Deputada Joenia em audiência pública no Senado pede que CPI da Covid-19 investigue tratamento dado aos povos indígenas durante a pandemia

Lideranças indígenas e senadores também participam da audiência

A deputada Joenia Wapichana (REDE-RR) fez uma fala contundente durante sua participação na audiência pública no Senado, na tarde desta sexta-feira, 30, com o tema “Ameaça de Genocídio Contra os Povos Indígenas Brasileiros: Enfrentamento da Pandemia de Covid-19 e o papel das instituições de Estado”. A parlamentar roraimense apresentou, além de dados preocupantes sobre o tratamento dispensado aos indígenas pelo Ministério da Saúde, graves denúncias feitas por organizações indígenas.

Diante de “erros grosseiros, omissão, negacionismo e até preconceito”, Joenia pediu que a CPI da Covid-19 convoque para dar depoimento às autoridades responsáveis pela execução da Saúde Indígena em nível nacional e distrital, além de lideranças indígenas e familiares de vítimas do coronavírus. A audiência virtual foi promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Direitos Humanos do Sendo com a participação de outras lideranças indígenas, como o Cacique Raoni, que falou na sua língua materna.

Entre os dados preocupantes apresentados pela Deputada estão o uso do “Kit Covid” (azitromicina e ivermectina) e a distribuição de cloroquina pelo Ministério da Saúde, utilizados no tratamento contra a Covid 19.  A fala da deputada foi reforçada com o depoimento de muita comoção, da líder indígena Maial Paiakan Kaiapó, do Pará, que narrou a morte do próprio pai após ser medicado por esse kit.

Outra denúncia apresentada diz respeito à falta de medicação adequada, como bloqueadores musculares, em caso relatado sobre indígenas Cinta Larga que faleceram por não resistirem ao processo de intubação justamente pela falta desse medicamento específico.

“Cheguei até a nem querer mais olhar o meu celular (de tanta tristeza). Porque chegavam mensagens sobre mortes de indígenas. Encaminhavam relatos de que muitos estavam morrendo porque não tinha remédios para intubação”, comentou Joenia Wapichana, que lembrou ser a única parlamentar indígena do Brasil e representa não apenas Roraima, mas os indígenas de todo o país.

Segundo a parlamentar, a vulnerabilidade epidemiológica e os fatores culturais dos povos indígenas eram de conhecimento do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena desde antes do início da pandemia. Assim várias medidas deveriam ter sido tomadas, com base neste conhecimento acumulado, mas não foi o que aconteceu. “Vários erros crassos foram cometidos pelo Governo”, destacou Joenia em sua fala e no documento apresentado aos participantes da audiência virtual.

Joenia ainda destacou haver subnotificação das mortes dos indígenas, o que significa que o impacto da pandemia dos povos indígena pode ser bem maior. Números apresentados nesta sexta-feira, 30, pelo Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena, apontam 53.329 indígenas infectados, com 1.059 óbitos e 163 povos indígenas afetados, representando 19,8% taxa de letalidade entre os povos indígenas.

Outro caso grave de violação de direitos refere-se a denúncia dos povos indígenas do aumento de invasão garimpeira em todo país durante a pandemia, especialmente na Terra Indígena Yanomami, onde as lideranças estimam a presença de 20 mil garimpeiros em suas terras. Este ano a Hutukara Associação Yanomami denunciou que funcionários da Sesai estariam trocando com garimpeiros ouro por vacina e medicamentos destinados aos indígenas.

Joenia Wapichana ainda relatou mais violações como a falta de acesso à água e condições sanitárias, a exemplo do que ocorreu com as comunidades Karitiana; a baixa vacinação em função das fake news disseminada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de grupos evangélicos; a falta de leitos de UTIs e de oxigênio, como aconteceu no estado do Amazonas. “Além do negacionismo defendido pelo governo, houve fake news que chegaram aos indígenas dizendo que eles iriam morrer ou virar jacaré”, frisou a deputada federal.

A parlamentar também ressaltou na audiência o problema da militarização da gestão da saúde indígena, como no Distrito Sanitário Especial Leste de Roraima, onde o então ministro Eduardo Pazuello nomeou como gestor um capitão do Exército da reserva, com 25 anos de experiência em inteligência militar. Ela disse que esse gestor confirmou a utilização de cloroquina para tratamento de Covid-19 entre indígenas de Roraima.

“Espero que a gente possa avançar e contem comigo nessas investigações”, concluiu a parlamentar, colocando-se à disposição para contribuir nos trabalhos da CPI no Senado. 

A audiência também contou com a participação do advogado indígena e coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Eloy Terena, advogada indígena e doutoranda em Direito pela Universidade de Brasília, Samara Pataxó e dos senadores, Jaques Wagner (PT-BA), presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), Confúcio Moura (MDB-RO), vice-presidente da CMA, Humberto Costa (PT-PE), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e Fabiano Contarato (Rede-ES), vice-presidente da CDH e ex-presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA) e coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista no Senado.  

Foto: Agência Senado

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