Movimentos celebraram dois anos da Conferência Livre em que reuniu centenas de pessoas na defesa da saúde sob a ameaça do neofascismo. Hoje, é crucial exigir, ao governo democrático, a manutenção do orçamento da Saúde e o fortalecimento do sistema público
por Túlio Batista Franco, em Outra Saúde
A Frente pela Vida (FpV) reuniu entidades e movimentos de todo país nesta segunda-feira dia 5 de agosto de 2024, na sua Plenária Nacional, para celebrar o Dia Nacional da Saúde e comemorar os dois anos de realização da histórica primeira Conferência Nacional Livre Democrática e Popular de Saúde. Preparatória da 17ª Conferência Nacional de Saúde que ocorreria em 2023, o evento que ocorreu na Casa de Portugal em São Paulo, em 5/8/2022, reuniu mil pessoas, lideranças representando mais de uma centena de conferências regionais e locais, reuniões, plenárias de movimentos, que foram realizadas em todo território nacional, em preparação à Conferência Nacional.
Atualmente, temos vivido fortes tensões sobre a política nacional de saúde e o SUS. Elas têm origem em notícias que desde o final de 2023 vêm sendo veiculadas na imprensa, de que poderia haver desvinculação dos recursos constitucionais da saúde, ou mesmo sua redução. Hoje, o piso da Saúde é calculado em 15% das Receitas Correntes Líquidas. Diante disto, a FpV intensificou sua mobilização em defesa dos valores atuais que são repassados ao setor, assim como propõe o gasto prioritário em serviços de referência territorial como a Atenção Básica em Saúde e Cuidados Intermediários.
No calor destas discussões, percebeu-se a necessidade de rememorar o documento de diretrizes para uma política de saúde aprovado na Conferência Livre de Saúde, bem como a Carta Compromisso entregue ao então candidato à Presidência da República, Lula [CARTA-COMPROMISSO-[final]-(2).pdf (frentepelavida.org.br)], com as questões centrais de reconstrução e defesa do Sistema Único de Saúde. As questões do momento requerem que se rememore o que foi construído coletivamente neste movimento, e as ideias com as quais nos propusemos caminhar intensivamente na construção do SUS.
Transmitida pelo canal da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco, a plenária teve quase quinhentas visualizações e realizou um animado debate. No início se fez uma homenagem ao médico sanitarista Francisco de Assis Machado, o Chicão, professor da UFMG aposentado, falecido neste dia 5 de agosto. Sua história de vida se confunde com a história do movimento sanitário brasileiro, tendo sido um dos fundadores e árduo defensor do SUS. A ele foi dedicada a Plenária em meio a lembranças da sua trajetória contadas pela professora Sonia Fleury.
A abertura das falas foi feita por Leonardo Boff, que enfatizou a relevância da política de saúde na defesa da vida e proteção das pessoas, representada pelo Sistema Único de Saúde. Recordando a sua importância na história, enfatizada recentemente pelo seu papel fundamental na Pandemia, Boff acentua a necessidade de manter íntegros os recursos orçamentários do SUS, tendo em vista a sua função precípua de aliviar o sofrimento, a dor, cuidar das pessoas de forma amorosa, em especial os mais pobres.
Seguindo as falas, se apresentaram parlamentares, ministro, lideranças de movimentos sociais e partidárias, trabalhadoras/es das redes de saúde, e da comunidade acadêmica, tomando por referência a ideia geral de avançar de forma progressiva e progressista na construção do SUS, segundo o que foi decidido na Conferência Livre de Saúde de 2022 – que se traduz no momento atual como prioridade, a defesa da integridade dos recursos destinados à saúde, inclusive a manutenção do piso mínimo constitucional de recursos destinados ao SUS como dito anteriormente.
Ao mesmo tempo se fez uma revigorante reflexão sobre a trajetória da Frente pela Vida. Fundada em 2020 no início da Pandemia de Covid-19, ela teve um papel destacado no seu enfrentamento, e o combate ao negacionismo do governo de então. Participou efetivamente da luta pela disputa do projeto de país e retomada da democracia em 2022, em ocasião das eleições presidenciais. Desde então opina sobre os temas gerais da saúde, a defesa de direitos, e mantém a mobilização em defesa do SUS universal, equitativo e vinculado às necessidades da população usuária. Adicionalmente propõe o investimento estatal no complexo econômico industrial da saúde, fator de desenvolvimento do país, e afirmação da sua soberania frente aos mercados globais de saúde.
A Frente pela Vida que teve no seu ato de fundação um manifesto assinado por mais de quinhentas entidades de todo país, se mantém vigorosa e coesa durante estes mais de quatro anos de intensa atividade. Parte da unidade construída em ambiente de grande diversidade se deve ao fato de operar na política com o conceito de “consenso progressivo”1, um dispositivo de construção da unidade e ação.
Assim, a FpV inaugura uma nova estética política, um formato no qual cada entidade que dela participa tem a liberdade de expressar suas convicções próprias, e ao mesmo tempo deve se manter disposta à escuta, diálogo, disposição para pactuação, de forma que o enfrentamento da divergência se dá por uma construção dialógica do consenso. Há um permanente esforço para construção do “comum”, que é assumido por todos e todas, e organiza a ação política.
A Plenária Nacional da FpV, neste 5 de agosto, se encerra com alegria e esperança, o que se transforma em força propulsora da luta em favor do SUS.
Vida do SUS!
Viva a Frente pela Vida!
Niterói, 06 de agosto de 2024.
1 Sobre o conceito ver: Franco, Túlio Batista A FRENTE PELA VIDA E O CONCEITO “CONSENSO PROGRESSIVO” COMO DISPOSITIVO PARA A UNIDADE E POTÊNCIA NA AÇÃO POLÍTICA. In: Frente pela Vida: Em Defesa da Vida, da Democracia e do SUS/ Organizadores: Túlio Batista Franco; Elda Coelho de Azevedo Bussinguer e Jacinta de Fátima Sena da Silva – 1. ed. — Porto Alegre, RS: Editora Rede Unida, 2023. O livro pode ser baixado gratuitamente no link da editora Rede Unida – Frente pela Vida: Em Defesa da Vida, da Democracia e do SUS – Editora Rede Unida
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Em 5/8/2022, durante a Conferência Nacional Livre, Democrática e Popular de Saúde, a Frente pela Vida entregou uma Carta Compromisso em defesa do SUS ao então candidato Lula. Naquele dia, o presidente afirmou que, em seu governo, “não haverá teto de gastos”