Vendo Harry e Meghan, deu vontade de ter um rei no Brasil. José Mujica? Por Leonardo Sakamoto

No blog do Sakamoto

Aproveitando o casamento real britânico, monarquistas defenderam o retorno dessa forma de governo nesta parte dos trópicos. A começar pelos herdeiros de Pedro II, há brasileiros que acreditam que o país seria mais ”estável” e ”moderado” se tivesse uma chefia de Estado vitalícia e hereditária.

Eu até toparia. Mas só se for para ter como soberanos pessoas como Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia, ou José Mujica (não me importo em ser anexado pelo Uruguai – se passarem a valer algumas das leis de lá). O problema é que ambos, uma vez entronados, adotariam como primeiro ato a Proclamação da República.

Um jornalista, cujo nome à memória me escapa agora, disse que a principal função da maior parte das monarquias europeias, nos dias de hoje, é pão e circo. Ou, mais precisamente no caso inglês, gerar conteúdo para vender tabloides e girar a economia. Porque um casamento pode ser, mais do que um símbolo, um bom negócio.

É claro que há razões para a manutenção de um chefe de Estado vitalício ou mesmo hereditário com mínimos poderes em um governo parlamentarista.

E, de todas as justificativas, o custo de mudança do sistema talvez seja uma das conhecidas. Alterar um ”time que está ganhando”, se há estabilidade no atual modelo, é interessante? Os ganhos políticos e econômicos da mudança do sistema são maiores do que pagar imposto às majestades?

Particularmente, acho qualquer monarquia em um Estado moderno algo que se perdeu no tempo. Como o dente do siso. E não estou falando das absolutistas. Nesses casos, o remédio é uma boa revolução popular – desde que não implantada uma ditadura no lugar, é claro. Coisa que, sabemos bem, é muito fácil acontecer.

Há quem sugira – em nome do luxo e da glória – um novo plebiscito. Naquele ocorrido em 1993, 10,2% votaram pela volta dos monarcas – ou seja, 6.843.196 pessoas. Levou um pescotapa da República (essa maltratada e incompreendida), com 66% – ou 44.266.608 votos. Foram 10,5% de brancos e 13,2% de nulos. E um baixo comparecimento nas urnas – 25,7% de abstenção.

Saber que 10% do país votou a favor de botar uma coroa na cabeça de alguém é assustador.

Mais assustador ainda é imaginar – caso o plebiscito ocorresse hoje e rolasse uma reviravolta – o que aconteceria quando o MDB e o STF tivessem que entregar a Regência.

Se eu fosse Deus (se eu fosse?) e pudesse indicar monarcas, colocaria os sobreviventes do Monty Phyton para chefiar o Reino Unido. E o pessoal do Porta dos Fundos, do Tá no Ar, do Zorra e do Choque de Cultura para ocupar o Planalto e a chefia do parlamento.

Certamente não iriam para um safari na África para caçar elefantes em Botsuana, como fez o então rei Juan Carlos em plena crise econômica espanhola. Ele, que é considerado como peça importante na transição da ditadura para a democracia em seu país, resolveu despirocar. Abdicou em nome de seu filho. E milhares de espanhóis aproveitam para ocupar as ruas, pedindo a República. Chorei de emoção.

Mais cedo ou mais tarde, tenho fé que a história humana, através da ação consciente, dialogada e pacífica de seus membros, fará com que entendamos que todos deveríamos nascer iguais. E isso tratará de substituir a monarquia pela res publica em todas as partes do planeta.

O que deve acontecer um pouco depois de nos matarmos.

O ex-presidente uruguaio José Mujica e seu fusca azul. Foto: Natacha Pisarenko /AP

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