A luta pela terra transcende os países

Encontro Internacional de Direitos Humanos da Via Campesina

Rodrigo de Medeiros Silva*

A Escola Florestan Fernandes, em Guararema-SP, recebeu o Encontro Internacional de Direitos Humanos da Via Campesina, entre os dias 18 a 20 de agosto. Participaram advogadas e advogados de diversos movimentos do campo, vindos de 18 países diferentes da Ásia, Europa, África e América.

Foi um momento rico de troca de experiências, de debate sobre perspectivas para a efetivação de direitos, para uma melhor articulação e solidariedade entre os povos. Pôde-se verificar a riqueza da diversidade cultural presente no planeta, como também a identidade que existe na luta pela terra.

A identidade da luta

Escutando a representação estadunidense, por exemplo, percebeu-se o ponto em comum do recrudescimento das normas para tolher manifestações e as formas de pensar diferente, com a conivência do Poder Judiciário. Com o relato da Andaluzia sobre a liderança sindical presa, viu-se como a criminalização de quem se levanta contra injustiças é praticamente universal.  Da mesma forma, ouvindo-se o relato sobre a situação da Índia, parece estar por todo o mundo a imposição de sementes transgênicas por parte do agronegócio.  A narrativa sobre a questão da terra no Nepal, a restrição de seus povos originários a terras sem acesso direto à água, afetando a sua cultura, a sua espiritualidade traz identidade com o que passa variadas populações indígenas pelo mundo. O massacre de Curuguaty no Paraguai, além de ser um retrato da concentração de terra e da violência no campo, foi o fato instrumentalizado para a ruptura institucional naquele país, formatando o modelo de golpe dado no Brasil, sem Forças Armadas, utilizando o Legislativo e o Judiciário para tanto, num ambiente antidemocrático, que só prejudica estas populações. A advogada tunisiana dividiu os desafios que as mulheres de seu país têm que enfrentar, por causa do machismo e do patriarcado. Estas e outras realidades foram partilhadas durante o Encontro.

Combate aos legítimos movimentos populares

O Brasil ainda sofre com presos políticos também. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra- MST possui militantes nesta situação, inclusive, com a utilização da odiosa legislação sobre organização criminosa, para atingir legítimos movimentos populares. O Conselho Indigenista Missionário- CIMI relatou que, dentre kaigang, tupinambá, guarani-kaiowá, enenawê nawê, teharin, xucuru, pataxó, há mais de trinta indígenas criminalizados pelo país. São etnias dos estados da Amazonas, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Rio Grande do Sul que possuem membros sofrendo prisões em regime fechado ou nas aldeias, por causa de suas militâncias por direitos.

Do ponto de vista da articulação internacional, para se enfrentar este quadro tenebroso apontaram-se duas importantes iniciativas. Uma delas é o tratado internacional vinculante de empresas aos direitos humanos. Muitas violações de direitos, inclusive, perpetradas pelos Estados, acontecem para atender a interesses de grandes empresas. Visando sociedades mais inclusivas, que propiciem o bem comum, há de se instituir cuidados e deveres.  A segunda iniciativa debatida foi o Tratado Campesino na ONU, uma Declaração de direitos das campesinas e campesinos, que são, muitas vezes, desrespeitados.

Perspectivas

Ao final, dentre outras proposições, debateu-se a criação de uma rede internacional desta advocacia do campo, a partir da Via Campesina. São inúmeros os desafios, mas para enfrenta-los necessita-se de articulação para tanto. Este Encontro demonstrou estas perspectivas e os movimentos populares, sempre em marcha, vão se organizando para cada obstáculo superar.

*Formado em Direito pela Universidade de Fortaleza, especialista em Direito Civil e Processual civil, no Instituto de Desenvolvimento Cultural (Porto Alegre-RS).

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

3 × quatro =