Documentário aborda situação de quilombolas do Cerrado

Graça Portela (Icict/Fiocruz)

Com roteiro e direção da jornalista Yasmine Saboya, aluna de mestrado do Programa de Pós-Graduação de Informação e Comunicação em Saúde (PPGICS) do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), o Canal Saúde lançou o documentário Ecocídio no Cerrado. A produção analisa a resistência dos povos originários e comunidades tradicionais do Cerrado, em especial dos territórios quilombolas de Cocalinho e Guerreiro, mostrando “uma comunidade quilombola cercada pelo agronegócio e vendo a sua produção agrícola familiar ser reduzida drasticamente e a sua saúde serem ameaçadas”, como destaca a jornalista.

O documentário acompanhou a equipe dos pesquisadores da Coordenação de Saúde e Ambiente, chefiada por Guilherme Franco Netto e ligada à Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAPS/Fiocruz), que foram a campo – a partir do veredito do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) – realizar pesquisas sobre a grave situação de saúde da região. “Acabamos fazendo alguns programas sobre o tema para programas como o Sala de Convidados e o Em Pauta na Saúde e, aproveitamos para produzir o documentário”, afirma Yasmine.

Cocalinho e Guerreiro

Os territórios quilombolas de Cocalinho e Guerreiro estão no município de Paranarama, no Maranhão – que, segundo dados do Ministério da Saúde, é o quinto estado brasileiro com maior letalidade de intoxicação por agrotóxicos. A situação da região (incluindo os dos territórios quilombolas e mais 14 casos em toda a extensão do bioma do Cerrado) foi levada pela Campanha em Defesa do Cerrado ao Tribunal Permanente dos Povos (TPP), uma instituição internacional a qual o Brasil é signatário, que aceitou as denúncias. Segundo a acusação aceita no Tribunal, a região apresenta “comprovadas violações de direitos humanos denunciadas, em todos os casos indicados”.

O TPP não é um tribunal criminal e sim de opinião, ou seja, não pode proferir sentenças, mas – assim como a Corte Interamericana de Direitos Humanos – pode determinar a responsabilidade do Estado brasileiro pela violação de direitos humanos protegidos por tratados internacionais, neste caso específico na esfera latino-americana. No caso, o TTP aceitou os argumentos da denúncia e considerou “comprovadas as violações de direitos humanos denunciadas, em todos os casos indicados. Os crimes atribuídos pelo Tribunal foram ecocídio; processo de genocídio dos povos do Cerrado; crimes de sistema (crimes ecológicos e econômicos); e racismo estrutural – transgressões que não só afetam a saúde dos povos que vivem na região, mas a sua sobrevivência.

Reflexões para dissertação

Segundo Yasmine, “o Cerrado me marcou muito. E falo também pela equipe do Canal Saúde, pois conversávamos entre nós, há um antes e um depois daquela viagem à Parnarama. Foi ainda mais diferenciada do que os outros territórios que já fizemos, porque ficamos hospedados na casa dos quilombolas, convivendo dia e noite com eles”, afirma a jornalista. Para ela, a experiência traz “uma outra relação, de escuta e de perceber coisas e de poder aprofundar no conteúdo, entender a vivência deles…”.

A experiência da jornalista do Canal Saúde foi marcante e também acaba por refletir em seu tema no mestrado: a análise de discursos sobre a produção agrícola no Jornal Nacional. “Tem a ver com o filme”, afirma Yasmine, “porque nos últimos anos, o Canal Saúde tem feito muitas pautas sobre saúde e meio ambiente e aí, a partir da demanda desses programas, fui me interessando pelo tema da agroecologia e começando a entender que existem outras formas de produzir”.

O documentário não deixa de ser o resultado desse interesse: “a produção agrícola sem utilização de agrotóxico é um tema de muito interesse meu e o filme trata de uma comunidade que está ali, cercada pelo agronegócio e vendo a sua produção e a sua saúde serem absolutamente ameaçadas; seja por conta do agronegócio, por várias pressões que o agronegócio faz e também por conta do uso excessivo de agrotóxicos no Cerrado”.

Ecocídio no Cerrado foi lançado durante o Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica), realizado em junho deste ano, na cidade de Goiás (GO). O evento teve a participação da VideoSaúde, com a exibição de diversas produções e da coordenadora do Observatório de Clima e Saúde, Renata Gracie, no Painel Fiocruz – Mudança do clima e saúde: desafios e oportunidades em tecnologia e informação. O documentário foi feito sob a cooperação técnica-científica entre a Fiocruz e o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES), de Portugal.

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