Os fundamentos míticos do capitalismo. Por Gil-Manuel Hernández i Martí

O mito de Ícaro ilustra as consequências desastrosas da ambição desmedida

IHU

“Todas as mitologias das culturas da terra nos alertam sobre a hybris: não podemos ser como deuses, porque pereceremos por causa disso. Na tradição grega, a hybris ou hubris é um termo que se refere à arrogância desmesurada, à falta de respeito pelos deuses e pela natureza. De modo que, a hybris na versão capitalista pode ser rastreada em narrativas míticas que apresentam personagens ou situações que refletem a busca desenfreada de poder, riqueza e sucesso, sem considerar as consequências morais ou sociais de suas ações”. A reflexão é de Gil-Manuel Hernández i Martí, professor titular do Departamento de Sociologia e Antropologia Social da Universidade de Valência, em artigo publicado originalmente na Revista 15/15\15 e reproduzido por Rebelión, 10-07-2024. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.
Quem perdeu os símbolos históricos e não se contenta com os “substitutos”, encontra-se hoje numa situação difícil: abre-se diante dele o nada, do qual o homem se aparta atemorizado. Pior ainda, o vazio é preenchido com ideias políticas e sociais absurdas e todas elas se caracterizam por sua desolação espiritual (Carl G. Jung: Os arquétipos e o inconsciente coletivo, 2014).

O poder do mito
O capitalismo, enquanto sistema econômico e social predominante em todo o mundo, exerceu e continua a exercer uma influência significativa nas nossas vidas e na configuração das sociedades de uma forma profunda, complexa e duradoura. Esta formação histórica, enraizada em teorias e práticas econômicas e políticas, funciona como um modo de produção material, uma máquina de geração e concentração de lucros e um mecanismo de controle social que se apoia numa lógica de exploração que abrange várias dimensões, como classe, gênero, raça e espécie. Além disso, constitui uma poderosa força para moldar subjetividades e um dispositivo hegemônico de reprodução cultural. Portanto, manifesta-se como uma estrutura integral de dominação e transformação do mundo, com capacidade de influenciar todas as suas esferas, e até mesmo de conduzir a humanidade a um estado de colapso civilizacional, devido ao seu caráter ecocida.

Embora o antropocentrismo, o patriarcado e a construção do ego humano já existissem antes do surgimento do capitalismo, este último intensifica-os, exacerba-os e subordina-os a uma lógica predatória centrada na busca do lucro no quadro de um mercado supostamente competitivo, que prevalece sobre qualquer outra consideração ética ou forma de relacionamento social.

No entanto, uma exploração mais profunda do capitalismo permite-nos analisá-lo a partir de uma perspectiva mais ampla, investigando os seus fundamentos míticos e arquetípicos. Neste artigo, analisaremos como a lógica do capitalismo, formada por volta do século XVI e desenvolvida com crescente intensidade a partir do século XVIII, está especialmente sincronizada com a energia psíquica e social de determinados mitos e arquétipos que existiram ao longo da história da humanidade. Estas configurações míticas e arquetípicas estão presentes, com diversas adaptações e nuances, na maioria das culturas humanas, como demonstraram a antropologia e a psicologia profunda. Nesta análise teremos como referência a mitologia grega, devido à sua proximidade cultural. Esta deixou uma marca profunda na formação da psique coletiva do Ocidente, onde o capitalismo emergiu e se desenvolveu.

Deve-se enfatizar que um mito é uma narrativa, geralmente tradicional e sagrada, que tem significado simbólico e é compartilhada dentro de uma comunidade ou cultura específica. Os mitos funcionam como encarnações culturais dos arquétipos, entendidos como as forças impessoais do inconsciente coletivo. Segundo Carl G. Jung (2004), os arquétipos constituem uma espécie de padrões fundamentais na psique humana, que se manifestam através de imagens arquetípicas e são expressos sincronicamente na forma como as pessoas e grupos percebem e respondem ao seu ambiente (Jung, 2014). Como aponta Joseph Campbell (2022) em sua conhecida obra O poder do mito, os mitos são verdadeiros metaforicamente e são valiosos porque transmitem verdades sobre a experiência humana que escapam a uma abordagem exclusivamente racional e científica.

Os mitos constituem universais culturais que ao longo da história serviram como relatos simbólicos para dar sentido ao mundo, uma vez que os símbolos que contêm expressam ideias-força que vão além do racional e do temporal, entrando no mistério e no inefável (Chevalier; Gheerbrant, 2007). Na verdade, como destacou Thomas Berry (2015), os símbolos são fontes de energia e, ao mesmo tempo, meios de transformação psíquica. Os símbolos expressam significados compartilhados, com capacidade de representar algo que é reconhecido e compreendido por um grupo ou comunidade. Em todo caso, os mitos que os símbolos articulam tendem a ser flexíveis e a se adaptar à medida que a sociedade evolui, mantendo a sua relevância e significado ao longo do tempo.

