Dias após uma turba golpista de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadir e destruir os palácios da Praça dos Três Poderes, o Palácio do Planalto foi palco de uma das cerimônias políticas mais marcantes da história brasileira: a posse de sua primeira ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
As circunstâncias não poderiam ser mais simbólicas. A resistência dos Povos Indígenas a séculos de genocídio e perseguição pelos colonizadores cruzou com a resistência democrática ao golpismo protofascista. Não coincidentemente, os genocidas de ontem e os protofascistas de hoje compartilham história, preconceitos e ódios. Da mesma forma, não é coincidência que a resistência indígena e de outras minorias se alinhem há décadas com a luta pela democracia e contra o autoritarismo.
“A nossa posse aqui hoje, é o mais legítimo símbolo desta resistência secular preta e indígena do nosso Brasil. Nós estamos aqui hoje neste ato de coragem para mostrar que destruir essa estrutura do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional, não vai destruir a nossa democracia”, destacou Guajajara.
A celebração, no entanto, não tirou do caminho os desafios e os retrocessos deixados pelo último governo – e, em última análise, por séculos de perseguição e discriminação – na defesa dos direitos dos Povos Indígenas. Um dos obstáculos para o funcionamento do novo Ministério dos Povos Indígenas é o orçamento escasso: hoje, a pasta conta fundamentalmente com os recursos destinados à FUNAI, recém-transferida da Justiça, cerca de R$ 600 milhões para 2023.
Em entrevista ao UOL Ecoa, a nova presidente da FUNAI, Joenia Wapichana, ressaltou que o presidente Lula tem ciência de que esse orçamento é insuficiente para as necessidades da autarquia e do ministério como um todo. Um caminho potencial para aliviar esse aperto, ao menos neste começo de gestão, está no financiamento internacional. “Vamos buscar apoio a projetos [no exterior] para que não fiquemos restritos ao orçamento”.
Além do orçamento curto, o antigo governo também deixou uma herança realmente maldita para as Terras Indígenas: em todo o país, principalmente na Amazônia, estes territórios estão expostos à sanha de grileiros, madeireiros e garimpeiros, que levam destruição, fome, doenças e violência às comunidades indígenas.
((o)) eco, Observatório do Clima e Valor repercutiram a posse da ministra Sônia Guajajara e os desafios que o Ministério dos Povos Indígenas terá pela frente neste governo.
Em tempo: Um dos primeiros problemas que a nova pasta indígena deverá encarar é a demarcação de novas reservas, totalmente travada no último governo. O InfoAmazonia destacou dados da equipe de transição que mostram pelo menos cinco Terras Indígenas com processo avançado de demarcação na Amazônia que podem ser homologadas rapidamente; já outras 31 áreas dependem de medidas do Ministério da Justiça e da FUNAI. Alguns processos se arrastam há décadas, como o da TI Acapuri de Cima (AM), iniciado em 1991 e até hoje sem conclusão.