MPF produz laudo antropológico reconhecendo famílias que disputam áreas no interior do Pará como comunidade tradicional

Projeto de Assentamento do Incra levou membros de comunidade cipoeira a abandonarem seus lares e a perderem seus meios de sustento

Ministério Público Federal no Pará

O Ministério Público Federal (MPF) entregou, nesta segunda-feira (11), laudo antropológico que reconhece como comunidade tradicional famílias de cipoeiros que ocupam área no interior do Pará há anos, mas que passou a ser utilizada para realização de assentamento diverso pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Os cipoeiros formam a Associação Rio Arapari de Desenvolvimento Sustentável do Leste do Pará (ARADSLP), que é uma organização de extrativistas que possuem lotes florestais averbados totalizando uma área de 11 mil hectares com sede na Fazenda Anapuru, situada na margem esquerda do Rio Arapari, em Pacajá (PA). Eles sobrevivem do extrativismo do cipó com a manutenção da estrutura florestal.

Em 2017, o MPF ajuizou ação civil pública apontando irregularidades quanto ao assentamento. Foi requisitada a realização de estudos antropológicos para aferição de eventual caracterização dos membros da ARADSLP, nos termos da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais, como comunidade tradicional.

A perícia feita por antropólogos do MPF reconheceu, formalmente, os membros da associação e seus familiares como comunidade tradicional de cipoeiros. De acordo com o procurador da República Sadi Flores Machado, que entregou pessoalmente cópia do laudo a líderes da associação durante a reunião feita na sede do MPF no Pará, uma vez reconhecidos como população tradicional, os direitos e garantias da comunidade são tutelados por normas internacionais, reforçando assim a argumentação do MPF na ação. “Do mesmo modo, observa-se que no processo judicial o Incra não cumpriu a liminar”, esclareceu o procurador.

A liminar referida pelo procurador foi dada em 2018 pela Justiça Federal e proíbe o instituto de realizar novos assentamentos ou regularização de ocupações no local, obrigando o Incra a realizar estudos para excluir do projeto área ainda não demarcada e destiná-la a membros da associação e a respeitar a concordância prática entre os projetos de assentamento já instituídos e o novo projeto de regularização fundiária a ser implementado em favor da população tradicional. Agora, o laudo original será juntado aos autos do processo e será requerido prazo para o Incra se manifestar, além de comprovar o cumprimento da liminar.

Os cipoeiros residem no local desde os anos 90, inclusive organizando-se em associação, com estatuto social, e colaborando com o desenvolvimento econômico da região. Há anos eles se mobilizam, inclusive, contra a derrubada da floresta por madeireiros ilegais que sistematicamente atuam na região. Apesar disso, o Incra não os contemplou ao implementar o projeto de assentamento, obrigando-os a desocuparem a área que há anos residiam e a perderem, inclusive, seus meios de sustento.

Ação civil pública nº 0003426-75.2017.4.01.3907

Consulta processual

Foto: Comunicação MPF/PA

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