A Defensoria Pública e o Ministério Público possuem seus papéis estabelecidos na Constituição da República e suas leis orgânicas. Poderia se falar, de forma sucinta, que o Ministério Público tem o dever de defender a ordem jurídica, o regime democrático, o interesse público e os direitos coletivos. A Defensoria Pública, por sua vez, tem o dever de promoção dos direitos humanos e defesa dos direitos individuais e coletivos das pessoas em condição de vulnerabilidade.
Para além do papel posto pelo ordenamento jurídico, a sociedade vai consolidando sua percepção por certas atuações que terminam por ter destaque. Assim que se criou o estereótipo do Ministério Público acusador, criminalizador e da Defensoria como a instituição que defende os pobres e não possui estrutura. Mas estereótipos terminam por cometer injustiças, tendo em vista, por exemplo, o papel do Ministério Público na defesa do meio ambiente, na defesa dos direitos dos trabalhadores e das crianças e dos adolescentes. Da mesma forma atuações da defensoria na área da saúde pública, junto a indígenas, quilombolas, etc.
Nos últimos tempos, o Ministério Público foi cultivando uma imagem de combate à corrupção. Pelos últimos acontecimentos do país esta postura está sendo acusada de identificada ideologicamente com alguns setores da sociedade brasileira, extrapolando, então, suas funções, interferindo na democracia brasileira.
Fato é que, neste momento político do país, causaram estranheza ao regime democrático dois expedientes do Ministério Público Federal- MPF, para além das criticadas delações premiadas e dos pedidos de prisões denunciados como sem fundamento: duas recomendações que tolhem o debate e a manifestação política no país, corroborando para a para a visão acrítica sobre o impeachment.
O primeiro foi a recomendação do MPF em Goiás, para que 39 órgãos e autarquias federais “não realizem, utilizem, nem permitam, em suas dependências físicas, qualquer ato de natureza político-partidária, favorável ou contrário ao processo de impeachment da Presidente da República” (Disponível em: http://www.mpf.mp.br/go/sala-de-imprensa/noticias-go/mpf-recomenda-a-39-orgaos-federais-sediados-em-goias-que-nao-promovam-atos-politico-partidarios-sobre-impeachment).
O segundo foi a abertura de inquérito pelo MPF-RN: “Ministério Público Federal apura possível uso das dependências da UFRN, para atos contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff. O MPF quis saber se recursos e/ou as dependências da UFRN foram utilizados para defender a presidente(a) Dilma Rousseff” (http://blogdobg.com.br/mpf-apura-manifestacao-contra-o-impeachment-de-dilma-rousseff-na-ufrn-reitora-podera-ser-responsabilizada/). Como visto, um ataque ao espaço das universidades que, por excelência, é do debate.
Mas neste quadro preocupante de instrumentalização das instituições democráticas teve-se um alento, demonstrando que se pode ainda contar com o sistema de justiça, para a defesa da democracia. A Defensoria Pública da União-DPU, por meio dos Titulares de Ofícios de Direitos Humanos e Tutela Coletiva (DHTC),enviou ofício aos reitores e diretores de instituições de ensino superior federais, recomendando que assegurem que a comunidade universitária tenha o direito de debater o momento político atual.
Espera-se que tenham sido dois episódios isolados, estes do MPF de Goiás e do Rio Grande do Norte, pois não se pode em momentos de crise flexibilizar direitos e garantias constitucionais e muito menos, tentar tolhê-los. A Defensoria Pública da União demonstrou identidade da sua atuação com suas funções previstas no ordenamento jurídico. Contudo, a instabilidade política deve perdurar e a população espera que as instituições atuem dentro do importante papel que lhes é reservado dentro de um Estado democrático de direito.
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*Articulista do Estado de Direito – formado em Direito pela Universidade de Fortaleza, pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil, no Instituto de Desenvolvimento Cultural (Porto Alegre-RS).