Descoberta de Cemitério dos Pretos Novos no RJ faz 26 anos e preserva história de resistência

Estimativa é que tenham sido enterrados, no local, entre 20 mil e 30 mil negros e negras que eram raptados da África

Jéssica Rodrigues, Brasil de Fato

A história negra no Brasil sofreu e, sofre ainda hoje, diversas tentativas de apagamento histórico. A descoberta do sítio arqueológico Cemitério dos Pretos Novos, na região portuária do Rio, em 1996, foi peça importante para resistência de tantas memórias.

Em 2022, a descoberta completa 26 anos. Para reverenciar a história dos escravizados, o Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN), que funciona no local do cemitério, criou o Circuito Histórico da Herança Africana.

O circuito é feito pela região conhecida como Pequena África, no bairro da Saúde, zona Central do Rio. É gratuito até o mês de abril e possui cerca de dois quilômetros, com início no Largo da Prainha e término no IPN.

Ele conta com guias turísticos especializados para mostrar detalhes de locais da cidade com a história dos escravizados, incluindo o Cais do Valongo, principal porto de entrada de milhares de africanos no Brasil e nas Américas. Para se inscrever basta acessar o site oficial do Instituto.

O guia turístico Rafael Moraes é voluntário no circuito e explica em entrevista para o programa Bem Viver, uma parceria da rede TVT com o Brasil de Fato, que “a descoberta do cemitério foi fundamental e é a prova física de que a escravidão aconteceu”.

“Todo relato tido sobre este cemitério mostra como eram feitos os enterros, que na verdade não eram bem enterros, os corpos eram simplesmente jogados’, explica Rafael.

Para o Diretor de Pesquisa Histórica do IPN, Cláudio Honorato, uma das principais metas do instituto ao criar esse circuito pela Pequena África é trazer conhecimento sobre esta parte da história do país, que não é contada na escola, pois é através do conhecimento que se combate o preconceito.

“O Brasil é constituído por uma mistura de vários povos e a participação da África é fundamental neste processo. A África é a grande placenta do mundo, e nós, brasileiros, estamos ligados a ela pelo cordão umbilical”, contextualiza Honorato.

O sítio arqueológico é considerado o maior cemitério de escravizados das Américas. A estimativa é que tenham sido enterrados entre 20 mil e 30 mil negros e negras que eram raptados da África e trazidos para o Brasil para se tornar escravos, mas não conseguiram sobreviver à viagem.

A descoberta do sítio arqueológico Pretos Novos

O cemitério foi encontrado por acaso. A família de Rafaelle Anjos, uma das fundadoras do IPN e Diretora de Desenvolvimento Educativo, decidiu fazer uma reforma na casa, local em que hoje funciona o IPN. Em meio à retirada de entulhos, partes de esqueletos foram encontradas. Na época, Rafaelle era adolescente.

Rafaelle conta em entrevista ao programa que em um primeiro momento acharam que eram ossos de animais, mas a família foi orientada a procurar a Prefeitura, que chamou arqueólogos do Instituto de Arqueologia Brasileira (IAB) para avaliar a situação.

“Eles [arqueólogos] viram que eram ossos humanos e permaneceram na casa por meses. Por fim, deram total certeza de que estávamos morando em cima de um antigo cemitério dos Pretos Novos”, finaliza.

Josefina Bakhita

Em 2017, foi encontrado o primeiro esqueleto completo no Cemitério dos Pretos Novos. Foram sete meses de escavações em uma área de 2 metros quadrados de um dos poços de observação do cemitério.

O esqueleto pertence a uma mulher que morreu há cerca de 200 anos, no início do século 19, com aproximadamente 20 anos de idade. Ela foi nomeada de Josefina Bakhita, em homenagem à primeira africana santificada pela igreja católica.

Edição: Eduardo Miranda

Imagem: O cemitério foi descoberto por acaso em meio a uma reforma residencial, quando partes de esqueletos foram encontradas – Reprodução / Instagram Instituto Pretos Novos

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