Transtornos mentais comuns, multimorbidades e insegurança laboral são temas tratados nos artigos
Karina Penariol Sanches, Fundacentro
A saúde dos profissionais da saúde é tema de constante investigação em decorrência da insuficiência e das fragilidades do sistema e das políticas públicas direcionadas a esses trabalhadores. Condições inadequadas de trabalho das equipes, distribuição desigual de equipamentos e recursos, dificuldades de gestão são alguns aspectos estudados.
Artigos publicados na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (RBSO) trazem estudos que entrevistaram centenas de trabalhadores da saúde em relação a multimorbidades, impactos dos transtornos mentais comuns e inseguranças durante a atuação profissional.
Multimorbidades em trabalhadores da atenção básica à saúde
Os transtornos mentais comuns (TMC) aumentam significativamente a probabilidade de profissionais da saúde terem duas ou mais morbidades diagnosticadas. O impacto atinge os adoecidos e o próprio atendimento do sistema de saúde, pois reduz a força de trabalho, aumenta a rotatividade de empregos, as aposentadorias precoces e compromete os salários. É o que aponta o artigo Fatores associados a multimorbidades autorreferidas em trabalhadores da rede de saúde municipal, que traz estudo com 203 profissionais da atenção básica à saúde de Diamantina (MG).
Os resultados da pesquisa revelam que quase 30% dos entrevistados têm duas ou mais morbidades diagnosticadas, sendo sobrepeso, hipertensão e depressão / estresse as mais prevalentes. As multimorbidades, no entanto, estão associadas a outros fatores além dos TCM, como idade superior a 48 anos e apoio social inadequado no trabalho. Características organizacionais do trabalho também impactam, como alta exigência física e demanda psicológica.
A necessidade de cuidado com a saúde dos trabalhadores da saúde apontada pela pesquisa reforça muito do que tantos outros estudos também observaram. Melhores condições de trabalho desses profissionais têm consequência direta na melhoria da qualidade e na sustentabilidade dos serviços de saúde prestados à população. Entre as recomendações, a pesquisa pontua a necessidade de implementar estratégias de prevenção e monitoramento de adoecimentos entre os profissionais da saúde. Reforça também a importância de políticas que promovam um ambiente de trabalho saudável e que ofereça apoio e acolhimento aos trabalhadores.
Mecanismo de proteção à saúde mental
Uma estratégia para reduzir significativamente a ocorrência de TMC é participar de atividades de lazer, em especial atividades culturais e sociais, configurando um importante fator de proteção à saúde mental. É o que revela estudo Atividades de lazer e transtornos mentais comuns entre médicos de municípios baianos publicada no volume 49 da RBSO. Realizada com 156 médicos que atuam na atenção primária e em serviços especializados em seis municípios da Bahia, a pesquisa identificou ainda que a satisfação com o trabalho e o sexo do profissional também são elementos que influenciaram a saúde mental desses profissionais trabalhadores.
Entre os sintomas relatados pelos entrevistados, sobressaem dores de cabeça frequentes, problemas de sono, tensão ou nervosismo, falta de interesse, cansaço. O estudo identificou ainda que os TCMs ocorrem quase quatro vezes mais entre as médicas (14,3%) do que entre os médicos (3,7%).
Diante dos resultados, o artigo observa que a promoção da saúde mental dos trabalhadores da saúde passa por políticas públicas que contemplem não apenas a melhoria das condições de trabalho desses profissionais, mas também o estímulo às atividades de lazer.
Insegurança laboral na odontologia
A saúde dos profissionais da saúde sofre constantemente por conta das condições de trabalho a que estão sujeitos esses trabalhadores. A crise sanitária da pandemia da Covid-19, no entanto, deu outra dimensão aos medos e inseguranças desses profissionais. O artigo Fatores associados à insegurança laboral em profissionais de saúde bucal do Sistema Único de Saúde durante a pandemia de Covid-19 traz exemplo dessa realidade a partir de estudo com dados de 801 profissionais do Ceará, coletados em maio de 2020, no auge da pandemia.
Apesar das diversas notas técnicas e novos protocolos com vistas a tornar o processo de trabalho mais seguro, a pesquisa identificou que mais da metade dos entrevistados se sentiam inseguros para realizar suas atividades profissionais. Entre os fatores de insegurança, estava a falta de equipamentos de proteção individual (EPI) recomendados. Quase 74% dos entrevistados informaram não ter recebido todos os EPIs, entre aventais e máscaras. O maior tempo de formação e o vínculo empregatício efetivo também foram associados, além do nível de atenção à saúde em que atuavam, se primário ou secundário.
O estudo delineia um cenário já conhecido de um sistema de saúde insuficiente e falho na gestão da crise sanitária. Figuram a oferta inadequada de condições de trabalho das equipes de saúde bucal e a distribuição desigual de equipamentos de proteção individual entre os profissionais e as regiões do estado.
Leia os artigos na íntegra:
Fatores associados a multimorbidades autorreferidas em trabalhadores da rede de saúde municipal
Atividades de lazer e transtornos mentais comuns entre médicos de municípios baianos