Organizações alertam: a ausência de defensores públicos regionais de direitos humanos contribui para violência

Em nota, coletivo denuncia que mais da metade dos estados brasileiros não tem Defensor Regional de Direitos Humanos.

Terra de Direitos

Um coletivo de quase quarenta organizações sociais e movimentos populares manifesta, em nota pública divulgada nesta sexta-feira (01), intensa preocupação com a forte ausência de Defensores e Defensoras Regionais de Direitos Humanos (DRDHs), cargo do âmbito da Defensoria Publica da União, na maior parte dos estados brasileiros. A Terra de Direitos assina a nota.

De acordo com a nota, 15 estados não possuem e defensor nomeado pela Defensoria Pública da União (DPU), como os estados do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e Bahia, entre outros. Já em outros 9 estados, como Minas Gerais, Pará e Rondônia, há titulares nomeados para o cargo, mas ainda carece de nomeação de um defensor substituto.

Responsável por garantir o acesso à justiça e a efetivação de direitos dos grupos vulnerabilizados e com maior proximidade dos territórios em conflitos, tais como povos indígenas e comunidades quilombolas, o defensor ou defensora regional de direitos humanos da DPU é “de extrema importância para a garantia de direitos de comunidades vulneráveis”, aponta a nota. O grupo reivindica que a questão seja tratada de maneira adequada e urgente pela DPU.

“A ausência de defensores (as) em pastas especializadas em defesa de direitos humanos no âmbito da DPU aumenta a vulnerabilidade de comunidades em situação de conflito e/ou ameaçadas, bem como aquelas que sofrem com uma ampla gama de negação de acesso a direitos”, diz outro trecho.

A atribuição de publicar editais de seleção e nomeação de defensores é do Defensor Público Geral (DPG). O coletivo relata que foram enviados diversos ofícios para a DPU desde o início do ano, sem que o problema tenha sido resolvido “apesar dos diversos esforços da atual Defensora Nacional de Direitos Humanos (DNDH), e a despeito dos graves impactos que a ausência de Defensorias Regionais de Direitos Humanos gera para as populações que eram ou poderiam ser atendidas pela Defensoria Pública da União”.

Veja a nota na íntegra.

NOTA PÚBLICA SOBRE A VACÂNCIA DOS CARGOS DE DEFENSORES E DEFENSORAS REGIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ÂMBITO DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

A Defensoria Pública da União (DPU) cumpre um papel institucional fundamental de promoção e defesa de direitos humanos. Para fortalecer tal função, a instituição do Sistema de Defensoras e Defensores Nacional e Regional de Direitos Humanos da DPU foi criado em 2016, com objetivo de estruturar a atuação da instituição em demandas coletivas visando promover a proteção de direitos humanos de grupos vulneráveis e em situação de conflito.

Isso porque, a partir da lei complementar nº 132/2009, foram incorporadas funções institucionais à DPU que lhe permitiram uma atuação mais abrangente e democrática, visando a proteção de direitos humanos, conforme o disposto nos incisos I e III do art. 4º:

I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todosos graus; (…)
III – promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico;

Nesse sentido, este Sistema possui ampla articulação com a sociedade civil, tendo esta, inclusive, voz ativa na eleição do (a) Defensor (a) que irá exercer o mandato de DNDH. Nos estados, os Defensores e Defensoras Regionais de Direitos Humanos (DRDHs) são os responsáveis pelo acompanhamento de demandas coletivas de direitos humanos. Atualmente, o ocupante do cargo de Defensor Público Geral (DPG) é responsável direto pela publicação de editais de seleção e nomeação das pessoas que irão exercer a função de DRDH. Entretanto, neste último ano, cargos de DRDH estão vagos em inúmeros estados, em razão da resistência da própria instituição em proceder com o adequado preenchimento da vaga e a devida nomeação.

Diversos ofícios foram enviados por mais de 20 entidades à DPU desde o início do ano, sem que o problema tenha sido resolvido pela instituição, apesar dos diversos esforços da atual Defensora Nacional de Direitos Humanos (DNDH), e a despeito dos graves impactos que a ausência de Defensorias Regionais de Direitos Humanos gera para as populações que eram ou poderiam ser atendidas pela Defensoria Pública da União.

Foi verificado junto à instituição que ao menos 15 estados não possuem DRDH nomeados (as)1, quais sejam: Paraná, Maranhão, Espírito Santo, Acre, Rio Grande do Norte, Sergipe, Tocantins, Bahia, Pernambuco, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Amapá, São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso. Há também os casos em que os estados possuem DRDHs titulares nomeados (as), mas não possuem sequer defensores (as) substitutos (as) nomeados (as), quais sejam: Roraima, Rondônia, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Alagoas, Pará, Paraíba e Goiás.

