Samarco e Vale criminalizam atingidos no Rio Doce

Por meio das estruturas do Estado, mineradoras tentam impedir o livre direito à manifestação e organização dos atingidos

Em Tragédia Anunciada

“Foi depois do fechamento de quase 20 horas da estrada de ferro que a Samarco fez o cadastro de todos os moradores da comunidade”, relata Regiane Souza, atingida do distrito de Mascarenhas, em Baixo Guandu (ES). A conquista foi por mérito da organização e luta de uma comunidade que se viu abandonada à própria sorte pela Samarco (Vale/BHP Billiton).

A população do povoado, tradicional pela atividade pesqueira, não encontrou outra opção que não fosse trancar as vias férreas usadas pela Vale S/A por seis vezes, desde o rompimento da barragem de Fundão, ocorrido no dia 5 de novembro de 2015. As manifestações aconteceram como forma de denunciar a negligência da Samarco e apontar os problemas enfrentados por centenas de famílias.

“Toda vez que conseguimos parar o trem chegamos a algum diálogo com a empresa”, lembra Regiane. De acordo com a atingida, o trancamento de uma ferrovia faz parte de uma estratégia para chamar a atenção das mineradoras, da sociedade e mostrar que a organização do coletivo garante a conquista de direitos.

Por outro lado, as mineradoras não aprovam esta forma de manifestação. Por meio de instrumentos jurídicos, as empresas tentam deslegitimar e criminalizar lideranças. Como resultado dessa perseguição, 13 militantes da Bacia do Rio Doce sofrem processos da Vale S/A.

Perseguição a militantes

O direito de se manifestar é constitucionalmente garantido, podendo ser realizado em qualquer lugar do país. As paralisações dos trilhos acontecem de forma passiva e organizada.

A contradição é evidente. Na véspera do aniversário de um ano do rompimento da barragem de Fundão, a quantidade de atingidos e militantes populares processados pela Vale é maior do que o número de diretores da Samarco (Vale/BHP Billiton) indiciados pelo crime que matou 19 pessoas em Bento Rodrigues (MG). Ou seja, convém destacar a impunidade das empresas culpadas, em detrimento da drástica violação dos direitos civis daqueles que lutam por justiça.

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) repudia perseguições a militantes, pois isso é uma violação dos direitos de manifestação e organização. A atuação do MAB é organizar, conscientizar e politizar as populações atingidas. Mesmo assim, a Vale tentar impedir a livre manifestação para defender seus interesses.

O domínio da Vale sobre órgãos do governo permite que ela use de mecanismos contra os movimentos sociais, como prisões, inquéritos policiais, ações criminais, ameaças e intimidação. Alguns policiais militares do Espírito Santo são seguranças particulares da Vale em suas horas de folga. Existem denúncias que um comandante da PM teria uma empresa de segurança que presta serviço à mineradora. Dessa forma, fica claro que a PM é a segurança da Vale contra o povo, o que deveria ser o contrário.

Em várias manifestações, os policiais militares, de Minas Gerais e Espírito Santo, reprimiram os manifestantes, obrigando-os a se retirarem das estradas de ferro. Um desses incidentes aconteceu no distrito de Cachoeira Escura, em Belo Oriente (MG). Durante uma ocupação da linha, um agente puxou o braço de uma das moradoras que cobrava da Samarco água de qualidade para a comunidade.

Em Colatina (ES), durante outra manifestação, a PM chamou um dos manifestantes e apresentou uma liminar de reintegração de posse vencida há 30 dias. O popular questionou a validade do documento e disse que os outros precisavam saber que se tratava de uma notificação ilegal. Os oficiais o chamaram de “palhaço” e deram voz de prisão.

Com tais atuações, fica visível que a força da organização do povo intimida a Samarco, a Vale e a BHP Billiton, e que essas farão de tudo para impedir que as conquistas dos atingidos avancem, por meio das estruturas do estado.

A autonomia das famílias, garantia do protagonismo no processo de reparação e punição para os criminosos da mineração é parte deste grande trabalho para reconstruir a Bacia do Rio Doce, que cresce gradativamente de Mariana à foz do Rio Doce.

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