Ocupação nas escolas públicas e direito à educação no Ceará

Desde o caso julgado pela Suprema Corte Americana “Brown v. Board of Education of Topeka”, de 1954, o problema da igualdade no sistema de educação pública não havia sido enfrentado de maneira tão direta e determinada como nos movimentos secundaristas brasileiros “ocupaescola”.

Por Raquel Coelho de Freitas

No caso americano, os pais das crianças chamaram a atenção da Suprema Corte para as diferenças de tratamento para seus filhos e filhas nas escolas segregadas do Sul. Embora em muitos lugares o ensino gratuito fosse universal, e a doutrina dos ‘separados, mas iguais’ ainda prevalecesse, os representantes legais dos jovens puderam demonstrar que nem as condições educacionais eram iguais, nem a efetivação de bens e direitos estava sendo implementada de forma justa para as crianças negras. Com isso, a Suprema Corte decidiu rever o caso e o reverteu.

No Brasil, o movimento de ocupação das escolas começou no Sudeste e chega ao Ceará com determinação, já mobilizando 59 escolas públicas. Traz uma demanda frente ao executivo estadual, detentor da competência constitucional para implementação de políticas educacionais, bem como de legislador concorrente na matéria, de melhorias e mudanças estruturais na educação pública, e por igualdade de tratamento e oportunidades.

Estudantes e familiares cearenses reconhecem a gravidade da desigualdade de condições de aprendizado que o sistema educacional público apresenta e exigem novas condições para que os direitos desses jovens sejam efetivados. Desde “o pleno desenvolvimento da pessoa” e do “progresso para a cidadania”, previstos no art. 205, da CF/88, até a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, assegurada no art. 206, da CF/88, que o sistema público de educação estadual apresenta-se defasado em metodologia, conteúdo e infraestrutura, comprometendo a construção da subjetividade e da autonomia de milhares de jovens que dele dependem.

Daí a prioridade e a urgência de suas demandas. Reclamam legitimamente por mudanças estruturais nas relações de aprendizado, melhoria na infraestrutura das escolas e nos recursos pedagógicos, e reformulação dialógica e conjunta do conteúdo do ensino, de modo que possa lhes oferecer um sentido mais existencial capaz de lhes ampliar as possibilidades como indivíduos e cidadãos.

Para esses jovens, o movimento de ocupação é, acima de tudo, a construção de uma nova história para o Estado, a busca pela igualdade, e também um novo sentido para a política, vez que não se alinham aos partidos políticos nacionais. Como testemunhou uma dessas jovens guerreiras da educação: “Antes, o Ceará era apenas um Estado passivo, esquecido, onde ninguém reclamava de sua sorte manipulada pelos líderes públicos. Hoje, somos 59 escolas ecoando a mesma voz e querendo ser ouvidas”.

Devemos então, ouvi-las, e que, como em Topeka, o poder público reverta essa situação em busca da igualdade.

Raquel Coelho de Freitas é Profa. de Direito Constitucional da UFC e Coordenadora do Núcleo da Infância e Adolescência NUDI JUS.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Isabel Sousa. Publicação original em O Povo.

Destaque: 01/12/2015 – ‘Ocupação na E E Caetano de Campos’ – Foto: Roberto Parizotti/ Secom Cut.

 

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