População pede Saúde, mas Temer ignora e quer remédio que matará o paciente, por Leonardo Sakamoto

Blog do Sakamoto

A situação da Saúde é o principal problema do país para 33% da população, de acordo com pesquisa Datafolha, divulgada neste domingo (11). A corrupção, que havia assumido o primeiro lugar em junho de 2015, está na segunda posição com 16%.

Enquanto isso, o governo Michel Temer tenta aprovar a proposta de emenda constitucional 55/2016 (antiga PEC 241/2016) que vai limitar o crescimento nos gastos públicos pelos próximos 20 anos, o que deve afetar o aumento de investimentos em uma das principais áreas na Esplanada dos Ministérios: a Saúde.

Saúde e educação, até hoje, são atreladas a uma porcentagem do orçamento (o montante da saúde, em nível federal, cresce baseado na variação do PIB, e o da educação, deve ser de, pelo menos, 18% da receita).

Como o governo está propondo um teto para a evolução das despesas públicas baseado na variação da inflação (ou seja, sem crescimento real), precisará restringir, a partir de 2018, o que é gasto nessa área. Representantes de Michel Temer dizem que a Saúde não será afetada, mas se recusam a protege-la em ressalva na PEC.

O aumento da destinação de recursos em gastos públicos, como saúde, tem ocorrido acima da inflação nas últimas décadas – em parte para responder às demandas sociais presentes na Constituição de 1988 e, consequentemente, tentar reduzir o imenso abismo social do país. Se o reajuste tivesse sido apenas pela inflação, anualmente teríamos um reajuste de custos e o tamanho da oferta de serviços não cresceria, permanecendo tudo como estava.

Se a qualidade do serviço público segue, mesmo assim, insuficiente para a garantia da dignidade da população, imagine quando novos investimentos para além da inflação forem cortados. Afinal, o problema do Sistema Único de Saúde, mais do que questões de gestão, é o subfinanciamento. Ou seja, falta de grana crônica.

Isso sem contar que, do jeito que está estruturada, a reforma da Previdência vai levar trabalhadores a preferirem adotar um plano de previdência privada do que esperar a integralidade de uma aposentadoria – que só viria com um mínimo de 65 anos de idade e 49 anos de contribuição ao INSS. Com o progressivo abandono do sistema público, haverá menos recursos para o pagamento de pensões por danos à saúde – como as pagas aos trabalhadores de frigoríficos, alguns aposentados aos 30 por invalidez por conta das sequelas deixadas pelo penoso serviço.

Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o principal problema -de acordo com o Datafolha – foi o desemprego, tendo muitas vezes o binômio fome e a miséria como segundo colocado. Durante o mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, desemprego seguiu em primeiro até 2006, quando deixou de ser a principal preocupação, perdendo em 2007 para violência/segurança. E, de 2008 até junho de 2015, o primeiro lugar ficou com a saúde.

Ou seja, com exceção do período junho de 2015 até dezembro de 2016, a saúde tem sido o principal problema do país – segundo as pesquisas do Datafolha. O intervalo de 18 meses foi causado pelo processo político de desestabilização e impeachment de Dilma Rousseff, bombado por intensa cobertura midiática.

A corrupção estrutural tem se mostrado bem profunda e complexa, envolvendo todos os grandes partidos brasileiros, no nível do ”se gritar ‘pega ladrão’ não sobra um, meu irmão”. Mas parte da população parece que resolveu retomar a sua programação normal das tragédias brasileiras do dia a dia, por satisfação ou cansaço, depois da queda da presidente.

Mas o atual governo vai reduzir a assistência dada pelo Estado brasileiro, diminuindo-o de tamanho através da aprovação da PEC 55/2016 – o que significa armar uma bomba relógio que será sentida daqui a alguns anos. Vai, portanto, na contramão das reclamações da sociedade conforme a pesquisa.

Ao mesmo tempo, o Datafolha trouxe outro dado interessante: 75% da população acredita que Michel Temer é defensor dos mais ricos.

Temer ”assumiu o poder” a fim de implantar as reformas para que o Estado brasileiro priorizasse o desenvolvimento do capital e protegesse o grupo social que o detém. A consequente perda da dignidade dos trabalhadores, através da também consequente perda de qualidade dos serviços públicos é mero efeito colateral.

Ou seja, não é que Temer persiga trabalhadores. Mas pode-se dizer que ele atua para ”proteger ricos”.

Com isso, o Estado brasileiro se aprofunda no processo de garantir que os lucros fiquem na mão de poucos (o capital ganhou muito mais do que o trabalho na época de vacas gordas) e o prejuízo na mão de muitos (porque a chicotada para sair da crise está vindo na lombar dos trabalhadores, enquanto que os mais ricos estão sendo preservados). Ou seja, nem dá para falar em socialização de prejuízos, porque é só a xepa que está pagando a conta.

Deveríamos discutir também a volta da taxação de dividendos recebidos de empresas (os muito ricos pagam menos imposto em relação à classe média porque dividendos não são taxados), uma alteração decente na tabela do Imposto de Renda (criando novas alíquotas para cobrar mais de quem ganha mais e isentando a maior parte da classe média), a regulamentação de um imposto sobre grandes fortunas e um aumento na taxação de grandes heranças (seguindo o modelo norte-americano ou europeu).

Pelo contrário, o governo segue mantendo centenas de bilhões de reais em desonerações tributárias e crédito subsidiado para o setor empresarial em 2017. O que vai fluir para o bolso de seus acionistas.

Ninguém nega que o déficit público precisa ser equacionado e que soluções amargas devem ser propostas e discutidas. E todos terão que dar sua contribuição, pobres e ricos. Mas Michel Temer e o ministro da Fazenda Henrique Meirelles e sua equipe seguem defendendo medidas que irão mudar a qualidade de vida dos mais pobres e evitam aplicar remédios amargos entre os mais ricos.

Remédio que vai ajudar a piorar a Saúde, apesar da população pedir o contrário.

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