Isso acontece porque, como destacou Carl Kereny (2009), o mito sobrevive graças à plasticidade do mitologema, que se refere ao rico material mítico que é continuamente revisado, gerado e reconfigurado com elementos próprios da cultura. Em outras palavras, o mitologema refere-se aos componentes mínimos e universais de um mito, que podem ser repetidos ou combinados de diversas maneiras para construir narrativas mitológicas mais complexas. Dessa forma, a mitologia funciona como um motivo recorrente que aparece em diferentes relatos mitológicos e pode referir-se a personagens, acontecimentos, objetos ou situações. Os mitologemas formaram os alicerces das histórias que resistiram à passagem do tempo, relatos que, “no rescaldo de um mundo em dissolução, continuam a ser o espelho para nos contemplarmos e dar sentido à nossa existência” (Marcet, 2023).

Certamente, os mitos podem distorcer mais ou menos a realidade, mas também ajudam a moldá-la, construí-la e dirigi-la. Os mitos servem para estabelecer, sustentar e reforçar os valores, identidades, normas e crenças compartilhados numa comunidade, sendo transmitidos de geração em geração. São verdadeiramente performativos e prescritivos, o que explica o seu poder e significado. Como defendeu recentemente Vicente Gutiérrez (2023) ao referir-se aos “mitos que sustentam o capitalismo fossilista”, os mitos sustentam culturalmente os modos de produção, que são também produção de mitos, de modo que sem mitos não se compreende a permanência, a força e a aceitação dos sistemas econômicos, políticos e sociais.

Um mito, pois, não consiste numa simples “superestrutura” derivada do determinismo materialista que caracteriza as relações entre forças produtivas. Pelo contrário, implica uma infraestrutura generativa de conhecimento e significado, uma “estrutura de sentimento”, um enredo simbólico, um quadro interpretativo e uma filosofia cotidiana com inegáveis características numinosas. Os mitos, como tradução cultural dos arquétipos, expressam a sua força energética e a sua capacidade de sintonizar, estimular, orientar e potencializar as ações das sociedades humanas e, portanto, os modos de dominação em cada ciclo histórico.

A hybris do capitalismo
Analisar os fundamentos míticos do capitalismo, ou seja, explorar seus mitologemas, serve tanto para avaliar a sua força histórica como para compreender quão difícil é reformá-lo, superá-lo ou imaginar alternativas viáveis para ele. Quando Mark Fisher (2020) cunhou o termo “realismo capitalista”, estava tentando descrever uma condição cultural e política em que o capitalismo permeou tão profundamente a sociedade que é percebido como a única forma possível de organizar a vida. Assim, mesmo quando as pessoas reconhecem os problemas e os fracassos do capitalismo, é-lhes difícil imaginar e trabalhar alternativas significativas, devido à hegemonia esmagadora do pensamento capitalista.

Conhecemos bem, porque foram bem estudadas, as motivações e manifestações do poder do capitalismo, em um sentido econômico, político e ideológico. Mas talvez sejam menos conhecidos, devido ao excessivo viés materialista e racionalista das ciências sociais críticas, os impulsos psíquicos e arquetípicos do capitalismo que são culturalmente transmitidos através dos mitos clássicos e expressos em mitologemas. Razão pela qual devemos prestar atenção a eles, pois das profundezas silenciosas do inconsciente coletivo eles pressionam sem trégua, seguindo uma lógica sincronística (Jung, 2004), para serem ouvidos, conhecidos e compreendidos. Uma tarefa necessária se pretendemos propor alternativas emancipatórias confiáveis diante de um sistema totalizante que ameaça destruir tudo.

Na nossa modesta aproximação ao que entendemos como fundamentos míticos do capitalismo, concentrar-nos-emos na ideia de que todos eles nos falam de uma inflação patológica e destrutiva do ego. Segundo Marcet (2023), todas as mitologias das culturas da terra nos alertam sobre a hybris: não podemos ser como deuses, porque pereceremos por causa disso. Na tradição grega, a hybris ou hubris é um termo que se refere à arrogância desmesurada, à falta de respeito pelos deuses e pela natureza. De modo que, a hybris na versão capitalista pode ser rastreada em narrativas míticas que apresentam personagens ou situações que refletem a busca desenfreada de poder, riqueza e sucesso, sem considerar as consequências morais ou sociais de suas ações.

A hybris da mitologia grega constituiu um impulso arquetípico vinculado ao longo desenvolvimento histórico da noção da individualidade, entendida como a ilusão de um sujeito independente e autônomo. No entanto, esta hybris foi se exacerbando à medida que se configurava a concepção moderna de progresso, que o capitalismo traduziu numa compulsiva obsessão de avançar, crescer e acumular riqueza e poder, a todo custo, olhando sempre para o tempo do futuro, esse tempo impulsionado por uma modernidade que anulava a antiga conexão entre a humanidade e a natureza/divindade (Marcet, 2023). Este irreprimível impulso, que implica uma desmedida devida à cegueira e ao orgulho ímpio (Jappe, 2021), manifesta-se na busca do lucro, na ganância sistêmica, na expansão econômica e no crescimento perpétuo. As dívidas, no entanto, devem ser pagas em algum momento.

