Quem está caindo fora?

Rodrigo de Medeiros Silva* – Coluna A Advocacia Popular e as Lutas Sociais

Semelhanças e diferenças entre os “Foras”

O “Fora Collor”, “Fora FHC”, “Fora Lula”, “Fora Dilma”, “Fora Cunha”, “Fora Temer”…para muitos já ficou banalizado. Mas há de se perceber semelhanças e diferenças cruciais nestas “similares” palavras de ordem.

Poderia de uma forma simplória, afirmar que a identidade em todos estes “Foras” seria a indignação com a corrupção.  Mas observando quem grita e porque grita, percebe-se uma boa diferença. Outro ponto importante, do ponto de vista de harmonização da sociedade e do funcionamento das instituições brasileiras, é perceber quem grita ou gritava a favor destes governos.

O “Fora Collor” e o “Fora FHC”

O “Fora Collor” tinha também como pano de fundo a indignação de quem teve suas poupanças confiscadas. Um calote eleitoral, haja vista ter afirmado que o seu oponente, o Lula, era que faria isto se ganhasse. Há de somar o impacto negativo das primeiras medidas neoliberais, com o governo seguindo o famigerado “Consenso de Washington”, contrário ao que estabelecia a Constituição de 1988 e que tinha mobilizado tanto a população.
O “Fora FHC” tinha embutido a contrariedade com a intensificação do neoliberalismo, especialmente, com as privatizações. Estas realizadas sob a denúncia de compra do Congresso e por venda das empresas nacionais por valor vil, diante do que realmente valiam.
img (foto collor ou fhc)

Os “Foras” dos Governos PT

Chegando aos Governos do PT, outros elementos se somam ao sentimento de “combate à corrupção”. Com exceção de um pequeno segmento de esquerda, mais identificado com parte do PSTU, quem gritava “Fora Lula” e “Fora Dilma” também nutria uma insatisfação com os programas sociais até então aplicados. Mas não uma insatisfação porque poderiam avançar mais e sim, por serem contrários. Pessoas que, apesar de utilizar a estética nacionalista, programaticamente possuem mais identidade com a pauta neoliberal que significa, num país periférico, maior dependência político-econômica. A lista de coisas que incomodavam era grande: cotas, “Mais médicos”, a lei das trabalhadoras domésticas, ampliação das vagas nas universidades, etc. Ainda havia a discordância da política externa realizada. O Brasil, diferente dos governos anteriores, foi construindo um protagonismo internacional. Contudo, isto passava também por fortalecer relações com países que ideologicamente eram endemonizados por setores conservadores no país, como Venezuela, Cuba, Bolívia, China, Rússia, dentre outros.

Os “Fora Cunha” e “Fora Temer”

Os “Fora Cunha” e “Fora Temer” possuem um quê de contradição por parte de alguns setores que puxam este grito. Isto porque, mesmo não gostando dos mesmos, até bem pouco tempo não gritariam, por um “pragmatismo” eleitoral e um sempre presente apelo à chamada governabilidade. Mas estes “Foras” também trazem a insurgência contra o que existe de mais conservador no Brasil: o fundamentalismo religioso, a homofobia, a defesa do latifúndio e do agronegócio, o racismo, o genocídio da população negra e indígena, o machismo, o fascismo, o mito da meritocracia, etc.

Quem se mobiliza e quem se mantem inerte

Como dito acima, importante é também perceber quem se mobiliza contra a estas palavras de ordem, ou quem se mantinha ou se mantem inerte. O “Fora Collor” foi um consenso na sociedade, diferente do que ocorreu com os demais presidentes. O “Fora FHC” mobilizava os setores mais preocupados com um projeto de país, com direitos sociais, com pautas mais a esquerda.  Isto significa não encontrar consenso na sociedade brasileira. Todavia, o setor da população que legitimava o FHC estava numa situação cômoda, havia uma garantia institucional de manutenção do governo, que dava a segurança para ficarem inertes. O “Fora Lula” gozou também desta segurança. Mas já o “Fora Dilma” não, o que levou os setores identificados com o seu governo e para além deles, os segmentos que, apesar de não identificados com o Governo, se mobilizaram por não quererem o retrocesso em direitos e na estabilidade democrática.

Agora, curioso é que há uma certa parcela da população, que não se mobilizou no “Fora Cunha” e ainda não está se mobilizando no “Fora Temer”. Este setor batia sempre na tecla do “combate a corrupção” para bradar o “Fora Dilma”. Claramente, demonstram que não era “só” por isto. Quando instigados em suas motivações diziam que eram “Fora Todos”, não tinham “bandido favorito” e outras coisas semelhantes. Mas uma vista rápida nas redes sociais já dá pra perceber que este mesmo setor, apesar de ter já ocorrido no impeachment da Dilma, ainda focam na mesma e no PT.

E vão além, apesar de colocarem Dilma, Cunha e Temer como corruptos, legitimam os atos do governo Temer, fazem troça com os direitos perdidos e com os retrocessos na democracia e na política externa brasileira. Isto demonstra, de forma inequívoca, que para este setor o “combate à corrupção” não era algo prioritário, mas sim uma discordância ideológica com governo ou mesmo com o que ele simbolizava. Pois algumas das medidas de restrição de direitos, agora apoiadas, estavam sendo também encaminhadas pelo governo anterior.

Na verdade, quem está caindo fora? Está quem sempre esteve e por políticas de governo e não de estado, estavam tendo a possibilidade de mudar esta situação. Não é a Venezuela que está sendo posta de fora do Mercosul, é o Brasil que está caindo fora da integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, determinada pela Constituição Federal (art. 4º, § único).

Precisa se atentar para as reais consequências do golpe dado no Governo Dilma.

O Brasil que quer um país para os brasileiros necessita acordar que o “Fora Dilma” não resultou “apenas” no fim de um governo de forma ilegal e ilegítima. Significa o país ter caído fora de uma caminhada de empoderamento. Cheia de idas e vindas, mas que estava ocorrendo. Voltou a ser uma “República das bananas”, seguindo a trilha dos golpes de Honduras e Paraguai.

Um Brasil que seus recursos servem ao “mercado internacional”, mas nunca à sua população.

*Formado em Direito pela Universidade de Fortaleza, especialista em Direito Civil e Processual civil, no Instituto de Desenvolvimento Cultural (Porto Alegre-RS).

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

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