Magda Chambriard e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, engrossam a pressão sobre o IBAMA pela liberação da licença para poço da petroleira.
Na semana passada, o presidente Lula aproveitou todas as oportunidades que teve para pressionar o IBAMA pela liberação da exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas. Ontem (17/2), Lula voltou a ganhar o reforço de dois defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” nessa força-tarefa contra o órgão ambiental: a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Durante um evento de anúncio de investimentos na frota naval da Petrobras em Angra dos Reis (RJ), do qual Lula participou, Magda defendeu a exploração de petróleo na foz – a petroleira aguarda licença do IBAMA para perfurar um poço no bloco FZA-M-59, no litoral do Amapá, informam Folha, g1 e Valor. Para isso, a presidente da petroleira usou o velho e duvidoso argumento de que só a exploração na região pode garantir a reposição das reservas brasileiras de combustíveis fósseis.
“Se nós obtivermos a licença (ambiental), presidente Lula, faremos tudo de forma extremamente segura. Quanto a isso o senhor pode ficar absolutamente tranquilo. Sendo possível a licença, nós teremos no Amapá o melhor aparato de resposta à emergência já visto no mundo”, disse Magda.
Mas Lula, que, enquanto pressiona pela licença, tenta reforçar que é preciso garantir uma operação segura e sem impactos ambientais, não deveria ficar tranquilo com a suposta garantia de Magda. Afinal, se um vazamento de petróleo no bloco 59 atingir a fauna, a Petrobras levará cerca de três horas para transportar um animal até a Unidade de Estabilização e Despetrolização (UED) que está construindo em Oiapoque (AP) – no melhor cenário. No pior, o deslocamento demorará quase dois dias.
As estimativas foram enviadas pela própria petroleira ao IBAMA para tentar obter a licença de perfuração no bloco, explica a DW. As respostas foram dadas ao órgão ambiental no fim de novembro de 2024. Ao analisar o documento, vê-se que toda a discussão gira em torno do Plano de Proteção à Fauna (PPF), cujo objetivo é estabelecer estratégias de proteção aos animais em caso de acidentes. Mas não aborda a consulta aos Povos Tradicionais, como os indígenas e os pescadores artesanais, nem ao aperfeiçoamento da modelagem de dispersão de óleo em caso de vazamento.
Voltando ao evento em Angra dos Reis, o ministro Alexandre Silveira também estava lá. E, obviamente, aproveitou o palanque para voltar suas baterias contra o IBAMA pela licença para o bloco 59, relata o Estadão.
“A Petrobras já entregou todos os documentos necessários ao IBAMA e chegou a hora de virar essa chave”, afirmou Silveira. “A questão do petróleo não é questão de oferta, é questão de demanda e, enquanto o mundo demandar, a Petrobras vai poder ofertar, sim, petróleo, gás, biocombustível e tudo aquilo que essa empresa produz”, completou.
Não vamos considerar a onda de calor que “torrou” várias cidades do estado do Rio de Janeiro ontem – Mangaratiba, vizinha à Angra, estava sob alerta de calor extremo, informa o Diário do Rio – e que é agravada pelas mudanças climáticas, provocadas pela queima de combustíveis fósseis. Olhando apenas pela “questão de demanda”, o ministro está equivocado. E não somente pelas projeções da Agência Internacional de Energia (IEA), mas pela análise da própria Petrobras que ele diz defender.
A IEA apontou que a demanda global por petróleo vai atingir seu pico até 2030, caindo gradativamente a partir daí, por causa da eletrificação das frotas e da expansão das fontes renováveis para geração elétrica. A Petrobras confirma essa tendência em seu plano estratégico 2050. No Brasil, a empresa aponta uma estabilização da demanda a partir de 2030. Demanda esta que hoje já é menor que a produção brasileira de petróleo – o país exporta cerca de um terço do que produz.
A “reposição de reservas” alegada por Magda segue a mesma lógica. Com um anexo: ainda há várias áreas do pré-sal, a maior província petrolífera brasileira, a serem exploradas. A ANP, inclusive, lançou recentemente um edital para oferecer campos na região ao mercado, sob o regime de partilha da produção.
Logo, a exploração da foz do Amazonas, bem como a de outras bacias da chamada “Margem Equatorial”, além de piorar o clima do planeta, pode virar um prejuízo financeiro. Tanto para a Petrobras como para o governo, seu maior acionista.
Em tempo 1: A licença para a Petrobras perfurar um poço no bloco FZA-M-59 pode ser uma “abertura de porteira” para facilitar o licenciamento de outras áreas na foz do Amazonas, apontam especialistas. Vale lembrar que a ANP inclui 47 blocos na região em seu próximo leilão de concessões petrolíferas, lembra a CNN.
Em tempo 2: Outra falácia usada pelos defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” é que é necessário produzir esse combustível fóssil para financiar a transição energética. Algo que é “absurdamente inconsistente”, frisa Suely Araújo, ex-presidente do IBAMA e coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima (OC), à CBN. “Fere a lei da lógica. Você estaria piorando permanentemente o problema que a própria transição quer resolver. É razoável, sim, destinar mais recursos do petróleo hoje para a transição. A foz do Amazonas é uma nova fronteira, assim como praticamente toda a margem equatorial. Esse tipo de situação é bastante complicado de aceitar. Quer dizer, você vai intensificar o problema para financiar sua solução. É isso que está sendo proposto”, explicou.
Em tempo 3: Falando em recursos para transição, a vice-presidente de sustentabilidade da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), Marie Owens Thomsen, disse ser “ultrajante” os países darem subsídios aos combustíveis fósseis. “Todos os países, provavelmente sem exceção, dão subsídios diretamente às empresas de petróleo para melhorar seus lucros. E governos evitam dar subsídios equivalentes aos produtores de energia limpa. Isso não faz sentido”, disse ao Estadão. Para a executiva, o setor aéreo está atrasado na descarbonização porque não há combustível sustentável disponível no mercado, e os governos precisam fazer sua parte para que o transporte seja limpo parando de subsidiar a indústria de combustíveis fósseis.
No Brasil, para cada R$ 1 aplicado em subsídios pelo governo federal em fontes renováveis de energia, outros R$ 4,52 são aplicados pelos cofres públicos na indústria de combustíveis fósseis – 82% do total. É o que mostrou a 7ª edição do monitoramento dos subsídios federais para combustíveis fósseis e fontes renováveis, lançada pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) em outubro do ano passado.
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Fernando Frazão/Agência Brasil