Dentro deste campo narrativo, muitas vezes as façanhas dos “empreendedores”, empresários de sucesso e agentes “disruptivos” do mercado fazem alusão ao arquétipo do herói clássico embriagado de arrogância. Estes lendários combatentes da vanguarda capitalista enfrentam desafios, assumem riscos, competem incansavelmente e superam obstáculos no seu desejo de expansão, motivos pelos quais são apreciados como venerados esteios do avanço civilizacional. A vida está à sua disposição. Claro que é sempre possível agir com mais moderação, contenção, compaixão, consenso ou conciliação, mesmo que seja por pura estratégia, e de fato em algumas fases históricas do capitalismo tem sido assim. Mas, no final, o ímpeto implacável da hybris capitalista significa que a componente faustiana da sua dinâmica estrutural conduz necessariamente ao desastre. O neoliberalismo selvagem contemporâneo é uma boa prova disso.

Porque, como os mitos gregos nos alertam sobre os excessos da hybris, desafiar certos limites, sejam eles naturais ou divinos, ignorar as advertências sobre os exageros, cometer os mesmos erros repetidamente, tem um custo elevado, que se reflete dramaticamente nas quedas, crises ou colapsos. Estes acontecimentos, longe de pararem ou diminuírem, tendem a repetir-se ciclicamente no capitalismo, intensificando e colocando em risco a própria vida no planeta. Será que o sistema aprendeu alguma coisa sobre as lições históricas proporcionadas pelo poder dos seus fundamentos míticos? Tudo indica que não, o que é bastante perturbador. Vejamos, ainda que de forma impressionista, alguns desses antigos mitos especialmente reveladores.

Os antigos mitos da moderna hybris capitalista

O mito de Ícaro
Ícaro e seu pai Dédalo fugiram de Creta, onde estavam detidos pelo rei Minos, usando asas feitas de penas coladas com cera aos seus ombros. Porém, Ícaro, cegado por sua própria arrogância, desobedeceu aos conselhos de seu pai de não se elevar muito acima do mar, aproximando-se perigosamente do sol, fazendo com que a cera derretesse e Ícaro caísse na água. Este mito ilustra as consequências desastrosas da ambição desmedida, da imprudência tecnológica, da megalomania, da vaidade e da imprudência, características distintivas do capitalismo. O mito aponta como ignorar os conselhos para não ultrapassar certos limites pode levar ao fracasso e à ruína. Simbolicamente, sugere também que o excesso de calor da civilização termoindustrial, representado pelo aquecimento global, conduz à sua ruína, ao precipitá-la no abismo do mar, que é por sua vez um símbolo fundamental do inconsciente coletivo e do submundo.

O mito do rei Midas
Devido à sua hospitalidade para com o sátiro Sileno, preceptor e fiel companheiro de Dionísio, este deus concedeu ao rei Midas o poder de transformar em ouro tudo o que tocasse. Embora a princípio parecesse uma bênção, o rei Midas logo descobriu as consequências desastrosas desse presente, pois até sua comida e sua filha se transformavam em ouro quando tocadas. Percebendo que não poderia desfrutar de alimentos que se transformavam em metal com o contato, ele implorou a Dionísio que o libertasse de seu presente. Este lhe indicou que se lavasse no rio Pactolo, o que lhe restaurou a normalidade.

O mito alerta sobre como a obsessão pela riqueza (fazendo proliferar o ouro) e pela acumulação de bens pode levar à miséria generalizada, como acontece especialmente no capitalismo global financeirizado, desconectado da esfera produtiva e entregue à especulação mais brutal. Esta situação simboliza aquela busca insaciável de lucros (ouro) que norteia o capitalismo (o rei), desconectado de qualquer instância transcendente, sensível ou espiritual, que conduz inevitavelmente à alienação, à degradação da humanidade e à aniquilação da vida. De certa forma, o desejo final do rei Midas de desfazer o erro sugere a possibilidade de algum arrependimento na forma de diminuir, conter ou moderar os desejos materiais inerentes ao funcionamento do sistema, embora isto ainda esteja por ser visto.

O mito de Tântalo
Depois de ser convidado pelos deuses para o seu banquete, Tântalo sucumbiu à tentação de igualar-se a eles, oferecendo-lhes comida, chegando ao ponto de sacrificar o próprio filho para lhes servir os seus pedaços. Como punição, Tântalo foi condenado ao tormento eterno no submundo, onde foi presenteado com comida e bebida que sempre era retirada quando tentava tomá-la. Além disso, uma enorme pedra balançava sobre ele, ameaçando esmagá-lo. Este mito exemplifica o vício desmedido do sistema em ser como um deus, centrado exclusivamente numa voraz obsessão pelos bens materiais. O capitalismo, refletido neste mito, gera um desejo insaciável e constante, tal como o consumismo em massa que promove globalmente. Porém, o objeto de desejo nunca pode ser completamente satisfeito, pois novos apetites surgem constantemente e a busca ávida continua a manter a taxa de lucro crescente, com os riscos que isso acarreta (a rocha oscilante). Esta narrativa reflete a realidade sistêmica da ambição permanente, de uma procura incessante de desejos a satisfazer e de uma frustração crônica que só traz ansiedade, frustração e infelicidade.

