Guerrilha do Araguaia: MPF cobra providências do Amapá sobre localização de guerrilheiros desaparecidos

Conforme relatório da Comissão Estadual da Verdade, corpos de desaparecidos políticos podem estar enterrados no Estado

Ministério Público Federal no Amapá

O Ministério Público Federal (MPF) requisitou informações ao Governo do Amapá sobre a busca por desaparecidos políticos durante a Guerrilha do Araguaia, ocorrida entre as décadas de 1960 e 1970. Segundo relatório final da Comissão Estadual da Verdade (CEV), corpos de guerrilheiros podem ter sido enterrados na vila de Clevelândia do Norte, em Oiapoque, a cerca de 600 quilômetros da capital Macapá. A localização de vítimas desaparecidas durante a ditadura militar é uma das obrigações impostas ao Brasil em sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Segundo o documento da CEV, o governo do extinto Território Federal do Amapá, possivelmente, colaborou com a ocultação de cadáveres durante o período de repressão. Depoimentos de familiares de vítimas e de militares, colhidos pela comissão, indicam que existia em Oiapoque um cemitério clandestino onde podem estar enterradas vítimas de execuções durante a Guerrilha do Araguaia. Sobre o assunto, o MPF também solicitou à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos do Ministério dos Direitos Humanos informações sobre eventuais medidas para busca diante da possível localização de corpos de guerrilheiros.

Além da busca por desaparecidos, o MPF cobra do Estado o atendimento a outras recomendações da CEV. Ao todo, são 16 propostas direcionadas ao Poder Executivo que visam prevenir a ocorrência de novas violações aos direitos humanos. As orientações vão desde a formação de servidores em Direitos Humanos até o pedido formal de desculpas às vítimas da ditadura pelo Estado.

Pedido de desculpas – No ofício ao Governo do Estado, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão requisita informações sobre o pedido formal de desculpas às vítimas de violações e aos seus familiares. “Tal pedido de desculpas deve contemplar não apenas as pessoas que sofreram abusos físicos e seus familiares, mas deve ser estendido aos servidores que sofreram perseguição, coação, constrangimento, demissão ou exoneração por razões políticas, bem como àqueles que tiveram suprimido seu direito à livre manifestação”, salienta trecho do relatório.

Em 2010, ao julgar o caso Gomes Lund – militante político morto durante a Guerrilha do Araguaia –, a CIDH decidiu que a Lei da Anistia é inválida para casos de graves violações aos direitos humanos. Na última semana, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e a Câmara Criminal do MPF declararam que o Brasil é o único país do continente que, após ditadura ou conflito interno, protege os autores de graves violações aos direitos humanos com uma Lei de Anistia.

A declaração consta em nota pública emitida após o governo dos Estados Unidos revelar documento, de 1974, que comprova a prática de crimes contra a humanidade pela ditadura brasileira. “O documento do governo americano, ao revelar nova evidência de que a repressão política pela ditadura militar incluiu uma política de extermínio de opositores do regime, convida para uma resposta breve do Estado brasileiro em favor da promoção da justiça”, frisa o MPF. O órgão entende que crimes contra a humanidade não são passíveis de anistia, tampouco estão sujeitos à prescrição.

Memória – Segundo o relatório da CEV, a Fortaleza de São José de Macapá e o Museu Joaquim Caetano, onde funcionou a Delegacia de Investigação e Captura, eram locais de prisão e tortura durante a ditadura militar. A CEV recomendou que, em ambos, sejam instaladas marcas de memória, por meio de placas de fácil visibilidade, que os identifique como espaços onde ocorreram graves violações aos direitos humanos. Na Fortaleza, deveria ser instalado o Memorial da Verdade.

O Estado também precisa criar o centro de memória e verdade onde será exposto o trabalho da CEV, especialmente material audiovisual. O local, pensado para ser aberto à visitação, também pode vir a receber produções culturais, sala de cinema e espaço para exposições especialmente sobre direitos humanos.

Em outras duas recomendações, a CEV orienta a formação em Direitos Humanos especialmente para policias militares e civis. Também devem ser incluídos no currículo escolar dos ensinos fundamental e médio esclarecimentos sobre as violações cometidas na ditadura. “Passadas mais de três décadas desde o início do processo de redemocratização, pouco se estuda, ainda, sobre as violações aos direitos humanos cometidas pela repressão”, pontua o relatório final da CEV.

Imagem: A guerrilha do Araguaia é um dos episódios mais violentos da ditadura. Na foto, refeitório improvisado de militares. (Foto: Arquivo Nacional)

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