MPF aciona Incra e União para que concluam demarcação do território da comunidade quilombola Zumbi, na Bahia

A ação também pede consulta prévia à comunidade sobre atividades empresariais na área, localizada em Maragogipe (BA)

Ministério Público Federal na Bahia

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública (ACP), com pedido liminar, para que a Justiça Federal (JF) determine ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e à União que finalizem o processo de demarcação e titulação de área territorial reivindicada pela Comunidade Quilombola Zumbi, situada no distrito São Roque do Paraguaçu, em Maragogipe (BA). Foi pedido que seja determinado o prazo de 30 dias para que os acionados elaborem um cronograma para conclusão do processo, incluindo previsão orçamentária, e que seu cumprimento não ultrapasse 24 meses.

Além disso, o MPF pede a suspensão dos efeitos das licenças ambientais concedidas pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) à empresa de energia renovável ERB Aratinga S.A que, em regime de parceria rural com a empresa Aliança da Bahia Agropecuária S.A (antiga Agropastoril Vila Real), exploram atividade de eucaliptocultura na área.

O pedido é para que as licenças permaneçam suspensas até que as empresas realizem a devida Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) à comunidade tradicional bem como o Estudo de Componente Quilombola (ECQ), que avaliaria os impactos socioambientais da atividade empresarial em desfavor dos quilombolas. A consulta prévia é um direito das comunidades, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do trabalho (OIT), que foi internalizada pelo Brasil. Também foi pedida consulta prévia às comunidades quilombolas Quizanga, Guerém, Tabatinga, Giral Grande, Baixão do Guaí, Guaruçú e Porto da Pedra. Foi requerido, ainda, que seja determinado ao Inema que não emita novas licenças até que o direito das comunidades seja contemplado.

Demora – De acordo com o procurador da República Ramiro Rockenbach, autor da ação, a atuação do MPF visa garantir o direito da comunidade ao seu território tradicional, bem como proteger e compensar os quilombolas em relação a outros danos decorrentes de ações e omissões dos órgãos públicos acionados.

Na prática, a comunidade espera por uma resposta do poder público desde 2007, quando teve início o primeiro processo administrativo para demarcação do território, que foi concluído em relação à comunidade quilombola vizinha de Baixão do Guaí, mas que, de forma injustificada, não contemplou a comunidade Zumbi. O Incra sequer concluiu as etapas iniciais para a outorga do título coletivo de domínio em favor da comunidade quilombola Zumbi e, dessa forma, outro processo foi aberto em 2022, porém, continua sem avançar.

“É importante pontuar que, diante da insegurança jurídica acarretada pela demora na conclusão do processo de regularização jurídica, várias ações possessórias foram ajuizadas contra os Zumbis com o intuito de expulsá-los do território que ocupam”, esclareceu o procurador.

Dessa forma, também foi pedido à Justiça que determine à União e ao Estado da Bahia, no âmbito das suas respectivas atribuições, que realizem a investigação da cadeia dominial das matrículas da área em questão no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Nazaré, no prazo de até 90 dias.

Outros pedidos – Ao final do processo, o MPF pede que seja determinado ao Incra que conclua a titulação do território, no prazo máximo de 12 meses, e remeta o processo administrativo à Presidência da República, bem como que a União disponibilize as verbas orçamentárias para a conclusão da titulação, sendo concedido o prazo máximo de 24 meses para tanto. Além disso, que sejam declaradas nulas as licenças ambientais concedidas pelo Inema aos empreendimentos e que as partes implementem medidas mitigatórias, compensatórias e preparatórias previstas no ECQ e na CLPI. Ainda, que seja determinada a paralisação das atividades de eucaliptocultura das empresas até que o ECQ e a CLPI sejam realizados.

Por fim, o MPF requer a condenação dos demandados a pagarem indenização, a título de danos morais coletivos, em valor não inferior a R$ 1 um milhão, que deverá ser revertido em políticas públicas destinadas ao território tradicional da Comunidade Quilombola Zumbi de São Roque do Paraguaçu.

Comunidade quilombola Zumbi – está localizada às margens da estrada BR-420, que dá acesso ao distrito de São Roque do Paraguassu, do município de Maragogipe (BA). É uma comunidade tradicional que, até janeiro de 2024, era composta por 80 famílias, sendo formada por pescadores, agricultores de subsistência e criadores de pequenos animais, artesãos e extrativistas.

Nos últimos anos, além da lentidão na conclusão do processo de regularização fundiária e os vícios materiais na concessão das licenças ambientais, os membros da comunidade quilombola Zumbi de São Roque do Paraguaçu também enfrentam graves situações de ameaça e violência perpetradas por prepostos de fazenda pertencente à Aliança da Bahia Agropecuária S.A, que objetivam expulsá-los do seu território tradicional, colocando em risco a existência dessa comunidade.

Ação Civil Pública nº 1029523-17.2024.4.01.3304

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