O mito de Prometeu
O titã Prometeu enganou Zeus e, como punição, o deus supremo do Olimpo negou-lhe o acesso ao fogo. No entanto, Prometeu roubou sementes de fogo para dá-las aos humanos e assim ajudá-los no seu desenvolvimento. Em resposta, Zeus o acorrentou a uma rocha onde uma águia devorava constantemente o seu fígado, enquanto ele se regenerava. Ele foi libertado por Hércules, filho de Zeus, e pelo centauro Quíron, embora Prometeu tivesse que usar um anel preso a um pedaço da rocha ao qual estava acorrentado. Este mito expõe o desejo de progresso, de melhoria intelectual e material, bem como a equiparação com a inteligência divina, que a sociedade capitalista tão bem encarna (agora com a “inteligência artificial”).

No entanto, Marx e o socialismo também admiravam Prometeu como um símbolo de revolução e avanço civilizacional. Ao longo da história da cultura ocidental, o mito de Prometeu foi interpretado de três maneiras: como uma figura carismática que permite o progresso humano; como o protótipo romântico do rebelde que desafia os deuses e a natureza; mas também como uma figura sinistra cujo conhecimento e capacidade tecnológica causaram grandes desastres e enorme sofrimento.

Este mito distintivo da modernidade, que o Frankenstein de Mary Shelley atualizou (não é em vão que tem como subtítulo “ou o Prometeu moderno”), conta novamente a perigosa tendência de querer ser como a divindade. Com outras palavras, conta como a ambição tecnológica e a perversão do conhecimento científico no contexto capitalista inerentemente titânico podem desencadear monstruosidades éticas e efeitos distópicos imprevistos. Além disso, o mito destaca que, embora haja uma oportunidade de se libertar desses males, a humanidade deve manter a humildade e relembrar seus colapsos anteriores, como indica a imagem do anel com o pedaço de pedra que Prometeu deve usar sempre.

O mito de Narciso
A dimensão psicopatológica do capitalismo é enunciada pela figura de Narciso. Este era famoso por sua extraordinária beleza, mas também por sua profunda vaidade. Para punir sua arrogância, a deusa Nemesis fez com que ele se apaixonasse pela sua própria imagem refletida em um lago. Absorto em sua contemplação, ele não conseguia se desvencilhar de seu próprio reflexo. Numa versão romana do mito, conta-se que quando Narciso viu seu semblante nas águas ficou imobilizado: por medo de danificar a sua imagem, não a tocou e não conseguiu parar de olhar para ela.

Diz-se que Narciso cometeu suicídio atirando-se no lago ao não conseguir possuir o objeto de seu desejo. Este mito aponta para a autoabsorção e o chamado narcisismo, aspectos claramente característicos do capitalismo. Este parece seduzido pela sua própria dinâmica de destruição criativa (a “beleza” do capital). Este fascínio impede-o de moderar os seus apetites, levando-o inevitavelmente à alienação definitiva e, em última instância, ao suicídio através do ecocídio.

O mito de Faetonte
Faetonte era filho de Hélio e, ansioso para mostrar sua linhagem aos amigos, convenceu seu pai a realizar-lhe um desejo. Ele solicitou a oportunidade de dirigir a carruagem do sol pelo céu por um dia. Apesar das tentativas de dissuasão de Hélio, Faetonte permaneceu inflexível em sua determinação. Quando chegou o dia, o jovem entrou em pânico e perdeu o controle dos cavalos brancos que puxavam a carruagem. Desesperado, subiu muito alto, esfriando a terra, e depois desceu muito, causando secas e incêndios. Faetonte inadvertidamente transformou grande parte da África em um deserto, queimando a pele dos etíopes até torná-la escura. Finalmente, Zeus se viu forçado a intervir, atingindo a carruagem em fuga com um raio para detê-la, fazendo com que Faetonte caísse e se afogasse no rio Erídano (Pó).

Este mito exemplifica de forma impressionante como o excesso de ambição e a irresponsabilidade na gestão de certas tecnologias podem desencadear a mudança antropogênica do planeta, como está acontecendo na realidade atual com o caos climático causado pelo capitalismo e pela sua dogmática religião tecnológica.

O mito do Minotauro
Este relato mítico reflete o processo pelo qual um fenômeno não natural (o capitalismo global) pode levar à barbárie e ao sacrifício do futuro de uma sociedade (as novas gerações e as futuras). O Minotauro ou “Touro de Minos” era filho de Pasífae, esposa do rei cretense Minos, e de um touro branco que ele valorizava muito, tendo-lhe sido dado por Poseidon. O Minotauro comia apenas carne humana e, à medida que crescia, tornava-se mais selvagem. Quando o monstro se tornou incontrolável – como a civilização industrial capitalista –, Dédalo construiu o Labirinto de Creta, uma estrutura gigantesca composta por incontáveis corredores que se cruzam, dos quais apenas um levava ao centro da estrutura, onde o Minotauro foi abandonado.

