Detenção do defensor de direitos humanos e advogado José Vargas Sobrinho Júnior

Por Front Line Defenders

No dia 1º de Janeiro de 2021, o defensor de direitos humanos e advogado José Vargas Sobrinho Junior foi detido em Redenção, Pará. A detenção está ligada a um inquérito policial sobre o desaparecimento de Cícero José Rodrigues de Souza, presidente da Associação dos Epilépticos do Redenção e ex-candidato a vereador nas eleições municipais de 2020. Cícero José Rodrigues de Souza está desaparecido desde 20 de outubro de 2020.

José Vargas Sobrinho Junior é um defensor de direitos humanos, professor universitário e advogado. Tem uma longa trajetória de atuação em defesa de trabalhadores sem-terra, populações indígenas e comunidades tradicionais do estado do Pará, em uma das regiões mais perigosas do Brasil para a defesa do direito à terra. O advogado é bastante conhecido por sua atuação em casos coletivos emblemáticos, o que contraria interesses de latifundiários e outros grupos econômicos da região, como a defesa das vítimas do massacre de Pau D’Arco, atuando em representação de trabalhadores sem-terra contra a multinacional JBS e por sua representação dos indígenas Kayapó contra empresas mineradoras em Cumaru do Norte. Como reconhecimento pelo seu trabalho na defesa de direitos humanos, particularmente direito à terra, José Vargas recebeu o prêmio João Canuto em 2017, concedido pelo Movimento de Direitos Humanos (MhuD) e a medalha Paulo Frota 2018, outorgada pela Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA).

Em 1º de Janeiro de 2021, por volta do meio dia, policiais prenderam José Vargas Sobrinho Junior enquanto ele estava em casa com a sua esposa e duas filhas. Durante a operação, o telefone celular e computador foram apreendidos. O defensor de direitos humanos foi escoltado por policiais armados até o complexo prisional de Redenção. De acordo com a versão apresentada pela Polícia Civil e Ministério Público, que também participa das investigações preliminares, o suposto envolvimento do defensor se baseia exclusivamente em transcrições de alguns áudios de WhatsApp. O procedimento investigativo ainda se encontra em fase de inquérito policial, sem denúncia formalizada contra ele.

Em 4 de Janeiro de 2021, um pedido de Habeas Corpus foi impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção Redenção/PA, alegando que a prisão de José Vargas Sobrinho Junior foi injustamente baseada em evidências não substanciais e argumentos frágeis. A OAB argumentou que a privação da liberdade de José Vargas Sobrinho Junior foi baseada “em premissas hipotéticas, sem comprovação nos autos” e sustentada por uma “fantasiosa tese levantada pela autoridade policial”. Os pedidos de relaxamento de prisão foram negados, apesar de a legislação brasileira prever esse direito: o defensor dos direitos humanos é réu primário, tem família, residência e trabalho permanente em Redenção, cumprindo todos os requisitos do Código de Processo Penal para responder ao processo, que ainda se encontra em fase de inquérito policial, em liberdade. Desde a detenção, arquivos de áudio e fotos não relacionados ao caso têm sido divulgados em redes locais e grupos de WhatsApp com a clara intenção de atacar a credibilidade do defensor e destruir sua imagem pública.

A Front Line Defenders tem observado uma tendência global de uso indevido do sistema judicial para silenciar defensoras e defensores de direitos humanos através do aprisionamento, de forma a destruir a sua reputação e interromper o seu trabalho. Portanto, simultaneamente silenciando as vítimas de violações de direitos humanos que eles apoiam. José Vargas Sobrinho Junior possui um histórico de perseguição como defensor de direitos humanos. O defensor está incluído no Programa de Proteção a Defensores e Defensoras de Direitos Humanos do Pará devido às crescentes ameaças em retaliação ao seu trabalho na defesa de direitos humanos, especialmente em relação à liderança na busca de justiça para os sobreviventes do Massacre de Pau D’Arco – um caso em que 10 trabalhadores rurais foram mortos por policiais e ainda aguarda resolução. No passado, José Vargas Sobrinho Junior já foi forçado a deixar a cidade com a sua família, como uma medida de proteção em face do aumento de ameaças contra a sua vida.

A Front Line Defenders reconhece a importância de investigar e elucidar todos os fatos sobre este gravíssimo caso envolvendo Cícero José Rodrigues de Souza. No entanto, a Front Line Defenders acredita que a investigação de seu desaparecimento vem sendo também utilizada como uma ferramenta para deslegitimar o trabalho de José Vargas Sobrinho Junior como defensor dos direitos humanos.

A Front Line Defenders também está preocupada que a prisão preventiva de José Vargas Sobrinho Junior, medida emergencial tomada pelas autoridades há mais de uma semana, não tenha sido relaxada, apesar do dispositivo da legislação brasileira e da falta de evidências coerentes contra o defensor. A Front Line Defenders espera que o direito à presunção de inocência de José Vargas Sobrinho Junior seja respeitado pelas autoridades ao longo do processo deste caso e insta as autoridades no Brasil a liberar o defensor dos direitos humanos e realizar uma investigação imparcial das acusações feitas contra ele.

A Front Line Defenders insta as autoridades do Brasil a:

  1. Liberar José Vargas Sobrinho Junior da prisão preventiva, respeitando o seu direito de responder à investigação em liberdade;
     
  2. Assegurar ao José Vargas Sobrinho Júnior, enquanto na prisão, tratamento compatível com as condições estabelecidas na legislação brasileira, bem como com o “Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão”adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua resolução 43/173 de 9 de dezembro de 1988;
     
  3. Tomar todas as medidas necessárias para assegurar a integridade física e psicológica de José Vargas Sobrinho Júnior e seus familiares, em consulta a estes;
     
  4. Garantir, em todas as circunstâncias, que todos os defensores e todas defensoras de direitos humanos no Brasil, em particular aqueles que defendem o direito à terra, possam realizar suas atividades legítimas sem medo de represálias e livres de quaisquer restrições, inclusive assédio judicial.

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