Próximo à fronteira do Paraguai, o município é conhecido pela profusa produção agropecuária e pelos altos índices de violência contra as populações indígenas
Realizado a custo zero, o projeto de música eletrônica do jornalista Ruy Sposati segue no esquema lo-fi tropical faça-você-mesmo, com músicas feitas a partir de samples, loops, colagens e instrumentos de software. Assim como no disco anterior, Dourados mantém o ritmo das canções feitas na estrada, compostas e gravadas em nove estados e diversas cidades do país, da capital federal a Jacareacanga, no Pará, passando pelo Acre, Maranhão, Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo e Mato Grosso do Sul, além de uma música feita em Miryang, na Coreia do Sul.
Ruspô trafega por um Brasil árido e contemporâneo como se fizesse uma “etnografia musical” – conforme escreveu o crítico Guilherme Cavalcante sobre Dourados State of Mind, single lançado pela Noisey/Vice. O disco mistura a própria experiência de Sposati às vozes daqueles que vivem no sufoco de um faroeste distópico. Transitando livremente por gêneros musicais diversos, Ruspô conta de ataques de fazendeiros paramilitares contra índios acampados na lona, colegas de escola assassinados pela polícia, uma vizinha na prisão, amores comunistas, monges urinando peixes e agricultores de banana.
Um pouco mais cinza que “Esses Patifes” – a começar pela capa monocromática -, o título do novo álbum faz referência à segunda maior cidade do Mato Grosso do Sul, espécie de “eldorado” moderno no contexto da expansão do agronegócio no oeste do país. Próximo à fronteira do Paraguai, o município é conhecido pela profusa produção agropecuária – notadamente gado, soja e cana – e pelos altos índices de violência contra as populações indígenas Kaiowa e Guarani, que há décadas lutam para terem de volta as terras de seus antepassados.
Nos últimos anos, o jornalista concentrou seu trabalho no Mato Grosso do Sul, denunciando as violações de direitos sofridas pelos indígenas. Lá, esteve na alça de mira da censura do Estado: teve seu computador pessoal apreendido arbitrariamente por um delegado da polícia federal enquanto cobria um protesto do povo Terena; foi vítima de acusações fantasiosas em inquéritos policiais (um deles, já arquivado pela Justiça) e em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul, que tentaram relacionar seu trabalho de reportagem à ação de guerrilheiros paraguaios. Apesar de bastante concreto, esse é o ambiente surreal de onde surge o universo de Dourados.
Assista ao vídeo de Dourados state of mind:
Biografia
Ruspô é o projeto musical do jornalista paulistano Ruy Sposati. Em 2011, Ruy começou a compor e gravar, em seu próprio computador, com instrumentos reais e de software, samplers e loops, ao longo das viagens que fazia como jornalista cobrindo a questão indígena e fundiária em diversos lugares do país.
Em 2013, lançou “Esses Patifes”. O disco figurou em diversas listas como um dos melhores discos de 2013, ao lado de artistas como Emicida, Céu e Lucas Santtana. NA BBC, Gilles Peterson elogiou o disco em seu programa musical “Worldwide”, apresentando a faixa “Altamira” ao público inglês. No Canadá, Hungria, Israel, México, Estados Unidos, Portugal, Rússia e Espanha o disco também foi destaque em blogs, rádios e sites especializados em música brasileira e internacional. Rádios e podcasts do Japão, Austrália, Letônia, França e Inglaterra, entre outros, veicularam faixas do álbum de estreia de Ruspo.
O selo inglês Mais Um Discos lançou a faixa “Brasília é Luísa” na coletânea “Rolê: new sounds of Brazil“. A faixa Chatuba do Agroboy ganhou um vídeo-clipe não-autorizado. Em Belo Horizonte, durante o ano de 2014, montou uma banda para apresentar o disco ao vivo.
Link para download (MP3/320kbps)
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por Lunaé Parracho.