Durante anos, Atenas, subjugada pelo rei Minos, teve que entregar quatorze de seus jovens, que ficaram internados no labirinto, onde vagavam perdidos por dias até se encontrarem com o Minotauro, servindo-lhe de alimento. E assim foi até que o herói Teseu, ajudado pelo famoso fio fornecido por Ariadne, filha do rei Minos, conseguiu entrar no labirinto para matar o Minotauro. O que aponta para a mensagem de que, embora sejam feitas tentativas para conter o capitalismo, a sua natureza predatória não muda, razão pela qual a única coisa a se a fazer é acabar com ele.

O economista grego Yanis Varoufakis (2024) refere-se ao mito do Minotauro, destacando que a satisfação da fome desta criatura foi crucial para a manutenção da paz imposta pelo rei Minos, que permitiu ao comércio atravessar os mares, trazendo consigo os benefícios da prosperidade para todos. Adaptando esta metáfora ao capitalismo contemporâneo, Varoufakis identifica um Minotauro global sob a forma da hegemonia econômica dos Estados Unidos e de Wall Street. Esta hegemonia foi apoiada pelo déficit comercial dos EUA, que importou massivamente produtos manufaturados do resto do mundo para beneficiar Wall Street e grandes investidores estadunidenses.

Segundo Varoufakis, alimentado por este fluxo constante de tributos, o Minotauro global, ligado ao neoliberalismo e à informatização das finanças, permitiu e manteve a ordem mundial pós-Bretton Woods, semelhante à forma como o seu antecessor cretense preservou a Pax cretana, embora pelo menos com um custo significativo de sofrimento para as populações mundiais e enormes riscos financeiros. No entanto, tal como o Minotauro original, este sistema também começou a ruir com a crise econômica de 2008. Por isso, Varoufakis (2024) conclui dizendo: “No final, o nosso Minotauro será lembrado como uma fera triste e barulhenta cujo reinado de trinta anos criou, e depois destruiu, a ilusão de que o capitalismo pode ser estável, a ganância pode ser uma virtude e as finanças podem ser produtivas”.

O mito de Sísifo
Sísifo, conhecido por ter irritado os deuses devido à sua extraordinária astúcia, foi condenado a uma tarefa aparentemente interminável e fútil no submundo (o reino do inconsciente coletivo). Seu trabalho era empurrar uma pedra enorme colina acima. Porém, toda vez que ele estava prestes a chegar ao topo e se libertar do fardo, a pedra rolava novamente, forçando-o a recomeçar. Este ciclo repetiu-se eternamente e Sísifo nunca conseguiu completar a tarefa.

Este mito foi interpretado de várias maneiras. Alguns veem-no como um relato sobre esforços intermináveis e sem sentido, que mostra o absurdo da condição humana. Outros o interpretam como uma metáfora da coragem, determinação, esforço e resiliência humanos diante das dificuldades aparentemente intransponíveis. Do ponto de vista do funcionamento histórico do capitalismo, o mito de Sísifo parece estar relacionado com o considerável poder de forças arquetípicas que estão em sintonia com um sistema regido por uma concepção de progresso puramente expansiva, ascendente e técnico-material.

Essa enlouquecida obsessão pelo acúmulo de riquezas e pelo sentimento de domínio acarreta um ciclo interminável de trabalho e estresse sem recompensa significativa, pois os problemas acabam reaparecendo, levando a uma nova queda que destrói muito do que foi criado e nos obriga a buscar novos maneiras de subir com cargas pesadas nas costas. Estas cargas, como a exploração, a desigualdade, a violência ou a dominação, fazem parte da própria lógica perversa do sistema, que dificulta estruturalmente as suas ambições desmedidas. Assim, a inconsciência ou a arrogância diante dos limites do sistema, impostos pela natureza (o divino), geram crises ou colapsos recorrentes, com os quais realmente não aprendemos. Isto abre a porta para novas tentativas irracionais de ascensão, também fadadas ao fracasso.

O mito de Erisícton e o capitalismo catabólico
Mas se existe um mito, além do mais pouco conhecido, sobre a atual deriva para o capitalismo catabólico e autolítico, esse é o mito de Erisícton. Mas antes de abordá-lo devemos lembrar que o capitalismo catabólico refere-se a um capitalismo sedento por energia e sem possibilidade de crescimento, entendendo o catabolismo como um conjunto de mecanismos metabólicos de degradação através dos quais um ser vivo se devora a si mesmo. Como salienta Collins (2018), à medida que os recursos energéticos e as fontes lucrativas de produção se esgotam, o capitalismo se vê forçado, pela sua contínua fome de lucro, a consumir os bens sociais que outrora criou.

Assim, ao canibalizar-se, o capitalismo catabólico transforma a escassez, a crise, o desastre e o conflito numa nova esfera de obtenção de lucro. Ou seja, a mercantilização do apocalipse acaba gerando lucrativas expectativas de negócios (Horvat, 2021). Consequentemente, intensifica-se o processo de colapso desencadeado pela contradição entre a lógica expansiva capitalista e os limites naturais do planeta.

