Por Bernardo Barbosa*, no UOL
O juiz federal Bruno Apolinário decidiu, nesta sexta-feira (2), pela devolução do passaporte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acatando em caráter liminar pedido de habeas corpus da defesa do petista. O magistrado, que foi convocado para atuar no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região, sediado em Brasília), também determinou que o nome de Lula seja retirado do Sistema Nacional de Procurados e Impedidos da Polícia Federal.
Em sua decisão, Apolinário disse que “não há como concluir que o paciente pretendesse fugir do país com a finalidade de frustrar a aplicação da nossa lei penal”, considerando que Lula e seus advogados comunicaram as autoridades sobre a viagem que o petista faria a Etiópia no dia 26, dois dias depois de ter sido condenado em segunda instância no chamado caso do tríplex. O ex-presidente participaria de um evento organizado pela União Africana.
“Ao contrário, percebe-se na conduta do paciente o cuidado de demonstrar, sobretudo ao Poder Judiciário, que sua saída do país estava justificada por compromisso profissional previamente agendado, seria de curta duração, com retorno predeterminado, e que não causaria nenhum transtorno às ações penais às quais responde perante nossa justiça, uma vez que nenhum ato processual que demandasse a sua presença estava previsto para ocorrer no período de sua ausência”, diz o juiz.
Em tal contexto, somente com um grande exercício de imaginação poder-se-ia chegar à conclusão lançada na decisão [risco de fuga] ora rebatida pelos impetrantes (Juiz federal Bruno Apolinário)
Lula foi proibido de deixar o país e foi intimado a entregar seu passaporte para a PF (Polícia Federal) no dia 25 de janeiro. A ordem judicial foi proferida pelo juiz substituto da 10ª Vara Criminal do Distrito Federal, Ricardo Augusto Soares Leite, um dia após o julgamento do caso do tríplex.
Além de ter o passaporte apreendido, Lula também teve seu nome incluído no Sistema de Procurados e Impedidos, uma espécie de banco de dados da PF que registra os dados de pessoas que não podem entrar ou sair do Brasil por razões judiciais –essas informações podem ser consultadas por agentes policiais em aeroportos e fronteiras, por exemplo.
Em maio do ano passado, Leite determinou a suspensão das atividades do Instituto Lula, com o argumento de que a instituição poderia ser usada como “local de encontro” para a prática de crimes. Na ocasião, o juiz adotou a medida por iniciativa própria, sem ter havido pedido do MPF. A decisão foi posteriormente revogada na Justiça, com parecer do MPF contrário à decisão de Leite.
“Extrema abstração”
A decisão de Ricardo Leite atendeu a um pedido do MPF (Ministério Público Federal) relativo ao processo que apura o suposto pagamento de propina a Lula na venda de caças para a FAB (Força Aérea Brasileira). O magistrado justificou a decisão alegando que haveria o risco de Lula “fixar residência” em outro país.
Ao julgar o recurso da defesa de Lula, o juiz Apolinário disse que Leite “não especificou na decisão onde, quando e quem teria cogitado a solicitação de asilo político” em favor de Lula, “o que expõe a extrema abstração da afirmação.”
Ainda segundo a decisão do magistrado de segundo grau, críticas feitas por Lula ao Poder Judiciário não podem “conduzir à conclusão de que ele estaria pretendendo se evadir do Brasil e solicitar asilo político noutro país.” Segundo Apolinário, “trata-se de uma conjectura do magistrado desprovida de demonstração concreta desse suposto intento do paciente.”
Apolinário também diz que não cabe a um juiz do Distrito Federal tomar decisões para garantir o cumprimento de ordens da Justiça Federal do Paraná e do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), onde Lula foi condenado, respectivamente, em primeira e segunda instâncias.
“Qualquer providência de natureza preventiva destinada a garantir a efetividade de condenações criminais oriundas daqueles órgãos jurisdicionais deve ser por eles decretada, não cabendo a nenhum outro juízo federal singular ou Tribunal Regional Federal a competência para esse fim”, escreveu o juiz.
Segundo o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, “a decisão proferida hoje pelo Tribunal Regional Federal da 1a. Região corrige uma violação à garantia constitucional de ir e vir que havia sido imposta indevidamente ao ex-presidente Lula pela Justiça Federal de Brasília”.
Segundo a decisão do TRF-4, Lula deverá ser preso após o julgamento dos recursos disponíveis na própria segunda instância, o que a defesa do ex-presidente tenta impedir no STJ (Superior Tribunal de Justiça). A condenação também torna Lula inelegível, em tese, pelos critérios da Lei da Ficha Limpa. O ex-presidente foi o líder da pesquisa de intenção de voto divulgada pelo Datafolha na quarta (31).
*Colaborou Ana Carla Bermúdez, de São Paulo
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Foto: Raquel Wandelli