Eleições: A vitória dos ricos

O que nos cabe? Dizer não ao massacre já iniciado, costurar redes de solidariedade e resistência, reconstruir laços. Não será fácil

Por Mauro Lopes – Outras Palavras

O resultado das eleições é desastroso para os pobres. A vitória de João Doria no principal centro do país é o símbolo do que aconteceu neste domingo.

Os ricos venceram e não apenas pelo conteúdo dos projetos, mas venceram sendo eleitos eles próprios em grandes, médias e pequenas cidades.

O projeto das elites, urdido desde sempre, mas a partir de 2013 como um processo articulado de tomada de poder, está vitorioso: arrasou-se com o PT, prevaleceu o discurso do ódio, disseminou-se entre as classes médias e os pobres o “crack” do sonho de riqueza individual, tão ilusório quanto as viagens da pedra viciante.

Com o golpe de Estado, o apoio decidido da máquina de propaganda privada (a mídia de massa) e o resultado das urnas, estão dadas as condições para a aplicação, nos três níveis de governo, de políticas de exclusão e antipopulares.

Diferentemente do governo FHC, quando ainda podia-se alegar que a dominação era administrada por segmentos “esclarecidos” de fatias ilustradas e vinculadas à Universidade, agora é o reino dos brucutus obscurantistas em aliança com milionários ignorantes dispostos a tudo para ampliar e consolidar suas fortunas.

Com FHC e o “velho PSDB”, ainda havia a “liturgia do cargo” e algum vínculo com a luta democrática, herança da frente que reuniu gente tão diversa contra ditadura.

Nestes tempo de Temer, Alckmin, Doria, Moraes, Gilmar e Moro, o desprezo pela democracia está não apenas na origem do governo – o golpe – como na biografia de seus líderes e na visão de que os pobres devem ser mantidos sob controle debaixo de pancada, bombas e, sempre que necessário, torturas e mortes.

O segundo turno no Rio, Recife, Belém e Fortaleza não será suficiente para reverter o quadro e – sejamos realistas – as chances de vitória são reduzidas.

O que resta aos pobres? Aguentar e resistir num cenário de intenso sofrimento à frente. Deixamos os tempos da afirmação (as políticas inclusivas, as ações afirmativas, os avanços democráticos, apesar de todas as contradições) para o tempo da negação. Dizer não ao massacre já iniciado, costurar redes de solidariedade e resistência, reconstruir laços.

Não será fácil. O PT está aos frangalhos e até ontem recusava-se a fazer uma autocrítica dos equívocos. O PSOL aparece como nova força de esquerda, mas com enormes dificuldades. Diferentemente do velho PCB e do PT, que nasceram enraizados nas camadas populares, o PSOL é, ao menos por enquanto, uma agremiação de classe média. As pontes com os pobres ainda precisarão ser construídas.

Há um movimento social renovado mas ainda frágil, que precisará de tempo para se desenvolver, num cenário adverso e de perseguição.

Não estou pessimista. Creio que é realista pensar assim. O eixo do poder no país deslocou-se e está nesse momento quase que integralmente nas mãos dos ricos, especialmente o segmento financeiro (bancos mais rentistas) representado pelo PSDB, em aliança com o segmento dos salteadores (PMDB et caterva).

Onde será possível resistir a essa força que tomou conta do aparelho de Estado (no Executivo, Legislativo e Judiciário) e dos aparelhos ideologizantes (a mídia e as “máquinas de sonhos”)?

Na articulação dos debaixo e nas ruas. Até agora, entretanto, a voz das ruas não conseguiu reunir força para se contrapor ao novo arranjo. Conseguirá, na medida em que o novo poder mostrar suas garras mais claramente? Veremos. O que não dá pra contar é com uma derrubada dos ricos em curto prazo. Mesmo 2018, com Lula fora do páreo – e ele estará condenado e inelegível – já não parece um horizonte promissor.

Tempos duros à frente.

*Jornalista, católico, ministro extraordinário da Comunhão e da Palavra na Igreja em Paraisópolis, São Paulo

Imagem: Pierre-Auguste Renoir, O baile no moulin de la galette, 1876 (detalhe)

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