A condição catabólica deste capitalismo crepuscular é reforçada pela sua deriva autolítica. Na biologia, a autólise é um processo pelo qual as enzimas presentes nas células de um organismo que morreu começam a quebrar a estrutura celular. Contudo, a autólise também pode ocorrer em corpos vivos mas doentes, de modo que, sob certas condições patológicas, tais como doenças degenerativas ou lesões graves, as células podem ativar mecanismos de autólise, levando à degradação de tecidos e estruturas celulares no organismo vivo. Um símile que ilustra vividamente a decadência e a desintegração do já doente tecido social, como resultado da ação do capitalismo histórico, que por sua vez intensifica o capitalismo catabólico. Este último define um sistema em estado terminal, em vias de ser substituído por um sistema emergente potencialmente mais pernicioso, possivelmente de natureza neofeudal ou tecnofeudal (Varoufakis, 2024).

Voltando ao mito de Erisícton, este conta a história de um rei da Tessália conhecido por um apetite brutal e ambição desenfreada. Sabíamos que o capitalismo tem um caráter canibal, o que o leva a fagocitar tudo em seu caminho para continuar crescendo (Fraser, 2024). Mas o mito de Erisícton vai mais longe e é resgatado por Anselm Jappe (2021) na sua obra A sociedade autofágica. Capitalismo, desmesura e autodestruição, que trata da natureza autocanibalizante do capitalismo contemporâneo.

Segundo Jappe, o mito de Erisícton, recolhido na época pelo poeta grego Calímaco e pelo romano Ovídio, trata de um personagem que se tornou rei da Tessália após expulsar seus habitantes nativos, os pelasgos, que haviam dedicado uma magnífica floresta a Deméter, a deusa das colheitas. No seu centro erguia-se uma enorme árvore e à sombra dos seus ramos dançavam as dríades, as ninfas das florestas. Mas Erisícton, ansioso por transformar a árvore sagrada em tábuas de madeira para construir o seu palácio, apareceu na floresta com os seus servos com a intenção de derrubá-la. A própria deusa Deméter tentou dissuadi-lo de seus esforços, mas o rei respondeu com desprezo.

Como os servos se recusaram a cometer o sacrilégio, Erisícton pessoalmente derrubou a árvore, apesar de dela ter corrido sangue e o anúncio de uma punição. Neste caso, a extração de madeira na floresta sagrada representa uma afronta direta aos deuses e à própria natureza. A história ilustra como ações imprudentes e egoístas podem levar à degradação e ao desastre, tanto a nível pessoal como ambiental.

Na verdade, Deméter enviou a fome personificada para Erisícton, penetrando seu corpo através da respiração. Uma fome insaciável apoderou-se do rei, e quanto mais ele comia, mais faminto ficava. Ele engoliu e consumiu tudo que estava ao seu alcance, vendendo a filha por mais comida. Mas como nada acalmava seu incrível apetite, ele começou a dilacerar os próprios membros, de modo que, à medida que se devorava, seu corpo encolheu até morrer.

Para Jappe, é um dos mitos gregos que evoca a hybris, que acaba por causar nêmesis, ou seja, o mesmo castigo divino que também sofreriam Prometeu, Tântalo, Sísifo, Ícaro, Midas ou Faetonte, entre outros. Um mito que surpreende pela sua furiosa relevância, pois funciona como uma antecipação arquetípica do que acontece quando a natureza não é respeitada, uma vez que tal desrespeito atrai necessariamente a ira dos deuses, ou da própria natureza. Para Jappe, só o quase completo desaparecimento da familiaridade com a antiguidade clássica pode explicar por que o valor metafórico deste mito escapou até hoje aos porta-vozes do pensamento ecológico.

Segundo Jappe, não há nada de natural na fome de Erisícton e por isso nada de natural pode acalmá-la. É uma fome descomunal impossível de ser saciada. A sua tentativa desesperada de atenuar a situação leva o rei a consumir sem trégua, numa clara alusão mítica à lógica do valor, da mercadoria e do dinheiro. Mas a ânsia e a avidez não cessam: “Não é simplesmente a malvadez dos ricos que aqui está em jogo, mas um enfeitiçamento que cria uma cortina entre os recursos disponíveis e a possibilidade de deles usufruir” (Jappe, 2021, p. 13 na versão espanhola). A deusa pune Erisícton de forma adequada ao seu crime: ao não poder se alimentar, vive como se toda a natureza tivesse se transformado num deserto que se recusa a fornecer ajuda natural à vida do homem.

