Para o órgão do Ministério Público Federal, alterações propostas são inconstitucionais e não resultarão em melhorias na segurança pública
PFDC/MPF
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) – órgão do Ministério Público Federal – encaminhou nesta quinta-feira (26) ao Congresso Nacional nota técnica (acesse aqui) em que se posiciona contra a redução da maioridade penal e o aumento do tempo de internação de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. O documento deve subsidiar a análise dos projetos de lei sobre o tema que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, assim como da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 33/2012, que também está na casa legislativa.
As proposições buscam alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei n. 12.594/2012 em relação à aplicação de medidas socioeducativas aos adolescentes autores de atos infracionais, modificando também, dentre outros aspectos, o aumento do tempo de internação em regime especial para infrações análogas a crimes hediondos.
Para a Procuradoria dos Direitos do Cidadão, além de inconstitucionais, as medidas propostas não resultariam em melhorias na segurança pública, considerando o diminuto número de crimes cometidos pela população juvenil, em comparação aos praticados por adultos – especialmente aqueles contra a vida, a integridade física e o patrimônio.
Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam, por exemplo, que dos 21 milhões de adolescentes que vivem no Brasil, menos de meio por cento (0,013%) já cometeu ato contra a vida ou a integridade física (homicídio, latrocínio, estupro ou lesão corporal). Ainda de acordo com o órgão, dentre os adolescentes que cometeram atos infracionais, apenas 9% são análogos ao crime de homicídio, e apenas 2,13%, ao de latrocínio.
“O conjunto de estudos e pesquisas revelam que, em regra, os adolescentes no Brasil têm sido mais vítimas de violência do que autores. Entre a década de 1980 e o ano de 2014, por exemplo, a taxa de mortalidade por armas de fogo contra o conjunto da população cresceu 346,5%, enquanto para a população jovem o aumento foi de 414%. Além disso, há um recorte de raça que não pode ser ignorado: morrem 133% mais negros do que brancos”, destaca a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, que assina a nota técnica.
Justiça penal juvenil – O documento elaborado pelo órgão do Ministério Público Federal também elenca uma série de estudos que apontam que no Brasil a justiça penal juvenil tende a aplicar sanções de forma mais dura do que a justiça penal comum. É o que revela levantamento do Ipea, de 2013, segundo o qual do total de 23,1 mil adolescentes privados de liberdade no Brasil naquele ano, 64% cumpriam medida de internação, 23,5% cumpriam medida de internação provisória, 9,6% em semiliberdade e apenas 2,8% cumpriam medida em liberdade.
Os números vão na contramão do que determina o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescentes que pratiquem ato infracional e que tem como princípio nuclear a natureza pedagógica da medida socioeducativa – priorizando seu cumprimento, portanto, em meio aberto, como a liberdade assistida e semiliberdade.
Para a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, a efetiva implementação do Sinase constitui o efetivo desafio que se coloca aos poder público. “O investimento em medidas de cumprimento em meio aberto, que ofereçam atividades educacionais, esportivas, culturais e profissionais, a manutenção de intercâmbio com a comunidade local, o oferecimento de programa de apoio aos egressos e suas famílias, é, ainda hoje, bastante escasso. Apesar dessas dificuldades, o Sinase ainda apresenta índices de reincidência melhores do que o sistema penal para adultos. Esse deve ser o compromisso e o investimento a ser feito na justiça criminal”, reforça a nota técnica da PFDC.
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