A mãe do Brasil é indígena: 5 mil guerreiras da ancestralidade ocupam Brasília em marcha histórica

Em defesa de seus corpos-territórios, mulheres indígenas de todo país manifestaram-se hoje (10/9) pelas ruas da capital federal

Por Anmiga, no Cimi

Brasília acordou hoje (10/9)  ao som dos cantos e maracás de mais de 5 mil mulheres indígenas, pertencentes a 185 povos, que se preparavam para marchar pelas ruas da capital. Em defesa de seus corpos-territórios e pelo fim do genocídio dos povos indígenas, a II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas trouxe a força das mulheres guerreiras da ancestralidade na luta pela vida. 

A marcha saiu do acampamento localizado na Funarte, seguindo pelo Eixo Monumental e pela via W3 Sul em direção à Praça do Compromisso, local onde, em 1997, o indígena Galdino Pataxó Hã-Hã-Hãe teve o seu corpo incendiado por 5 jovens que residiam no Plano Piloto. 

Durante a marcha, diversas faixas e cartazes trouxeram palavras de ordem contra a violência de gênero, contra o marco temporal, contra a invasão do garimpo, agronegócio e grandes empreendimentos que provocam a destruição socioambiental dos biomas e pela demarcação de seus territórios. 

Na praça do Compromisso, um grande boneco com a imagem de Jair Bolsonaro foi queimado. “Juntos queimam o racismo, a violência contra as mulheres e para que nunca mais um indígena seja queimado vivo nesse país”, disse Sônia Guajajara, liderança indígena da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).  

Para Alessandra Munduruku, liderança indígena do rio Tapajós, “estar nessa marcha é muito importante para as mulheres estarem juntas. Nossas comunidades, aldeias estão sendo atacadas, nossos povos estão sendo atacados e tudo isso está sendo aprovado aqui no Congresso e a gente precisa sair das nossas aldeias para denunciar aqui. Já chega de genocídio, já chega de morte, já chega de violência, de invasões, esses projetos de morte estão afetando nossas vidas, está afetando as mulheres, as crianças, os idosos, nossos territórios”. 

O ato aconteceu de maneira pacífica, após uma semana de tensões provocadas por atos e ameaças racistas vindos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. A marcha, que estava prevista para 9 de setembro, precisou ser adiada por questões de segurança. 

“A decisão tem como objetivo  de resguardar  a vida das mulheres, anciãs, jovens e crianças presentes, na mobilização que acontece desde o dia 7 de setembro, na capital federal, com a participação de mais de 5 mil pessoas de 185 povos, de todas as regiões do país”, reforça nota lançada ontem (9/9) pela Anmiga.

Segundo Shirley Krenak, liderança indígena da Anmiga e coordenadora de segurança da marcha, “nossa função enquanto segurança foi proteger as mulheres indígenas, levando todo esse processo da nossa marcha de uma forma muito positiva, pacífica, não tivemos nenhum problema, não tivemos ninguém passando por problemas no que diz respeito à violência, foi uma marcha totalmente cheia de paz”.

A marcha contou com uma equipe de mais de 50 pessoas, homens e mulheres indígenas, coordenados por Shirley desde o primeiro dia de acampamento, que precisou ser reforçada para garantir a segurança de mulheres e crianças durante todos os dias de atividade. 

Juventude indígena presente!

A marcha também ficou marcada pelo encontro de anciãs e jovens mulheres, algumas participando pela primeira vez de uma mobilização deste tipo. Esse encontro demarca o futuro da luta indígena, onde a juventude se faz presente nos processos de luta em defesa dos territórios e formando-se enquanto jovens lideranças.

Para Lídia Guajajara, indígena do povo Guajajara e comunicadora da Anmiga, “as mulheres protagonizaram esse momento que, pra nós, foi histórico, porque a juventude está fazendo essa participação pela primeira vez. Também viemos somar forças, mobilizar, porque aqui também se encontram várias referências, de lideranças mulheres, lideranças que vem forte nessa mobilização e trazem consigo essa força da juventude, que vem também protagonizando espaço trazendo a sua fala.”

II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, setembro, 2021. Foto: Hellen Loures /Cimi

Acampamento

Desde o dia 7 de setembro, 5 mil mulheres indígenas de 185 povos ocupam o gramado da Funarte, em Brasília, na II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, que tem como tema “Mulheres originárias: Reflorestando mentes para a cura da Terra”.

Lideranças indígenas femininas da Amazônia, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica, Caatinga e dos Pampas foram credenciadas e testadas para a Covid-19, dentro da parceria com Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz DF e RJ), Ambulatório de Saúde Indígena da Universidade de Brasília, Secretaria de Saúde do DF e Hospital Universitário de Brasília.  

A II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas contou com uma série de atividades que refletem não só as violências sofridas pelas mulheres indígenas no Brasil, como também trouxe a força da ancestralidade, rituais, acolhimento e diversidade, em um momento de celebração e reencontro.

“Estamos em busca da garantia de nossos territórios, das que nos antecederam, para as presentes e futuras gerações, defendendo o meio ambiente, este bem comum que garante nossos modos de vida enquanto humanidade”

“Estamos em busca da garantia de nossos territórios, das que nos antecederam, para as presentes e futuras gerações, defendendo o meio ambiente, este bem comum que garante nossos modos de vida enquanto humanidade. Para além de mero recurso físico, é igualmente morada dos espíritos das florestas, dos animais e das águas da vida como um todo, fonte de nossos conhecimentos ancestrais”, reforça o comunicado da Anmiga sobre a marcha.

Durante a Marcha, as mulheres também acompanharam o julgamento do marco temporal, quando todo o acampamento se concentrou na tenda principal para assistir a transmissão da sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que irá decidir o futuro das demarcações de terras indígenas em todo o país. 

II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, setembro, 2021. Foto: Dalton Yatabe

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