Evento ocorre entre os dias 16 e 18. Audiência pública, debates, feira e oficinas compõem a programação. Nesta sexta-feira, durante a manhã, participantes caminharão até a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), onde parlamentares receberão manifesto sobre crimes contra o Cerrado. Medidas em prol do bioma, como a aprovação da PEC 504/2010 – que reconhece Cerrado e Caatinga como Patrimônio Nacional -, também constarão no documento
Por Elvis Marques, CPT Nacional e Coletivo de Comunicação do Cerrado
Cercada por universidades, a Praça Universitária, localizada na região Central de Goiânia, acolhe, desde ontem, 16, centenas de pessoas vindas de todos os cantos de Goiás e até de outros estados. Indígenas Tapirapé, Karajá, quilombolas, pequenos agricultores, e acampados. É o povo do Cerrado, do campo e da cidade, que ocupa esse espaço por conta do 1º Encontro da Tenda dos Povos do Cerrado.
O evento teve início nesta quarta-feira, 16, após um delicioso almoço, com uma Audiência Pública, na qual pessoas das comunidades apresentaram problemáticas em relação à água. Relatos que foram ouvidos por representantes de órgão públicos do estado e de meio ambiente, como Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Secretaria de Meio Ambiente, Saneago, e outros. A audiência foi mediada pela deputada estadual Adriana Accorsi (PT).
Professora aposentada e moradora da Comunidade João de Deus, no município de Silvânia (GO), Ritalina Ribeiro denunciou, na audiência, que o Rio Piracanjuba – principal de sua região – tem sido impactado com a extração de areia e argila. “Depois da chegada da mineração no rio, tudo mudou. A gente não toma mais água do rio”, lamenta. Quando ainda era professora, Ritalina recorda que levava seus alunos e alunas para banharem no rio. “Tinha muita água. Brincávamos na prainha. Ainda tinha as matas ciliares e muitos animais”, conta.
As águas do Rio Piracanjuba, antes abundantes, hoje estão literalmente com volume baixo. “O rio diminuiu a quantidade de água. O rio está silencioso”, afirma a educadora.
Todavia, a Comunidade João de Deus, conta Ritalina, tem se mobilizado para salvar o rio, seja através do trabalho de recuperação de nascentes ou da realização de audiências públicas na Câmara Municipal da cidade, mas a professora, e diversas outras pessoas da região, questionam: “O que adianta fazer o trabalho de recuperação de nascentes se a mineração continua no rio?”
“Sem água nós somos pó”. Essa afirmação é do trabalhador rural Elmar de Oliveira Silva, do Assentamento Canaã, localizado em Flores de Goiás, Nordeste goiano. Lá na região a preocupação é com o Rio Paranã, algo não muito diferente do que Ritalina contou. O rio, segundo Elmar, tem sido envenenado com os agrotóxicos usados em lavouras, e grande parte da mata ciliar já não existe mais. “Dinheiro não vale nada. O que vale mesmo é água. Nós somos natureza. Sem natureza não somos nada”, ressalta o assentado.
As falas de Elmar e Ritalina vão de encontro com a do professor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Roberto Malheiros, que, na audiência, apresentou um breve histórico sobre a formação do Cerrado e das abundantes fontes de água, que são responsáveis por abastecer os principais rios brasileiros.
Superintende do Ibama em Goiás, Renato Paiva afirmou, na abertura da Tenda, que no próximo ano o órgão ambiental no estado deve receber mais verba para a proteção do bioma. “Na semana passada estive em Brasília com meu diretor de fiscalização, e consegui recursos para o ano que vem a gente fazer o combate ao desmatamento no Cerrado. O foco hoje do Ibama está exatamente na proteção de nossos biomas e das nossas águas”, ressaltou o servidor.
A deputada goiana Adriana Accorsi, autora do Projeto de Lei (PL) de proteção do pequizeiro, se comprometeu, ao fim da audiência, apresentar o documento final do evento, que contará com as denúncias das comunidades goianas, para a Assembleia Legislativa de Goiás.
Preparação
Nos meses de setembro e outubro, antes do evento chegar à capital do estado, foram realizados seminários nas cidades de Orizona, Cidade de Goiás, Iporá, Terezinha de Goiás, Formosa, Alvorada do Norte, Catalão, Ipameri, Uruaçu, Formoso, Rio Verde, Jataí, e Região Metropolitana de Goiânia. “A importância desse evento é exatamente trazer os povos do Cerrado – do campo e das cidades – para discutirem esse bioma e a questão da água, pois o Cerrado, onde nasce a maioria dos rios brasileiros, está passando por um grave momento”, destaca Romerson Alves, coordenador da CPT Goiás.
Parcerias
O evento conta com parceria da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Cajueiro, Gwatá – Núcleo de Agroecologia da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Rede Grita Cerrado, Central Única dos Trabalhadores (CUT-GO), Sindsaúde, Pastoral da Juventude Rural (PJR-GO), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST-GO), Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Goiás (Fetaeg), Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf-GO), Centro de Estudos Bíblicos (Cebi-GO), Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB-GO), e Comunidades Eclesiais de Base (Cebs).