Contudo, enfatiza Jappe, o aspecto mais notável do mito de Erisícton é sua conclusão. Uma raiva abstrata que não contém sequer a devastação do mundo e que acaba na autodestruição e no autoconsumo. O mito não nos fala apenas da devastação da natureza e da injustiça social, mas também do caráter abstrato e fetichista da lógica mercantil e dos seus efeitos destrutivos e autodestrutivos no quadro do capitalismo catabólico. É como a imagem de um navio a vapor que continua navegando enquanto consome gradativamente seus próprios componentes, ou a famosa cena dos irmãos Marx a bordo de uma locomotiva em pleno movimento, onde para mantê-la funcionando é necessário desmontar os vagões e utilizá-los como combustível, até que no final também são consumidos pelo fogo.

Mas, como propõe Jappe, o mito também relembra a trajetória dos toxicodependentes com síndrome de abstinência, como essa constante sede de dinheiro que caracteriza a lógica capitalista e que nunca é totalmente satisfeita. Erisícton é um narcisista patológico, que nega a objetividade e a sensibilidade do mundo exterior, que, por sua vez, lhe nega assistência material. A hybris de Erisícton reflete a tendência à autodestruição implícita no capitalismo catabólico, impulsionada por um impulso suicida “que ninguém deseja conscientemente, mas para o qual todos contribuem” (Jappe, 2021, p. 15 na versão espanhola).

De fato, neste ponto é crucial mencionar a profunda ligação entre o mito de Marte (Ares), deus da guerra, e o capitalismo, dado que este último funciona como um regime de guerra permanente contra a vida. Nesta perspectiva, o “terrível amor pela guerra”, um arquétipo universal referido pelo psicólogo junguiano James Hillman (2010), é notavelmente amplificado pela lógica capitalista. Isto porque este devastador “amor à guerra”, capaz de gerar sensação de significado, propósito e transcendência na sua ação destrutiva, é especialmente sacralizado sob os pressupostos existenciais do capitalismo. Consequentemente, devido à convergência mítico-arquetípica entre a hybris e o amor à guerra, o capitalismo tende inevitavelmente à devastação do mundo.

Dos fundamentos míticos do capitalismo ao impossível capitalismo mítico
Como vimos, o capitalismo tem fundamentos míticos evidenciados nos grandes mitos da antiguidade clássica ocidental, que, por sua vez, traduzem e corporificam arquétipos universais. Tais fundamentos míticos falam da hybris, dessa arrogância que desafia os deuses, e apesar das suas advertências para não ultrapassar certos limites, estes são ignorados, com as graves consequências que isso acarreta, tal como aconteceu e acontece com os excessos inerentes ao funcionamento do capitalismo. Mas, paradoxalmente, embora o capitalismo procure tornar-se um mito para melhorar a sua reprodução, adquirindo uma aura de autenticidade e singularidade que lhe dá uma aparência de transcendência, é impossível alcançá-lo. Isto porque o mito é comunicado através do símbolo, que é inacessível ao capitalismo devido à sua natureza “diabólica”.

Este ponto requer uma explicação. O capitalismo, especialmente na sua forma mais contemporânea como sociedade de mercado consumista, também conhecida como “capitalismo libidinal” (Fernández-Savater, 2024), tira amplo partido de um desejo perpetuamente insatisfeito, procurando definir, consagrar e reforçar a sua própria condição mítica. Apresenta-se como a encarnação atual dos antigos heróis clássicos, especialmente impulsionados por todos os tipos de impulsos prometeicos. Além disso, procura incorporar e reinterpretar secularmente o paraíso bíblico terrestre como uma terra de abundância e felicidade. Aproveita-se de vários meios para tentar alcançá-lo, como demonstram as grandes superproduções artísticas da indústria cultural, os parques temáticos, as narrativas midiáticas sobre avanços em conquistas, inovações, invenções, progresso científico e tecnológico, bem como o conhecimento dos segredos do macrocosmo e do microcosmo.

Chama-se escandalosamente a atenção com a exploração espacial, a descoberta de energias milagrosas, os desenvolvimentos disruptivos da economia da atenção, os algoritmos sofisticados, as possibilidades de consumo imediato sob demanda, a computação quântica, as criptomoedas, o mundo cibernético, a robótica de última geração e a inteligência artificial. Porém, apesar dos esforços do capitalismo para constituir-se como um mito com tudo isso, trata-se de um falso mito, apenas dos fogos de artifício coloridos, porque no final a desolação causada pelos avanços do capital, o colapso ecossocial se intensifica, a extinção da natureza se espalha, os danos à humanidade proliferam e tudo isso não descreve um mito, mas o seu aborto. O capitalismo mítico torna-se impossível.

O mundo dos autênticos mitos coloca as coisas de volta no seu lugar: “O capitalismo libidinal é um monstro, um centauro em particular, dividido entre um impulso de conservação, de estabilização, de normalização e um impulso perturbado de conquista, de pilhagem e de saque. Um regime dual, promessa e veneno, produtividade e devastação, bem-estar e guerra, atravessando cada instituição e cada dispositivo, cada objeto de consumo e cada um de nós” (Fernández-Savater, 2024, p. 6-7).

