O clima mudou. A política não mudará?

Diante da indiferença dos governos frente à catástrofe climática, surge uma resposta. Plataforma online permite identificar, em centenas de cidades, candidat@s com propostas reais para a defesa do ambiente. Veja como funciona

Por Áurea Carolina e Beatriz Pagy, em Outras Palavras

No momento em que escrevemos este artigo, focos de incêndio tomam todas as regiões do Brasil. As densas nuvens de fumaça que ocuparam o lugar dos rios voadores agora se alastram de Norte a Sul. Com a expansão das secas e o surgimento de zonas com clima árido e condições similares à de desertos, as cidades brasileiras já vivem paisagens de ficções pós-apocalípticas. Isso porque não faz nem quatro meses desde a cheia do rio Guaíba, que devastou mais de 400 municípios no Rio Grande do Sul.

A escala é mesmo digna de fim do mundo: nos últimos 10 anos, ao menos 5 milhões de pessoas no Brasil tiveram que abandonar suas casas em função de desastres. É como se a população inteira de Belo Horizonte e Salvador estivesse desalojada. A crise climática é incontornável.

Diante dos eventos extremos que se repetem ano após ano, é urgente organizar nossa solidariedade e indignação e amadurecê-las para que se tornem ação política capaz de romper o círculo vicioso de perdas e danos. Indignação e solidariedade sem luta por justiça climática não vão transformar a realidade.

Enquanto esse enfrentamento não for compromisso prioritário das autoridades e não se traduzir em políticas públicas, a conta sempre vai chegar mais cara para populações periféricas e vulneráveis, comunidades tradicionais e ribeirinhas, povos indígenas e agricultores familiares e para as populações que sofrem com estruturas e serviços urbanos precarizados.

Como epicentros da crise climática, as cidades gritam que o debate também precisa ser local. Em mais da metade dos municípios brasileiros, não há sequer menção aos riscos de tragédias causadas por extremos climáticos nos instrumentos de planejamento urbano. Passou da hora de repensar lógicas de habitação, circulação, produtividade e coexistência que produzam resiliência e afastem os pontos de não retorno dos nossos biomas.

Para pautar o debate climático nas eleições municipais, o NOSSAS e o Clima de Eleição lançaram a terceira edição da Vote pelo Clima – uma plataforma para pressionar candidaturas de todo o Brasil a incluir propostas aprofundadas e contextualizadas sobre essa causa em suas campanhas. A primeira edição da campanha foi lançada durante as eleições municipais de 2020, por iniciativa do Clima de eleição, organização criada para impulsionar a transição climática justa no Brasil por meio de incidência política e participação social.

A novidade desta edição é que a plataforma conecta candidaturas e eleitorado seguindo uma lógica de match, comum em apps de relacionamento — é possível filtrar concorrentes de acordo com propostas como redução de emissões, transição energética e apoio às populações atingidas. No momento da inscrição, as candidaturas assumem os compromissos apresentados pela plataforma. Cada cadastro pode incluir até três propostas de campanha que dialoguem com as pautas prioritárias da Vote pelo Clima.

Após a inscrição, o cadastro passa por uma análise para verificar se a candidatura está regularizada junto ao TSE e, só após essa confirmação, ela é disponibilizada na plataforma para consulta pelo eleitorado. O site possui ainda um filtro que impede que candidatos com registros de crimes ambientais e discursos de ódio possam se cadastrar.

As inscrições de pessoas candidatas são feitas por um formulário disponível no link: votepeloclima.org. Nesse mesmo link, eleitores podem encontrar concorrentes aos cargos municipais que se alinham às suas preocupações. As equipes do Clima de Eleição e do NOSSAS estão dedicadas a estratégias de mobilização online e offline para ampliar o número de candidaturas efetivamente inscritas e comprometidas com a plataforma. A divulgação acontece em várias frentes: via contato com bases dos diversos partidos em todos os estados brasileiros; por redes sociais, e-mail e WhatsApp, as equipes convidam eleitores a pressionar candidaturas de seus territórios para adesão à plataforma, além do trabalho de assessoria de imprensa.

Neste momento, todo apoio na divulgação é bem-vindo e os perfis do Clima de Eleição e do NOSSAS nas redes sociais estão repletos de materiais sobre a iniciativa para compartilhamento.

Mais de 70 organizações da sociedade civil apoiam a iniciativa, como o Observatório do Clima, a ClimaInfo e o Pacto pela Democracia. Até o momento, mais de mil concorrentes às eleições nos municípios de todos os estados iniciaram o cadastro no site, entre candidaturas a prefeituras e câmaras municipais.

Ou a sociedade toma urgentemente a dianteira nas transformações necessárias das políticas públicas, ou não haverá futuro possível num horizonte próximo. O clima mudou. A política precisa mudar.

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