O Brasil não pode se resumir ao antipetismo contra o antibolsonarismo. Por Leonardo Sakamoto

blog do Sakamoto

Surfando na polarização com o PT, Jair Bolsonaro vai crescer junto com Fernando Haddad.

O ex-capitão compensou o pouco tempo de rádio e TV de sua candidatura com a superexposição jornalística devido ao atentado que sofreu há 12 dias. Menos pela comoção por ter levado uma facada (a última pesquisa Datafolha aponta que apenas 2% dos eleitores se sensibilizaram a ponto de mudar de voto) e mais por garantir que seu nome tivesse exposição gratuita para além de sua militância nas redes sociais. Com o ataque, a artilharia de Geraldo Alckmin nos spots de rádio e TV, preparada para desidratar Bolsonaro, saiu do ar.

Isso ocorreu simultaneamente ao processo de substituição de Lula por Fernando Haddad após a rejeição da candidatura do ex-presidente pelo Tribunal Superior Eleitoral e, consequentemente, ao início da transferência de votos de seu estoque para o escolhido. Mas também da transferência de parte de sua rejeição, que cresce à medida em que a população percebe que Lula é Haddad e Haddad é Lula.

Geraldo Alckmin tem dito que é mais capaz de derrotar o PT, embasado em simulações de segundo turno entre ambos. Mas Bolsonaro, mesmo da cama de hospital, está sendo mais competente em se vender como aquele que pode derrotar o substituto de Lula. Não apenas isso: tenta conquistar um voto útil antipetista já no primeiro turno porque sabe que, no segundo, enfrentará não apenas políticos, mas parte barulhenta da sociedade civil organizada.

Afinal, se por um lado, venderá o embate como uma disputa contra a ”corrupção”, por outro, terá enfrentar uma possível frente ampla voltada a impedir a vitória da ”barbárie”.

Da mesma forma que Alckmin pela centro-direita contra Haddad, Ciro e Marina se afirmam como mais capazes de derrotar Bolsonaro e seu ”vice”, general Hamilton Mourão, pela centro-esquerda. O candidato do PDT está melhor posicionado e obtém melhores resultados contra a chapa PSL-PRTB nas simulações de segundo turno. Por um lado, poderia agregar votos de antipetistas que também são antibolsonaristas e votam no PSDB, na Rede ou em outros partidos. Mas, neste momento, não tem tempo de rádio e TV, nem estrutura partidária e conta com um adversário que tem a benção do principal cabo eleitoral do país, que se encontra preso em Curitiba, para passar de 7 de outubro.

O problema para Alckmin, Ciro e Marina é se o eleitorado embarcar nesta aposta de polarização entre Bolsonaro e Haddad, em que cada um acredita que supera o outro com o votos dos demais candidatos de seu campo ideológico.

Alguns defendem que uma disputa polarizada deixa claro diferentes projetos de país para que o eleitorado escolha aquele que melhor condiz com sua visão de mundo. Pois um eleito não vai governar com base no antipetismo ou no antibolsonarismo, e sim com um programa que, nesse caso, pode ser de extrema direita ou esquerda/centro-esquerda.

Mas esta tem sido uma eleição em que apresentar e aprofundar propostas para gerar postos de trabalho para 12,9 milhões de desempregados é menos importante do que desumanizar a imagem do adversário político e ignorar o que o outro lado diz, pensa e sente. Uma eleição mais guiada pelo ódio à diferença do que por encontrar formas de garantir que a vontade da maioria não passe por cima da dignidade das minorias, pressuposto básico da democracia. Pois uma coisa é se colocar contra um projeto de país e buscar derrota-lo nas urnas, outra é cultivar o ódio ao adversário e nutrir-se dele por anos a fio – coisa que muitos brasileiros já mostraram que sabem fazer muito bem.

Diante disso, fica a dúvida: quando a poeira de outubro baixar, ainda teremos um país ou vamos ter que começar tudo de novo?

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