Na Folha
Já que Michel Temer vive dias tão calorosos, sob mais acusações na semana encerrada e julgamento na que começa, vale retomar um tema suplantado, apesar da importância, pela autenticidade ou trucagem da gravação de Joesley Batista nos porões da noite presidencial. A essa dúvida, a perícia da Polícia Federal promete responder. O objeto da recomendação de Temer a Joesley, porém, ficou como questão em aberto.
O trecho crucial, exposto na íntegra da gravação publicada pela Folha em 22 de maio, é este:
“Joesley: […] Negócio dos vazamentos do telefone lá … do Eduardo, com Geddel, volta e meio citava alguma coisa meio tangenciando a nós, a não sei o quê. Eu tô lá me defendendo. [inaudível] como é que eu … quê que eu mais ou menos dei conta de fazer até agora? Eu tô de bem com Eduardo.
Temer: É, tem que manter isso, viu? [fica inaudível]
Joesley: [inaudível] todo mês.”
As deduções proporcionadas por esse trecho se dividiram. “O Globo” lançou, já na notícia inicial sobre a gravação e transcrevendo o trecho, o entendimento de que Temer se refere aos pagamentos de Joesley a Eduardo Cunha, como compra de silêncio. De outra parte, inclusive na Folha, o trecho foi dado como referência obscura, imprecisa entre incentivo aos pagamentos ou a continuar “de bem”.
Os dois protagonistas também se manifestaram: Joesley, em depoimento a procuradores da Lava Jato, quando falava dos pagamentos a Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, e sobre a conversa a respeito com Temer: “Eu ouvi do presidente, claramente, que era importante manter isso”. A afirmação é repetida adiante, duas vezes no mesmo trecho do depoimento.
Temer, um tanto exaltado, na sua primeira contestação em TV: “Repito e ressalto, em nenhum momento autorizei que pagasse a quem quer que seja para ficar em silêncio”. E ainda: “Ouvi realmente o relato de um empresário que, por ter relação com ex-deputado, auxiliava a família do ex-parlamentar. Não solicitei que isso acontecesse e somente tive conhecimento desse fato nessa conversa pedida pelo empresário”.
Temer contesta o que não foi dito: ninguém lhe atribuiu autorização nem solicitação alguma. E dá aos pagamentos feitos por Joesley uma finalidade que o corruptor não mencionou na conversa gravada. Voltaria à contestação direta, no entanto formal, escrita com jeitão de assessoria.
Fosse um presidente isento de suspeitas e de referências acusadoras, saber se incentivara pagamento ou relação pessoal poderia merecer cautelas contemporizadoras.
Michel Temer é uma pessoa sob investigação da Polícia Federal, pretendendo escapar de um interrogatório decidido pelo Supremo Tribunal Federal, e sujeito a outras possíveis investigações criminais.
Se não pôde ou não quis enfrentar o interrogatório sem antes tentar burlá-lo, sabe-se o que leva a atitudes assim. Daí que a questão em aberto precisa ser reposta, pelo que pode dizer a respeito de um presidente que precisa ou não do silêncio de acusados de gravíssimas ilicitudes.
A percepção do “Globo”, a meu ver, não estava errada. Por isto: Joesley Batista estava “de bem” com Eduardo Cunha em razão de pagamentos (“todo mês”?); logo, manter-se “de bem” era manter os pagamentos.
Portanto, a recomendação de Temer, estivesse dirigida a manter os pagamentos ou a manter-se “de bem”, dizia a mesma coisa, buscando o mesmo fim.
Como os pagamentos e estar “de bem” não tinham outro propósito senão o de comprar o silêncio de Eduardo Cunha (e o de Lúcio Funaro, este ao custo de R$ 400 mil por mês), cabe ao Supremo, à Polícia Federal e à Lava Jato explicar por que Joesley Batista e Michel Temer encontravam-se com igual necessidade.
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Foto: Marcelo Camargo, Ag. Brasil