Ibama, que multou Norte Energia em R$ 8 milhões por matar 16 t de peixes, quer R$ 3 milhões de índio que fazia artesanato com penas

Parecer enviado à Justiça defende que a multa deve ser anulada por ser desproporcional

O Ministério Público Federal se manifestou em parecer enviado à Justiça Federal contra uma multa de quase R$ 3 milhões aplicada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente contra um índio da etnia Wai-Wai por confeccionar e transportar artesanato feito com penas de aves. O índio foi autuado pelo Ibama em Oriximiná, oeste do Pará, em 2009, com 132 peças de artesanato. A Defensoria Pública da União (DPU) entrou com ação pedindo anulação da multa e o MPF foi chamada a dar parecer, como fiscal da lei.

“Chama atenção a violenta desproporcionalidade da multa aplicada. A título de comparação, a empresa Norte Energia S.A, concessionária da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, foi multada pelo Ibama no valor de 8 milhões de reais por ter provocado a morte de 16 toneladas de peixe. A Norte Energia, pessoa jurídica responsável pela mais cara obra pública em andamento no Brasil, orçada atualmente em 32 bilhões de reais, foi atuada pelo Ibama em apenas 8 milhões, por crime ambiental inegavelmente mais grave – e de mais severa repercussão socioeconômica – que a conduta praticada pelo indígena”, diz o parecer assinado pelo procurador Camões Boaventura, de Santarém.

A Fundação Nacional do Índio (Funai), também se manifestou no processo e informou à Justiça que o índio multado pelo Ibama não trabalha com produção em larga escala, nem mesmo com recursos ou tecnologias que causem impacto ambiental sobre a população local de papagaios. “Ademais, a fabricação de adornos não impacta o meio ambiente nem afeta o modo de vida tradicional da etnia Wai Wai. Ao contrário, fortalece as estratégia de sustentabilidade cultura, ambiental e econômica desse povo”, opinou a Funai.

Para o MPF, a atuação do Ibama na aplicação da lei deve considerar obrigatoriamente a diversidade cultural dos povos que habitam o país, em obediência também à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. “A autarquia federal (Ibama) deveria ter considerado que o artesanato constitui uma forma de expressar a identidade étnica, que é o conjunto de aspectos socioculturais identitários, cosmológicos e valores que compõem cada etnia. O artesanato também é uma importante fonte de renda para centenas de povos indígenas no Brasil, especialmente aqueles indígenas que residem em centros urbanos”, diz o parecer.

O índio Timóteo Taytasi Wai-Wai estuda no núcleo urbano de Oriximiná e usava a venda de artesanato para se sustentar longe da aldeia. Depois da autuação e da multa do Ibama, além da dívida, encontra dificuldade para continuar os estudos. O MPF destaca no parecer que os povos indígenas, com técnicas reconhecidamente sofisticadas de manejo da agrobiodiversidade e tecnologias de baixo impacto ambiental, protegem o meio ambiente em seus territórios, o que se traduz no índice de desmatamento de terras indígenas, que na média não passa de 1%. “Bastante inferior ao índice encontrado em unidades de conservação gerenciadas pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, órgão do governo brasileiro), por exemplo”.

Processo nº 4306-53.2015.4.01.3902

Justiça Federal de Santarém

Ministério Público Federal no Pará
Assessoria de Comunicação

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

4 × 4 =