“As emissões da queima do óleo da margem equatorial são três vezes a meta [de redução das emissões] que o país assumiu para 2030”, destacam.
As contradições do governo brasileiro em relação aos combustíveis fósseis não passaram incólumes para diversas organizações presentes na COP28, em Dubai. Por isso, quase 130 entidades lançaram uma carta-manifesto criticando a realização do “Leilão do Fim do Mundo” nesta 4ª feira (13/12). No certame – o 4º ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC) –, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) vai oferecer mais de 600 blocos de exploração de petróleo e gás. Vários deles estão localizados em regiões de altíssima sensibilidade ambiental, como Fernando de Noronha, Atol das Rocas e Amazônia. E há também áreas próximas a Territórios Indígenas e Quilombolas e Unidades de Conservação.
“O preço da expansão do petróleo será uma conta cara demais para as gerações futuras. O objetivo de manter o aumento da temperatura global em 1,5°C não é apenas uma meta, é um limite”, diz um trecho da carta destacado pela Folha. “As emissões da queima do óleo da margem equatorial [que tem blocos no leilão] são três vezes a meta [de redução de emissões] que o país assumiu para 2030. Tal iniciativa levaria o Brasil de volta à estaca zero e nos colocaria na contramão do Acordo de Paris”, continua o documento.
Apesar do interesse das petroleiras – há 21 empresas habilitadas para o leilão, segundo O Globo –, o certame é alvo de ao menos de oito ações civis públicas. O Instituto Internacional Arayara ingressou com ações em diversas regiões do país para impedir a oferta de blocos no Amazonas, no Paraná, em Sergipe-Alagoas e Potiguar, além daqueles perto de Fernando de Noronha e Abrolhos. Nesta semana, o Arayara entrou com novas ações com a Coordenação Nacional da Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) para bloquear a oferta próximas a áreas sensíveis.
Para o Greenpeace, o leilão é mais um elemento na postura ambígua do governo brasileiro. Afinal, antes mesmo do início da COP28, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou que o governo “avaliava” um convite da OPEP+ a aderir ao cartel de países exportadores de petróleo. Diante de uma informação tão estapafúrdia às vésperas da conferência do clima, esperava-se que o convite fosse recusado. Mas dias depois, o presidente Lula confirmou a adesão, com desculpas sobre transição energética difíceis de engolir.
Terra, Valor, IstoÉ e Mídia Ninja também repercutiram o “Leilão do Fim do Mundo” e a reação das organizações quanto ao certame.
Em tempo: “Conferência do meio ambiente em Dubai [num Petroestado] e leilão de blocos de petróleo marcado pela ANP para 13 de dezembro colocam uma questão: chegamos ao topo do greenwashing? Estamos todos ‘cooptados’ pelo petróleo?” O questionamento é feito por Ricardo Fujii, do WWF-Brasil; Enrico Marone, do Greenpeace Brasil; Suely Araújo, do Observatório do Clima; e Juliano Bueno Araújo, do Instituto Arayara, em artigo no Le Monde Diplomatique que destaca o “Leilão do Fim do Mundo”. Os especialistas reforçam as imensas contradições do governo brasileiro e cobram ações imediatas rumo a uma matriz energética limpa se, de fato, o Brasil quer ser protagonista dos debates climáticos. “Não há como acumular as posições de país que assume a liderança nas negociações multilaterais do clima, se propondo a fazer a interligação entre os países ricos e os países em desenvolvimento, e de país que intenta se consolidar no grupo dos petroestados. Há contradição evidente. O Brasil terá de fazer uma opção, e essa escolha tem urgência. Em plena crise climática e com a perspectiva de queda da demanda pelos combustíveis fósseis – ela terá de ocorrer se pretendemos sobreviver e deixar algum planeta para as futuras gerações –, esperamos que nosso país faça a escolha pela descarbonização e pela Justiça Climática”, reforçam.
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UNFCCC Flickr / COP28