E se o governo apostasse na indignação coletiva?

Culpa-se a comunicação pela queda de popularidade de Lula. Mas há algo mais profundo. A crise do sistema faz aflorar a raiva. O fascismo a usa para cindir a sociedade pelo ódio. E esquerdas ainda não sabem direcioná-la para enfrentar as raízes dos problemas sociais

por Pedro Henrique Corrêa Guimarães, em Outras Palavras

Dados de pesquisa Quaest de 27 de janeiro de 2025 mostram que, pela primeira vez no governo Lula III, a avaliação negativa superou a positiva. Neste início do ano, o governo, apontando um (suposto) erro de comunicação, trocou o ministro de Comunicação Social. Não foi surpresa: a mídia governista, há algum tempo, já batia na tecla de que havia um problema de comunicação neste governo Lula. De fato, comparado aos anteriores, esse governo não é tão popular, mas seria isto apenas um problema de como veicular a mensagem à população brasileira? Os apoiadores dizem que com um PIB acima das expectativas e queda no desemprego, a queda na popularidade só poderia ser explicada por um problema de mensagem. Todavia, a questão é mais profunda. E não digo apenas a oposição refratária consolidada na faixa dos 30% (também denominada de bolsonaristas). O problema está no método.

A campanha de Lula em 2022 apoiou-se na mensagem do “Lulinha paz e amor”. A mensagem era que, em contraposição aos discursos de ódio do bolsonarismo, Lula entregaria a paz, o amor e a reconciliação nacional (regada a cerveja e a picanha). Porém, esse recorte, carece de duas problematizações (ou uma problematização, com duas faces): o que é um discurso de ódio? Ou, qual a paz que os brasileiros querem?

Muitos, numa leitura que entendemos como parcial, aponta que as notícias falsas (fake news) são a principal ameaça à democracia brasileira. Todavia, ainda que turbinada por redes sociais com poder de comunicação difusa, as notícias falsas existem e impulsionam plataformas políticas desde a antiguidade (os faraós do Egito, por exemplo, voltavam e propalavam falsas notícias das guerras). Não é possível mensurar se as populações atuais são mais (ou menos) impactadas pelas notícias falsas da Antiguidade. No atual cenário, o problema de comunicação não está no conteúdo, mas no meio – não são as falsas notícias que geram perturbação da ordem das instituições da democracia ocidental, mas o fato que apenas duas ou três empresas veiculadoras, controlam, através de opacos algoritmos a divulgação global da informação (no período do jornal, e depois da rádio/TV, a concentração dos veículos de propagação de notícias era tão intenso).

Neste contexto, falar em discurso de ódio é um eufemismo. Não há dúvidas que nessas redes se difunde ataques a grupos minoritários, em recortes racistas, misóginos e homofóbicos, entretanto, o problema não está na tonalidade afetiva dos ataques, mas do conteúdo que revela um abalo da hegemonia humanista.

E por que o humanismo está em crise? A resposta não está apenas na ascensão do fascismo – uma resposta deste tipo seria tautológica. O fascismo e a crise do humanismo ascendem ante a crise do capitalismo. Neste cenário de crise estrutural do capital, como denominou Mészaros, é natural que a raiva cresça. Mas o problema não está na raiva, mas no que se tem raiva? O fascismo direciona a raiva para grupos minoritários para esconder que a crise está no modo de produção. E assim, ao invés do ódio à burguesia, fomenta-se a luta interna entre grupo das classes trabalhadoras.

O fascismo, no entanto, não se combate com “amor”, mas com o redirecionamento do ódio às causas da miséria da sociabilidade, ou seja ao modo de produção capitalista. É preciso “vender” o combate, apontar e enfrentar as raízes do problema (e nesse sentido, ser mais radical) E exemplos não faltam: Petro AMLO, Sheinbaum mostram essa postura e tem conquista mais apoio social que a postura conciliatória do lulo-petismo. Esse é o caminho, e para tanto, é preciso abandonar a muleta da justificativa da correlação de forças e de uma (dissimulada) pacificação social.

Foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula

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