Por democracia e direitos, Diretas Já!

Por Giane Ambrósio Alvares, no Justificando

A depender do desejo e das ações das elites detentoras do capital, dos grandes meios de comunicação e de grande parte do parlamento, a democracia brasileira sempre será uma festa de fachada para a qual o povo brasileiro não será convidado, a não ser para pagar a conta ou fazer a faxina.

Em meio à grave crise econômica que atingiu o país, os verdadeiros donos do poder, visando manter seus privilégios, sem qualquer cerimônia ou traço de acanhamento, não tiveram nenhuma dúvida: organizaram suas tropas na mídia e no Congresso Nacional, levaram a cabo um processo de impeachment sem prova alguma da prática de crime de responsabilidade e destituíram do Poder a presidenta eleita pela soberania do voto popular.

Uma vez violado um dos pilares centrais da Constituição de 1988, sob a batuta de Michel Temer, os mais sinistros personagens do teatro político brasileiro voltaram à cena e não têm medido esforços para promover um violento e extenso ataque aos direitos da classe trabalhadora, aos programas sociais e ao patrimônio nacional.

Nesta altura, no entanto, as forças econômicas, políticas e jurídicas que deram sustentação ao golpe já não estão atuando de modo hegemônico e, nos dias que se seguem ao terremoto político causado pela divulgação das delações dos proprietários da JBS, o que se vê no horizonte do país é a possibilidade concreta de os momentos de Michel Temer ocupando a Presidência da República estarem contados.

Com baixíssima aprovação, sem resultados reais na economia, com uma crescente insurgência popular contra seu governo e envolvido diretamente em graves acusações de prática de crimes, Michel Temer, agora fustigado pelo poderoso arsenal da Rede Globo, está pronto para ser devorado.

Neste cenário, a dúvida que paira no ar refere-se ao modo pelo qual se dará a sua retirada do Poder – se pela renúncia, cassação da chapa eleitoral pelo TSE ou impeachment – e a grande luta a ser travada é pela forma como se dará a escolha de seu sucessor – se pela via de eleições diretas ou indiretas.

Não parece muito complicado compreender que quem se atreveu a colocar a cavalaria em campo para desrespeitar a Constituição de 1988, a soberania do voto popular e extinguir direitos com a voracidade que temos acompanhado, não está interessado em eleições diretas para Presidência da República.

Muito ao contrário, o que lhes interessa é substituir o atual fantoche por outro fantoche qualquer que se mostre comprometido e apto a levar a cabo as reformas desejadas pelo capitalismo predatório nacional e estrangeiro.

Com esse foco, as regras do jogo democrático são lembradas apenas se servirem a esses interesses.

Exemplo disso veio estampado no editorial do jornal O Globo no último dia 19 de maio. Eivado de afetação e de dissimulada surpresa e indignação com as condutas atribuídas a Michel Temer, o texto pediu a renúncia do presidente e somente se recordou de invocar a Constituição para deixar estabelecida a opção por eleições indiretas, a serem realizadas pelo Congresso Nacional:

“O caminho pela frente não será fácil. Mas, se há um consolo, é que a Constituição cidadã de 1988 tem o roteiro para percorrê-lo. O Brasil deve se manter integralmente fiel a ela, sem inovação ou atalhos, e enfrentar a realidade sem ilusões vãs”.

Todavia, no ponto em que a Constituição de 1988 determina que “todo o poder emana do povo” (art. 1º, parágrafo único), ela é solenemente ignorada, assim como vem sendo ignorado também o fato de pesar sobre importante parte dos integrantes do Congresso Nacional pesadas acusações de prática de crimes.

O fato de Henrique Meirelles ter ocupado entre 2012 e 2016 o cargo de presidente do conselho de administração da empresa controladora da JBS e permanecer como Ministro da Fazenda não é motivo de consternação para os porta-vozes do novo golpe. Ao contrário, sem nenhum pudor, seu nome chegou a ser cogitado para ser indiretamente eleito para a Presidência da República.

Mais uma vez, como é corriqueiro na história do Brasil, as peças do jogo político são movimentadas para impedir a interferência do personagem principal nos processos decisórios. Para atingir esse objetivo, a manipulação e a violência são as armas preferidas dos donos do poder.

A importante manifestação popular realizada em Brasília no último dia 24 de maio foi duramente reprimida pelas forças de segurança e Michel Temer chegou a editar um decreto, depois revogado, autorizando o emprego das Forças Armadas para garantia da lei e da ordem durante os protestos na Esplanada dos Ministérios.

No mesmo dia, enquanto em São Paulo, por ordem do governo estadual e municipal, desenrolavam-se cenas de terror com a prisão e expulsão de moradores da região da Cracolândia, na cidade de Redenção, no estado do Pará, no cumprimento de um mandado de reintegração de posse, onze trabalhadores rurais foram barbaramente assassinados pela polícia.

Diante deste momento crucial da história do Brasil, para evitar retrocessos ainda mais profundos e para reconquistar a democracia, o que nosso tempo exige das forças progressistas é a unidade e a capacidade de agir, nas ruas e nos corações, exigindo a realização de eleições Diretas Já!

Giane Ambrósio Álvares é advogada, mestre em Processo Penal pela PUC/SP e membro da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares. Escreve na Coluna ContraCorrentes, aos sábados, junto a Patrick Mariano, Rubens Casara, Marcelo Semer e Marcio Sotelo Felippe.

Após a revelação da delação premiada do diretor da JBS, manifestantes pedem diretas já na Avenida Paulista, em São Paulo. Foto: Jornalistas Livres

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