Por Halley Margon, em Terapia Política
I
Em pouco menos de três semanas, um jovem conhecido como “mentiroso patológico, profundamente racista e misógino” formalizou um agrupamento para concorrer às eleições europeias do dia 9 passado, ao qual deu o nome de Se Acabó la Fiesta. Terminada a apuração, comemorava o sexto posto da lista dos mais votados, praticamente empatado com o Sumar da agora baqueada Yolanda Diaz, segunda vice-presidenta do governo espanhol. Havia arrebatado mais de 800 mil votos. Esse jovem propagador de maledicências sem nexo, a não ser com o da sua própria miséria mental, difusor de mensagens xenófobas e grosserias capazes de envergonhar o mais rude dos bolsonaros (trata-se de uma hipérbole, evidentemente), é um personagem mais ou menos conhecido do submundo da política espanhola. Chama-se Alvise Pérez e pertenceu ao praticamente extinto Ciudadanos (liberais) antes de migrar para o Vox e finalmente tornar-se franco-atirador. Nas primeiras horas pós-apuração, foi um dos destaques das mesas de debates nas TVs e mereceu manchetes nos jornais do dia seguinte. É provável que não seja mais que uma onda momentânea – dessas que eventualmente formam ou sobram de um grande tsunami. No quadro histórico da ultradireita europeia, poderia ser associado às tropas SA dos hitleristas, com as devidas vênias à inteligência e cultura desses. Volta e meia têm aparecido bandos assemelhados. Nas eleições gregas de 2016 houve um tal de Amanhecer Dourado que voou muito mais alto, alcançando o terceiro posto entre os partidos helenos antes de ser abatido, envolto em nebulosos processos criminais. Aqui na Espanha há quem diga que sua base eleitoral vem quase toda da que antes sustentava os liberais (Ciudadanos). Liberais ao cair da noite, neonazistas ao amanhecer. Faz todo sentido e não é de hoje. Desde pelo menos a Viena na virada do século XIX (ver Viena Fin-de-Siècle – Política e Cultura, Carl Schorske). Para além dessa base eleitoral, fenômenos tão persistentes quanto esses não poderiam existir sem um caldo de cultura ou sentimentos sociais bem enraizados na sociedade. Pode parecer especulativo e vago, mas o fato é que volta e meia eles emergem e ganham corpo nas formações políticas dos séculos XX e XXI. Tanto quanto esse misógino, racista e xenófobo, talvez por puro oportunismo (muitas vezes a política cobra a presença de uma boa junta de psicanalistas para melhorar a composição do quadro), seus similares de grande porte são parte do mesmo espetáculo. (mais…)