Cerimônia de assinatura foi realizada nesta segunda-feira (13), no Jardim Botânico, com a presença de diversas autoridades
Procuradoria da República no Rio de Janeiro
O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no Rio de Janeiro, assinou, junto a órgãos públicos e representantes da comunidade do Horto, acordo coletivo que garante a permanência da comunidade em área pertencente ao Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ). O acordo foi homologado pela Justiça Federal na última sexta-feira (10) e assinado simbolicamente em cerimônia na manhã desta segunda-feira (13), no Jardim Botânico.
A cerimônia contou com a presença de diversas autoridades, entre elas o prefeito Eduardo Paes; o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão; o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Marcio Macedo; o presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), Luiz Paulo da Silva Araujo Filho; e os desembargadores federais Flavio de Oliveira Lucas e Ricardo Perlingeiro, presidente e ex-presidente da Comissão de Soluções Fundiárias do TRF2, respectivamente.
O termo foi celebrado no âmbito de incidente de soluções fundiárias em trâmite no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) e busca conciliar o direito à moradia das famílias com a preservação ambiental e patrimonial do Jardim Botânico.
Assinam o documento, além do MPF – representado pelo procurador regional adjunto dos Direitos do Cidadão, Julio Araujo –, o JBRJ, a Associação de Moradores do Horto (AmahOr), a União, por meio da Secretaria-Geral da Presidência da República (SG/PR), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o município do Rio de Janeiro e a Defensoria Pública da União (DPU). A iniciativa é resultado de um processo de mediação conduzido pela Comissão de Soluções Fundiárias do TRF2, após provocação do MPF, reconhecendo o caráter coletivo e histórico do conflito fundiário.
Para Julio Araujo, a assinatura é, além de histórica, um marco para o tratamento de conflitos fundiários no país. “O Horto não merecia um desfecho diferente desse. Foram décadas de conflito e resistência da comunidade. Após muita luta por fazer valer o direito da comunidade, conseguimos neste caso mostrar que o conflito tem rosto e tem história e que essas pessoas cuidam desse espaço muito bem. Para promover direitos fundamentais, o sistema de justiça precisa estimular processos dialógicos de escuta e construção coletiva para tomar decisões mais justas”, afirmou.
Permanência regularizada – O acordo estabelece que o JBRJ apresentará, em até 30 dias, um plano de trabalho para formalizar termos individuais com os moradores.
A permanência dos moradores dependerá da comprovação de vínculo com antigos ocupantes autorizados ou da inclusão no cadastro de 2011, firmado entre o Iphan, a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Além disso, a regularização será condicionada à inexistência de risco geotécnico nas áreas ocupadas, com base em estudos técnicos realizados pela Prefeitura do Rio e pela Defesa Civil estadual.
Cada morador firmará um termo de acordo individual com o JBRJ, garantindo o direito à moradia e comprometendo-se com regras de convivência que proíbem a venda, a cessão ou o uso comercial do imóvel, exceto em casos de prestação de serviços compatíveis com a área residencial. As ampliações e reformas deverão respeitar as normas ambientais e dependerão de autorização prévia de uma comissão de acompanhamento, que terá participação paritária entre o poder público e a comunidade.
O acordo também cria uma Comissão de Acompanhamento Permanente, composta por representantes da SG/PR, do JBRJ, da Prefeitura e da comunidade do Horto, em composição paritária. O colegiado será responsável por monitorar a execução das cláusulas, propor ajustes e deliberar sobre casos de descumprimento, fortalecendo o diálogo contínuo entre os moradores e o poder público.
Com vigência permanente após a homologação judicial, o termo de acordo do Horto representa um marco na resolução de conflitos fundiários urbanos no país. O documento reconhece o vínculo histórico e social da comunidade com o território e reafirma o compromisso das instituições públicas com a conciliação, a proteção ambiental e o respeito aos direitos humanos e à dignidade das famílias que vivem há gerações no entorno do Jardim Botânico.
Histórico do caso – Desde 2021, o MPF, por meio da PRDC, atua para buscar uma solução conciliatória coletiva para o conflito. Em outubro de 2022, o MPF passou a estimular uma saída conciliatória, tendo provocado os órgãos para se manifestarem sobre a compatibilização dos bens jurídicos envolvidos (moradia, patrimônio público, meio ambiente), diante de ações de reintegração de posse contra centenas de famílias.
Ao longo de 2023, o MPF conseguiu a instituição de um grupo técnico na Secretaria-Geral da Presidência e a inclusão do caso na Comissão de Soluções Fundiárias do TRF2.
Em outubro do mesmo ano, o MPF emitiu recomendação ao Grupo de Trabalho Técnico (GTT) instituído pela Secretaria-Geral da Presidência da República para que o relatório final fixasse diretrizes claras garantindo a permanência da comunidade, com regras quanto ao uso dos imóveis, à sucessão hereditária, à vedação de uso comercial indevido, entre outras.
Em abril de 2024, o GTT entregou o relatório final recomendando a permanência da comunidade do Horto em área do Jardim Botânico, acolhendo orientações do MPF e estabelecendo diretrizes como limitação da expansão da comunidade, mitigação de riscos ambientais e integração das famílias às ações de preservação ambiental.
Após o relatório, a construção do acordo chegou a sua reta final. Nesse contexto, o MPF participou de audiências públicas que reuniram moradores, instituições federais, estaduais e municipais, ouvindo as demandas da comunidade e debatendo caminhos jurídicos, urbanísticos, ambientais e sociais para a regularização da ocupação.
Em outubro de 2024, definiu-se a formalização de um termo coletivo de convivência, com especificações para realocação de famílias em áreas de risco e apresentação de laudos técnicos para apoiar as decisões.
A partir de então, os órgãos passaram a discutir a minuta do acordo. Em maio de 2025, os termos do acordo foram aceitos por todas as partes, dando início à tramitação para assinatura. “Foi um longo caminho, mas o resultado é gratificante. É hora de lembrar de todos aqueles que lutaram pela permanência do Horto, que eu simbolizo na figura do jurista já falecido Miguel Baldez”, destacou Araujo.
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Imagem: Cerimônia de assinatura pela permanência da comunidade do Horto realizada nesta segunda-feira (13), no Jardim Botânico, com a presença de diversas autoridades – Foto: MPF
