Ibama autuou 27 empresas de agrotóxicos por dados falsos em 2015

“De 2000 para 2013, a prevalência de anomalias em bebês em todo estado de São Paulo dobrou. De seis a cada mil bebês nascidos com o problema, passaram a ser 12 a cada mil. No mesmo período a utilização de agrotóxicos no estado quase dobrou, passou de 41 mil toneladas utilizadas por ano para 74 mil. A força-tarefa montada pelo defensor público Marcelo Novaes, acredita que o crescimento paralelo não é mera coincidência.”

Por Pedro Durán, na CBN

Cidades brasileiras com altos índices de câncer e anomalias em bebês.

“A minha filha tinha doze, na mesma época eu perdi um priminho de cinco anos, um tio… Só da minha família! Assusta porque nós temos os casos, mas nós podemos ter muitos outros, né?”

Números que assustam até os políticos responsáveis por cuidar da saúde da população.

“Eu tô surpreso com essas informações, essas coisas que você tá passando, pra você ter uma ideia, não é uma coisa nem questionada.”

E a revolta dos defensores públicos.

“É uma questão de saúde pública. Nós estamos enfrentando um genocídio da nossa infância.”

Nesta semana, a CBN apresentou a série de reportagens: “Agrotóxicos, Perigo Invisível”, em que revelamos a situação de cidades de intensa atividade agrícola, onde os cidadãos enfrentam problemas de saúde listados como efeito do uso de agrotóxicos. Em algumas delas, a prevalência de mortes por câncer e anomalias em bebês é maior que o triplo da média estadual.

Com base nos números, o Ministério Público Estadual de São Paulo estuda abrir um inquérito. A região de Ribeirão Preto é uma das mais afetadas pelos altos índices. A promotora Cláudia Habib já acompanha o problema na região há anos e agora planeja uma nova frente de investigação.

“Agrotóxicos envolvem vários setores: a empresa que faz uso dele, a empresa que eventualmente fabrica, a propriedade que recebe, o proprietário que está fazendo o uso, onde os trabalhadores estão ali empregados. Precisa ser analisado para verificar a quem cabe essa responsabilidade. ‘Todos estão sujeitos a algum tipo de penalidade?’. Dependendo da conduta de cada qual, certamente”, explica Habib.

De 2000 para 2013, a prevalência de anomalias em bebês em todo estado de São Paulo dobrou. De seis a cada mil bebês nascidos com o problema, passaram a ser 12 a cada mil. No mesmo período a utilização de agrotóxicos no estado quase dobrou, passou de 41 mil toneladas utilizadas por ano para 74 mil.

A força-tarefa montada pelo defensor público Marcelo Novaes, acredita que o crescimento paralelo não é mera coincidência.

Eles já mandaram ofícios para as 645 prefeituras de todo estado de São Paulo pedindo informações sobre pacientes com câncer. O próximo passo é pedir análises da água e exames toxicológicos nas cidades mais afetadas.

“Vamos oficiar a Secretaria de Saúde para que ela faça exames na água desses municípios, nos pontos de consumo. Sem descartar a possibilidade de avançarmos para a realização de uma bateria de exames toxicológico na população, no leite materno, no sangue das pessoas. Temos que investigar”, diz Novaes.

Mas as investigações dos impactos dos agrotóxicos na saúde têm enfrentado um grande obstáculo: as informações falsas. Nos últimos anos, o Ibama encontrou 200 dados falsos entre o que foi informado pelas empresas. Pela primeira vez, o resultado das auditorias foi reunido em um sistema digital e 27 empresas foram advertidas em 2015, o que acarreta no impedimento da comercialização de certos produtos.

Ainda assim, o Diretor de Qualidade do Ibama, Márcio Rosa Rodrigues de Freitas, não vê conflito de interesses no fornecimento dos dados pela própria indústria, embora considere as informações falsas um fato grave.

“É grave, mas nós temos esse controle. Essa situação de descumprimento, de desconformidade, ela acontece no mundo inteiro. Nós temos que ter instrumentos para controlar isso”, explica Freitas.

Especialistas ouvidos pela CBN apontaram prováveis soluções para os problemas relacionados aos agrotóxicos no país. Uma das ideias mais populares é o aumento da rastreabilidade das frutas e hortaliças. Na opinião de Anita Gutierrez, da Seção de Controle de Qualidade Hortigranjeira do Ceagesp, maior entreposto de alimentos da América Latina, a proposta aumentaria o vínculo entre produtor e consumidor.

“A gente investe um monte em rotulagem, o produtor colocar o seu nome na caixa do produto que vem aqui. E isso muda tudo. Logo que nós começamos a fazer isso, a primeira grande questão que foi levantada foi isso: mas eu sei que eu estou aplicando um agrotóxico não registrado pro meu produto. E aí? Mas eu tenho que colocar meu nome lá. Então muda a postura do produtor em relação à sua responsabilidade para aquele produto”, diz Gutierrez.

A reportagem da CBN entrou em contato com o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal, que reúne os fabricantes de agrotóxicos, mas eles não quiseram se manifestar sobre os dados falsos. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria de Saúde Estadual de São Paulo disse que não há comprovação científica entre os altos índices e o uso de agrotóxicos. Eles decidiram não se pronunciar.

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