O testamento de Judas e o Serra Velho, por José Ribamar Bessa Freire

No Taqui Pra Ti

Sábado de Aleluia. Tradicional malhação do Judas. No bairro de Aparecida, em Manaus, o boneco pendurado no poste trazia o testamento no bolso, escrito pelo Edilson, o gaguinho, com estrofes sem um só verso de pé-quebrado. O gênio da poesia popular, irreverente e atrevido, resumia intrigas políticas e fofocas do bairro. Não poupava ninguém, nem ele mesmo.

Depois da leitura pública do testamento e da queima de Judas, iniciava a cruel cerimônia do “Serra Velho”. Na madrugada, jovens com serrotes, pedaços de pau e latas faziam barulho infernal na frente da casa do morador mais idoso – só respeitavam aqueles doentes – quando então cantavam:

As caveiras do outro mundo / vieram lhe dizer-êêê / que agora neste ano / você vai morrer-êêê.

Depois gritavam em coro:

– Encomende a alma a Deus, porque seu corpo já não vale nada.

Alguns velhos entendiam como gozação e até apareciam na janela para um dedo de prosa. Outros se irritavam, como dona Maria Rosa, que jogava o conteúdo de um penico sobre as “aves agourentas”. Psicografado pelo Edilson, apresento-lhe aqui o testamento do Judas de 2017.

 01.Há dois mil anos me malham

Muda o mundo, pra mim nada

Chega o sábado de Aleluia

E me enchem de porrada.

 

 03. Ao Trump bundão eu deixo

O muro de Jericó

E a espada de Herodes

Pra enfiar no fiofó.

 

05. Ao “Índio” Eunício deixo

A Funai, só de pirraça.

Que ela poupe os índios,

Mas acabe com tua raça.

 

07. Ao Rodrigo, o “Botafogo”,

Vil sucessor do Cunha

Deixo o dedão do Temer

Pra rasgar o tu com a unha.

 

 09. Aos da lista do Fachin

Dou um penetrante créu

Com delação premiada

Lego o atestado de réu.

 

11. Ao Eliseu Padilha, o “Primo”,

Amigo de Temer, de FHC,

Deixo-lhe balcão de negócios

E da Odebrecht o guichê.

 

 13. Ao Jucá que a falcatrua

Fez sair da pindaíba

Deixo a suruba com Cunha

Na prisão de Curitiba

 

15. As trinta moedas de prata

E o caroço desse angu

Deixo pro Sérgio Cabral

Curtir no spa de Bangu.

 

17. Ao Moro, o vaza a jato,

pra Rede Globo vaza veloz

Lego tua foto com Aécio

Tão promíscua e tão atroz.

 

 19. Para Alexandre de Moraes

O plagiador kinder-ovo

Deixo o evangelho de Lucas

Pra copiar tudo de novo.

 

  21. Que o pato da FIESP fique

Com os seis milhões do Skaf

Ele enganou os paneleiros?

Que da prisão não  escape.

 

23. Deixo a Arena Amazônia,

Ao senador Braga, o Dudu

Com a superfatura exposta

Que ele vá tomar na rima.

 

25. À Vanessa e ao Eron

Que estão na lista do Fachin

Deixo um capital polpudo

Em Moscou ou em Pequim.

 

27.Ola-lá, olha o boi que te dá?

Eu peguei na algibeira

(A propina do Caixa 2)

É pro Cabo Pereira.

 

29. Ao prefeito Artur Neto

Deixo um resto de decoro

Vai aposentar o kimono

Antes de se ver com o Moro.

 

31 Ih, já ia me esquecendo

Do sócio do Cabral, o Pezão

Pelo calote na UERJ

Deixo-lhe sua cassação.

 

33. Os  paneleiros pouparam

Barrabás, ladrão do erário.

Deixo-lhes o meu remorso

E o grito: Fora Temerário.

 

 02.Mas antes de me ferrarem

E morrer mais uma vez

Eis aqui o inventário

Do que eu lego pra vocês.

 

 04. A ti, Temer, legar-te-ei

Minha corda de enforcado

Pendurar-te-ás na figueira

Seu traíra desgraçado.

 

06.O Renán  é quem herda

Um implante de pentelho,

Feito com verbas do Senado,

Com ele eu me aconselho.

 

 08. O Cunha preso não está

Só é usufrutuário da cela.

Dou-lhe caixão de defunto

Pra quando esticar a canela.

 

10. Oh ministros e parlamentares!

Deixo-lhes o meu Caixa Dois

Com propina milionária

Sois ladrões, ora pois pois.

 

 12. A Odebrecht atirou

O pau no gato te-otó

Acertou Moreira Franco

O Angorá do quiproquó.

 

14.  O Lula “amigo” herda,

Um tríplex em Guarujá,

Um sítio em Atibaia

Até tu comeu o jabá?

 

16. Ao outro Sérgio, o Cortes,

Dançou em Paris no inverno.

Deixo a Fatura Exposta

Pra bailar lá no inferno.

 

18. Ao “paladino da honradez”

Ao Collor das Alterosas

Ao Aécio, tucano e corvo,

Deixo propinas fuderosas.

 

20. Gilmar Mendes a ti deixo

Exame de coproscopia

Da tua diarreia verbal

O Janot tem merdofobia.

 

  22. Anastasia, tu finges ser

Um santinho do pau ôco

Encheste a burra de grana

Taquiprati o meu cotôco.

 

24. Lego ao senador Omar Aziz

A ponte superfaturada, viu?

Com a propina embolsada

Vá pra ponte que se partiu.

 

  26. A ti José Melo Merenda,

Estadista de igarapé

Deixo as verbas desviadas

Para ser cassado pelo TSE.

 

28. Paguei, paguei, paguei

Paguei torno a pagar.

Ao Alfredo Nascimento

Ao Dudu e ao Omar.

 

30. Vaiou o Artur na Lava Jato

Marcelo Ramos, o velho novo

Pra lembrar o amigo Buchada,

Deixo-lhe  catuaba com ovo.

 

32. Ao José Mayer assediador

Que diz estar arrependido

Deixo-lhe Maria Madalena,

Para testar se é bandido.

 

34. Lá onde perdi as botas

Lego ao mulato inzoneiro

O nojo desses pulhas

A fé no povo brasileiro.

 

P.S.Agradeço o Mauro Biba pelas dicas e a Uagogo pela foto do Judas.

 

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