ambiente urbano menos propício para ser cenário de crimes”, argumenta Leonardo.

“Quando o Estado não se faz presente, ele cria aqui o que chama de vácuo de poder, cria um vazio que é justamente esse espaço que as facções e milícias tentam ocupar de maneira ilegítima.”

Sobre a segurança privada especificamente, o pesquisador sênior do FBSP ainda cita outros problemas gerados com a atuação paralela dos policiais.

“Nesse ponto a gente precisou olhar também a questão da segurança privada que é oferecida por meio de uma estrutura que consolida, com policiais em folga, o famoso ‘bico’. E também chama bastante atenção a oferta desse tipo de serviço, a percepção da população entendendo que é uma oferta de segurança privada fornecida por policiais.”

“O primeiro ponto que é um ato que não tem conformidade com o regulamento das policias. Então já tem um problema aí. O segundo ponto é que [com] os policiais fazendo isso em folga, precisa se perguntar em que momento eles estão descansando”, expõe Carvalho.

“A atividade policial é uma atividade extenuante, estressante. O policial precisa de um momento para relaxar, para se desligar. Se ele está exercendo uma segunda atividade, em que momento ele está se desconectando dessa rotina? Quando ele está descansando? Porque isso impacta não só na oferta de um serviço ilegal, como também impacta na estrutura de segurança pública legítima fornecida pelo Estado.”

A entrevista completa com Leonardo Carvalho, feita pela apresentadora Luana Ibelli, está disponível na edição desta terça-feira (3) do Central do Brasil, no canal do Brasil de Fato no YouTube.

“Pesquisa de vitimização e percepção sobre violência e segurança pública” também traz outros dados sobre o tema – Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

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