MPF alerta para a aplicação equivocada da “Lei de Desapropriação” em questões que envolvem Unidades de Conservação

Decreto nº 3.365/1941 não pode ser usado para justificar a caducidade dos decretos de criação de Unidades de Conservação

MPF

O Ministério Público Federal (MPF) emitiu nota técnica defendendo a não aplicação do Decreto 3.365/1941 (Lei de Desapropriação) às questões que envolvem desapropriações em Unidades de Conservação (UC). Segundo o texto, não se pode falar em extinção da UC – que é criada por lei ou decreto – ou em redução de seus limites, ainda que o prazo de cinco anos previsto no decreto tenha expirado. Qualquer alteração de UC deve se dar apenas por lei ou decreto. Além disso, as restrições ao uso da propriedade não decorrem da declaração de utilidade pública, mas da legislação ambiental, e perduram no tempo mesmo se o decreto expropriatório perder a validade.

A nota técnica foi expedida pela Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal (4CCR/MPF) e traz subsídios para o processo de regularização fundiária do Parque Nacional Serra de Itabaiana, em Sergipe.

A criação de Parques Nacionais é regulamentada pela Lei 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc). A norma, no entanto, não previu prazo de desapropriação das áreas particulares localizadas dentro dos limites das unidades. A nota técnica do MPF manifestou preocupação quanto ao emprego do Decreto 3.365/1941 nos casos de desapropriações necessárias para a consolidação das áreas dos parques. Para a 4CCR, isso “poderá causar uma grave situação de instabilidade do Sistema Nacional de Unidades de Conservação”.

A desapropriação de bens por utilidade pública é regulada pelo Decreto 3.365/1941, a chamada Lei de Desapropriação. A norma define o prazo de cinco anos para a desapropriação de áreas declaradas de utilidade pública, sob pena de perda de validade (caducidade) do decreto declaratório. Ou seja, caso a propriedade não tenha sido desapropriada em cinco anos, a declaração da área de utilidade pública seria inválida.

A nota ressalta que as UCs são criadas por ato do Poder Público, por meio de lei ou decreto, e somente podem ser extintas, reduzidas ou recategorizadas por lei. A exigência está prevista no artigo 225, § 1.º, III, da Constituição Federal. As restrições ao uso da propriedade – que provêm da legislação ambiental, e não da declaração de utilidade pública – não implicam confisco do patrimônio particular, já que é possível buscar a regularização da situação fundiária perante o ICMBio. Há inclusive procedimento específico para esse fim, conforme destaca a nota.

O documento faz referência ao recurso de apelação do MPF na ação de desapropriação do Parque Nacional do Itatiaia (RJ). Nesse caso, o Ministério Público Federal fez distinções entre as desapropriações ordinárias – em que apenas o direito de propriedade está em jogo – e as desapropriações efetivadas para a consolidação territorial das unidades de conservação – quando está em jogo o direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. De acordo com o recurso, “criada uma unidade de conservação, seja por ato do Poder Executivo ou do Legislador, é inconcebível se cogitar de prazo de caducidade do ato normativo que a criou”.

A nota cita também argumentos da Procuradoria Especializada do ICMBio para defender que a caducidade da declaração de utilidade pública não se estende à criação de unidades de conservação: “(1º) as restrições à fruição da propriedade emanam não da declaração de utilidade pública, mas da legislação ambiental, perdurando no tempo independentemente da caducidade daquela; (2º) a caducidade do decreto expropriatório, no caso de imóveis inseridos em unidades de conservação, afigura-se para o particular não como garantia, como ocorre nas desapropriações em geral, mas como penalidade; (3º) as desapropriações de áreas particulares inseridas em determinadas classes de áreas protegidas fundamentam-se não em um ato administrativo de conveniência e oportunidade, mas em uma imposição legal; (4º) O artigo 225, parágrafo 1º, inciso III, da Constituição Federal estabeleceu o princípio da reserva de lei para a alteração ou supressão de uma unidade de conservação; (5º) não existe amparo legal para a extinção tácita de uma unidade de conservação; (6º) a declaração de utilidade pública é independente e acessória ao escopo do ato de criação da unidade de conservação”.

O texto da 4CCR ainda ressalta que o Código Florestal permite a doação ao poder público de área localizada no interior de UC pendente de regularização fundiária, admitindo, portanto, a existência de unidades com áreas não desapropriadas ao longo do tempo, independente de prazo ou da data do decreto de criação da UC (art. 66, § 5º, III). Segundo a nota, isso comprova a não submissão dessa política ambiental ao prazo de decadência previsto na Lei de Desapropriação.

Veja a íntegra da nota técnica.

Secretaria de Comunicação Social
Procuradoria-Geral da República

Foto: Parque Nacional Serra de Itabaiana – ICMBio

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