Tania Pacheco
A rapina de territórios que os “povos das mercadorias”1 desenvolvem mundo afora tem objetivo claro: expulsar, exercer alguma forma de escravidão contemporânea ou sumariamente exterminar povos originários e se apropriar do que consideram ‘riquezas’ a serem usurpadas e negociadas. Babel de cores, técnicas e idiomas, a violência se espraia pela África, Américas, Oriente Médio, Ásia. “Não poderia ser diferente no Brasil”, dizem alguns, como se isso legitimasse esbulhos, fome, mortes, genocídios. É de racismo ambiental antes de tudo que estamos falando.
Desde 2010, quando foi disponibilizado na internet, o Mapa de Conflitos envolvendo Injustiça Ambiental Saúde no Brasil se soma a outras tantas iniciativas que buscam contribuir para com as lutas desenvolvidas por povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e comunidades urbanas, na busca por direitos há séculos negados e despudoramente desrespeitados.
Neste mês de novembro, seis conflitos foram postados no Mapa: dois novos; quatro atualizados. Em três deles, remanescentes de quilombos são as personagens principais. Em outros três, indígenas lutam por seus direitos, em um deles acompanhados por camponeses e ribeirinhos.
Em Alagoas, o Povo indígena Tingui-Botó, de Feira Grande (AL) luta para recuperar território tradicional espoliado por grandes proprietários rurais e para garantir condições mínimas de sobrevivência física e cultural da comunidade. Já no Espírito Santo, a Comunidade Quilombola de Linharinho aguarda regularização fundiária para fins de titulação definitiva para poder acessar plenamente seu território tradicional.
O Povo indígena Tabajara luta pela demarcação do seu território tradicional e contra a grilagem de suas terras, o desmatamento das matas ciliares e o lançamento de resíduos industriais nos rios, sua fonte de subsistência, na Paraíba, enquanto a Comunidade remanescente quilombola Manoel Ciriaco dos Santos tem finalmente sua portaria de reconhecimento publicada pelo Incra, no Paraná.
Ainda no Nordeste, Comunidades tradicionais lutam contra a grilagem e o desmatamento promovidos pelo agronegócio na região do Cerrado, no Piauí. E, no Rio de Janeiro, a Comunidade Quilombola da Pedra do Sal aguarda a finalização do processo de titulação e regularização fundiária do território, bem como o tombamento dos achados arqueológicos, reminiscências históricas do quilombo.
Ameaças estão presentes em todos. Em alguns, as violências se desdobram em incêndios criminosos; contaminação por agentes utilizados para a extração da riqueza, do mercúrio aos agrotóxicos; mortes matadas ou “mortes morridas”, que poderiam ter sido de diferentes formas evitadas. Nestes 16 anos do Mapa de Conflitos, desde seus primeiros passos em 2008, é com indignação e revolta que cada caso é pesquisado, denunciado, em solidariedade a combates que, muitos, se fazem presentes desde que nossas terras foram invadidas em 1500. Desde que os primeiros indígenas foram escravizados, e as primeiras indígenas, estupradas, antes de serem aniquilados quando se tornavam “inúteis”.
O Mapa de Conflitos da Fiocruz, como também é conhecido, espera sua visita AQUI. E conta com a sua colaboração, divulgando, criticando, sugerindo e colaborando com ele.
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1.Conforme Davi Kopenawa Yanomami.