As Defensorias Regionais de Direitos Humanos são importantes órgãos de apoio locais para promover o acesso à justiça e a efetivação de direitos dos grupos vulnerabilizados. Principalmente porque são estes (as) defensores (as) que estão próximos (as) aos territórios em conflito, nos quais ocorrem graves violações de direitos humanos. Dada a extensão territorial, diversidade cultural e complexidade dos conflitos no Brasil, a existência de defensores e defensoras locais destacados (as) para a atuação em tutela coletiva de direitos humanos é de extrema importância para a garantia de direitos de comunidades vulneráveis.

A ausência de defensores (as) em pastas especializadas em defesa de direitos humanos no âmbito da DPU aumenta a vulnerabilidade de comunidades em situação de conflito e/ou ameaçadas, bem como aquelas que sofrem com uma ampla gama de negação de acesso a direitos. O Brasil é um dos países que mais vitima pessoas que defendem direitos humanos e registrou, em 2023, ao menos, 3,4 milhões possíveis violações de direitos humanos, segundo dados da Anistia Internacional. Além disso, segundo dados da Pesquisa Nacional da Defensoria Pública de 2021, a falta de cobertura territorial da Defensoria Pública da União atinge 71% das comarcas, portanto a atuação das DRDH é ainda mais necessária e urgente. Diversas normas nacionais e internacionais reforçam o direito das populações de terem a melhor estrutura possível para acesso a direitos, sem retrocessos e, ao contrário, com sua melhoria contínua, sempre no máximo possível da estrutura disponível – como a Constituição Federal, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. A própria Corte Interamericana já se posicionou que é dever dos Estados partes organizar sua estrutura de modo a viabilizar efetivamente o livre e pleno exercício dos direitos humanos.

A omissão na nomeação do(a) defensor(a) tem implicações graves, resultando muitas vezes na escalada de violações de direitos humanos contra grupos que já sofrem com omissões do Estado brasileiro e negativas de direitos fundamentais.

Assim, os movimentos sociais e entidades que subscrevem essa nota reforçam a necessidade de autonomia funcional da DNDH, e demandam que a nomeação dos Defensores e Defensoras Regionais de Direitos Humanos nos estados seja tratada de maneira adequada e urgente pela Defensoria Pública Geral da União.

Assinam:
1. Comissão Pastoral da Terra – CPT
2. Terra de Direitos
3. Conselho Indigenista Missionário – Cimi Regional Sul
4. Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
5. Comissão Guarani Yvyrupa – CGY
6. Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas – Obind/UnB
7. Observatório da Temática Indígena na América Latina – OBIAL-Unila
8. Federação das Comunidades Quilombolas do Paraná – FECOQUI/PR
9. Associação Quilombola e Afrodescendente da Restinga
10. Instituto Democracia Popular
11. Rede de Apoio e Incentivo Socioambiental (RAIS)
12. Guilherme Assis de Almeida, ex-presidente da Andhep (Associação Nacional de Direitos Humanos – Pesquisa e Pós-graduação)
13. Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
14. Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
15. Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM
16. Campanha Nacional Contra a Violência no Campo
17. Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ
18. Rede Nacional de Advogadas e Advogados Quilombolas – RENAAQ
19. Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAP
20. Centro Popular de Direitos Humanos – CPDH
21. Movimento dos Trabalhadores Sem Teto do Rio Grande do Sul – MTST RS
22. Central de Movimentos Populares – CMP
23. União Nacional por Moradia Popular – UNMP
24. Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES
25. Grupo GUARÁ
26. Movimento Nacional de Luta por Moradia de Sergipe – MNLM SE
27. Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
28. Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico – IBDU
29. Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos Goiás – MTD GO
30. Habitat para a Humanidade – Brasil
31. Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais
32. Movimentos de Trabalhadoras e Trabalhadores Sem Teto – MTST
33. Associação dos Geógrafos Brasileiro, seção local de Marechal Cândido Rondon
(AGB/SLMCR)
34. Geolutas – Laboratório e Grupo de Pesquisa de Geografia das Lutas no Campo e na Cidade
35. Jubileu Sul Brasil
36. Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura – CONTAG
37. Pastoral Operária do Espírito Santo
38. Articulação Nacional de Agroecologia – ANA
39. Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM – Brasil)

Imagem: Indígenas Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul vivem contexto de violação de direitos – Foto: povo Guarani e Kaiowá

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