Agrogolpe

Os interesses da bancada ruralista no golpe está ligada a seus interesses políticos de classe.

Marco Mitidiero*, Brasil de Fato

Uma dimensão pouco explorada sobre o golpe parlamentar/jurídico/midiático que implodiu a democracia brasileira foram as características agrárias que permearam as ações e estratégias que culminaram na retirada da presidenta eleita Dilma Rousseff.

Se está clara e evidente a participação dos industriais (com destaque para a FIESP), do capital bancário financeiro e do capital e diplomacia internacionais (com destaque os EUA), torna-se mais claro ainda o papel de soldados de infantaria dos parlamentares que compõem a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a “popular” Bancada Ruralista, na sustentação dessa tragédia política que estamos vivendo.

O jornalista Alceu Castilho, do observatório De Olho nos Ruralistas, contabilizou a participação dos deputados da Bancada Ruralista nas principais votações que primeiro sedimentaram e depois asseguraram o golpe de Estado. Metade dos votos a favor do processo de impeachment, ou seja, 50% dos parlamentares votantes, foram da FPA. Nas duas votações para abertura de processo de corrupção e afastamento de Michel Temer, 51% na primeira e 55% na segunda votação foram votos de ruralistas que ajudaram a impedir abertura de processo contra Michel Temer e o asseguraram na cadeira de presidente.

Qual é a explicação para o setor da economia que mais cresceu, que mais obteve apoio e recursos governamentais, batendo recordes de lucros durante o período do PT no poder central, a votar contra esse governo? O que fez a FPA ser peça chave na derrubada de um governo que lhe era subserviente? Seria uma contradição máxima?

O agronegócio estaria votando contra ele mesmo? Muitas são as possibilidades de explicação dessa contraditória posição, mas nenhuma delas pode abstrair o caráter de classe do golpe. Os ruralistas, mesmo travestidos de moderno agronegócio, representam uma classe conservadora, tradicional e oligárquica, que na ruptura da democracia se posicionaram do lado da sua classe. O golpe foi uma brecha para querer mais. Nessa conjuntura de maldades contra os pobres brasileiros, a FPA quer o fim da reforma agrária, das demarcações de terras indígenas e quilombolas, e minimizar ao máximo as proteções dos espaços naturais. Esses fatos transformam o impeachment, que foi golpe, em Agrogolpe.

*É doutor em Geografia e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

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