Esse é um trabalho que já está em andamento em uma comissão específica para o tema no Conselho Nacional de Educação
Por Bruno Alfano, em O Globo
O Ministério Público Federal (MPF) pediu ao Conselho Nacional de Educação (CNE) para terminar em até 120 dias o plano de reposição de aulas que são canceladas por conta de episódios de violência no entorno das escolas. Esse é um trabalho que já está em andamento em uma comissão específica para o tema no CNE. A recomendação é do procurador Julio José Araujo Junior.
O pedido do MPF é para que o documento aponte “diretrizes necessárias para a adequada reposição de aulas perdidas em razão de operações policiais e violência armada” e também as formas de “devida reparação aos estudantes e profissionais de educação que sofrerem os seus impactos”.
O procurador defende ainda que o documento deve levar em conta a necessidade efetiva de “um plano de reposição de aulas e apontar, entre outros pontos, a insuficiência de atividades remotas, além de não onerar a carga horária do corpo docente, salvo em caso de contrapartida”.
No começo deste ano, o Conselho Nacional de Educação (CNE) criou a Comissão de Acompanhamento da Obrigatoriedade de Cumprimento dos 200 Dias Letivos, após uma mobilização da Redes da Maré. A ideia é ter um pacto para monitorar redes que sofrem com aulas suspensas por violência ou por outras questões como fenômenos climáticos extremos. Duzentos dias é o mínimo previsto pela lei brasileira para um ano letivo.
Em muitos casos, há um arremedo dos dias impactados. A comissão foi formada para que os 200 dias sejam efetivamente cumpridos com qualidade para a aprendizagem — explica a conselheira Cleunice Rehem, que preside a comissão, no começo de julho ao GLOBO.
De acordo com Rehem, ainda são discutidas as formas adequadas para a reposição. Entre as opções em debate estão aulas on-line, encontros aos sábados e utilização de dias de férias para reposição. A previsão é que um Pacto Nacional pelo Cumprimento dos 200 Dias Letivos seja apresentado até novembro.
De acordo com Andreia Martins, pesquisadora de Educação e diretora do Redes da Maré, um dos territórios mais impactados com esse problema no Rio, é comum que as aulas perdidas por episódios de violência não sejam repostas de forma adequada.
As escolas já deixam uma folhinha com as crianças para esses casos ou então mandam alguma tarefa por WhatsApp com instruções. Mas a gente percebe que isso não tem valor pedagógico. Num dia de conflito, o que se vê é uma enorme tensão. É difícil imaginar, no meio disso tudo, uma criança pegar para fazer uma tarefa com qualidade. Muitas vezes, o exercício nem trata do tema que trataria a aula do dia. É uma coisa só para constar, mesmo — afirma a pesquisadora.
No país, 3% dos professores dizem que seus colégios foram impactados por tiroteios ou balas perdidas. No Rio, esse índice é cinco vezes maior, de 16%, segundo dados recolhidos pelo questionário destinado a professores de português e matemática na aplicação do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), do Ministério da Educação.
Outro pedido do MPF é que o CNE estabeleça mecanismos de monitoramento para o acompanhamento da implementação da resolução, “preferencialmente por meio de comitê com participação de entidades como fóruns de educação, sindicatos de profissionais da educação, representantes de pais e responsáveis e organizações que se dedicam à efetivação do direito à educação de moradores de favelas e periferias”.
Em maio, o plano do CNE era apresentar o Pacto Nacional pelo Cumprimento dos 200 Dias em dezembro durante um evento nacional. Esse cronograma já tem sido adiantado para pelo menos novembro — o que atenderia o MPF.
Além de orientações para a rede, também está sendo construído um observatório do cumprimento dos 200 dias. A ideia é de que esse organismo — ainda em elaboração — receba as informações da rede e controle quais precisam de ações de reposição e quais são os formatos empregados.
Em nota, a Secretaria municipal de Educação do Rio disse que oferece estratégias como reforço escolar, apoio pedagógico nas próprias unidades, Aulões Cariocas para tirar dúvidas, videoaulas com questões comentadas e materiais específicos de reposição para minimizar os impactos pedagógicos dessas interrupções.
Já o Ministério da Educação (MEC) afirmou que lançou o Programa Escola que Protege, que vai fazer diagnósticos locais; criar protocolo de prevenção, resposta e reconstrução, orientando as redes a lidarem com situações de crise em caso de violência extrema; e formar e fortalecer capacidades locais. A previsão é que a implementação comece “nos próximos meses”.
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Polícia em comunidade do Rio de Janeiro. Foto: Ricardo Moraes, Reuters
