Em acordo na Justiça, MPF/AM garante consulta prévia a comunidades sobre projeto de mineração em Autazes

Potássio do Brasil Ltda. recebeu licença prévia ambiental para exploração de silvinita sem consultar comunidades na região; MPF/AM levou caso à Justiça

MPF/AM

O Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) conseguiu acordo, na Justiça, para garantir aos povos indígenas e comunidades tradicionais do município de Autazes (a 113 quilômetros de Manaus) o direito de participar de consulta livre e informada sobre a realização de estudos para exploração de minérios e instalação de estrutura rodoviária e portuária em terras indígenas ocupadas tradicionalmente pelo povo Mura, naquela cidade.

O MPF/AM passou a acompanhar o caso depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil Ltda. começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades. Em julho de 2016, o órgão expediu recomendação ao Ipaam, para que cancelasse a licença já expedida, e à Potássio do Brasil Ltda., para que suspendesse as atividades de pesquisa na região até a realização das consultas nos moldes previstos na legislação. Nenhum dos pedidos foi atendido. A concordância em realizar as consultas nos moldes previstos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) só veio após o MPF/AM levar o caso à Justiça.

Agora, com a assinatura do acordo, o licenciamento foi suspenso por seis meses, com possibilidade de prorrogação deste prazo, para que as comunidades envolvidas possam se manifestar livremente, conforme protocolos definidos pelos próprios comunitários. O documento assinado perante a Justiça prevê prazo de 90 dias para realização de nova audiência de avaliação das propostas de formato das consultas.

O acordo prevê ainda proibição à Potássio do Brasil Ltda. de buscar contato com membros das aldeias e comunidades ribeirinhas da região, mediante qualquer processo de convencimento ou de cooptação de lideranças e membros dos grupos. O rito a ser seguido nas consultas deverá ser produzido em comum acordo entre a Fundação Nacional do Índio (Funai), as lideranças das aldeias e as comunidades ribeirinhas da região e posteriormente comunicado à Justiça quando houver definição da instituição que irá participar do processo de consulta.

Em caso de descumprimento de qualquer item do acordo, há previsão de multa no valor de R$ 50 mil por situação identificada. Assinaram o acordo um cacique Mura, representantes do MPF/AM, da Funai, da empresa Potássio do Brasil Ltda., do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Atropelo de etapas – A apuração que resultou na ação verificou que, desde 2009, vinham sendo realizadas pesquisas de campo, autorizadas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), para a identificação das jazidas dentro da terra indígena Jauary, sem que fossem consultadas as comunidades atingidas. O estudo de impacto ambiental do empreendimento classificou o porte de empreendimento como “excepcional” e afirma ser “muito alta” a interferência nos referenciais socioespaciais e culturais nas comunidades tradicionais e indígenas da região.

O MPF/AM colheu, inclusive, relatos de perfurações já realizadas na terra indígena Jauary. Em 2013, a Coordenação Geral de Licenciamento Ambiental (CGLIC) da Funai notificou a Potássio do Brasil para que suspendesse imediatamente as atividades incidentes sobre a terra Jauary e solicitou ao Ipaam que adotasse as medidas cabíveis, o que não foi atendido.

Na ação que deu origem ao acordo, o MPF sustenta que houve atropelo das normas e etapas legais, tanto nas irregularidades na expedição de licença prévia pelo Ipaam, quanto na não realização da consulta prévia aos indígenas. O termo de referência para a realização do Estudo do Componente Indígena foi emitido em maio de 2015 pela Funai e o Ipaam concedeu a licença prévia ao empreendimento em julho do mesmo ano, sem que o estudo fosse efetivamente realizado, incluindo-o como uma condicionante ao licenciamento ambiental. Para o MPF, tal fato, por si só, configura grave distorção ao devido processo de licenciamento ambiental e a ausência de consulta nos moldes da Convenção nº 169 da OIT fere diretamente o direito à autodeterminação dos povos indígenas e comunidades tradicionais.

Imagem: comunidade de Murutinga, localizada no município de Autazes (AM) – Reprodução do Cimi

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