Isso acontece porque o mito remete ao símbolo e o símbolo à união, ao que une, vincula, liga e cria. Enquanto o oposto do símbolo é o diabólico, ou seja, o que separa, o que divide, o que é contraditório, o que é destrutivo. Como assinala Marcet (2023), o mal só pode ser o antônimo do Símbolo. Para os cristãos antigos, assim como para os gregos clássicos, o Símbolo constituía a essência dos seus mitos, poesia e religião, aquilo que estruturava e religava tudo. Por isso, se o Símbolo era o que unia novamente, o mal deveria ser forçosamente o que dividia e confrontava as pessoas.

Na verdade, enfatiza Marcet, as raízes gregas das palavras símbolo e diabo são esclarecedoras. O símbolo vem de synballein (syn, “um”), que significa “lançar ou pôr em conjunto, unir”. Por outro lado, diaballein (dia, “dois”), do grego diabolos (διάβολος), significa “lançar separadamente, causar briga (dividir)”. O oposto do símbolo, portanto, é o diabo: aquele que divide o “um” em “dois” e dá início ao conflito insolúvel entre os opostos.

Da mesma forma, o capitalismo não é apenas ambivalente, contraditório e conflituoso nas suas pulsões, mas se vê finalmente levado por aquelas pulsões de categoria mais perversa que causam mais divisão, desestruturação, fragmentação, caos e perdição. O capitalismo aspira a ser miticamente dionisíaco, afrodisíaco e paradisíaco, isto é, o Jardim das Delícias, mas acaba sendo sordidamente catabólico, hiperbólico e diabólico, isto é, Mordor. Exatamente o contrário do símbolo. Em suma, a própria antítese do mito unificador do mundo que o capital procura encarnar.

Como vimos, o capitalismo, na sua busca por expansão e crescimento ilimitados, sintoniza, traduz e atualiza a descomunal energia dos arquétipos, que através dos mitos, expressam a hybris e as suas consequências. Em todos eles encontramos o motivo ou mitologema dos conselhos divinos/naturais sobre os efeitos dos excessos da hybris, bem como o motivo ou mitologema de ignorá-los deliberadamente. Desde o início da Revolução Industrial capitalista, tem havido numerosas advertências sobre as terríveis consequências do desenvolvimento do sistema para a natureza e a humanidade. Mas, apesar disso, os responsáveis pela expansão capitalista fizeram e continuam a fazer a escolha consciente da destruição (Riechmann, 2024).

Por isso, um capitalismo mítico é inviável, pois não pode ser construído sobre símbolos reais, ou seja, sobre constructos com a capacidade unificadora de representar algo que seja reconhecido, compreendido e assumido por um grupo ou por uma coletividade. Se os mitos genuínos tendem a sincronizar as pessoas através de símbolos partilhados, pois são suscetíveis de compreensão universal devido ao seu caráter arquetípico, os falsos mitos, como o capitalismo que procura tornar-se um mito, elevam-se acima da divisão, da desigualdade e da exclusão, sobre a própria negação do mito. E se traduzem algum arquétipo é o do diabo, entendido como uma energia do inconsciente coletivo que é sinônimo de separação, incompreensão, desvio ou erro.

O capitalismo, apesar da sua renovada e sempre traída promessa de progresso, abundância e prosperidade, perpetua a exploração, a divisão e a infelicidade. Tanto a sua incompetência mítico-simbólica como a sua inevitável inclinação para o colapso tornam-se visíveis nesse “apocalipse” que funciona como uma “revelação” dos seus limites, como uma terrível convergência desses “pontos de inflexão escatológicos” (Horvat, 2021) que certificam o fracasso existencial do capital. Ao estar arquetipicamente ligado às configurações míticas da hybris, está condenado a enfrentar as consequências dos seus excessos. A pergunta é se outros mitos poderosos, com seus símbolos autênticos, serão capazes de impedir que o capitalismo arraste o mundo.

Bibliografia
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Fernández-Savater, A. (2024): Capitalismo libidinal. Antropología neoliberal, políticas del deseo, derechización del malestar. Barcelona: Ned Ediciones.

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Fraser, N. (2024): Capitalismo canibal. Como nosso sistema está devorando a nossa democracia, o cuidado e o planeta e o que podemos fazer a respeito disso. São Paulo: Autonomia Literária.

Gutiérrez, V. (2023): “Contra los mitos sostenedores del capitalismo fosilista. La subjetividad colectiva atrapada entre el metamito del progreso y el protomito del colapso”, Ekintza Zuzena, número 49.

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Horvat, S. (2021): Despues del Apocalipsis. Pamplona: Katakrak.

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Kereny, C. (2009): Los héroes griegos. Vilaür: Atalanta.

Marcet, I. (2023): La historia del futuro. Barcelona: Plaza y Janés.

Riechmann, J. (2024): Ecologismo: pasado y presente (con un par de ideas sobre el futuro). Madrid: Los Libros de la Catarata.

Varoufakis, Y. (2024): Tecnofeudalismo. El sigiloso sucesor del capitalismo. Barcelona: Deusto.

Reprodução da obra A Queda de Ícaro, de Jacob Peter Gowy, que encontra-se no museu do Prado / Wikimedia Commons

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