Incra revoga Resolução nº 12, mas luta Mesquita continua

Por Daiane Souza

Após duros embates nas últimas semanas o Quilombo Mesquita, situado na divisa do Distrito Federal com o município de Cidade Ocidental em Goiás, conseguiu reverter a decisão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – Resolução nº 12 de 17 de maio de 2018 – quanto à redução de seu território de 4,2 mil para 971,4 hectares.

A conquista foi alcançada graças aos apoios de instituições defensoras da causa quilombola, de movimentos sociais, de ONGs e de órgãos governamentais, como o Ministério Público Federal (MPF), que se manifestaram contra a medida a qual julgaram como atuação ilegal, criminosa e autoritária por parte do Incra.

Na última quarta-feira (21 de junho), lideranças do Quilombo Mesquita, acompanhadas de representantes da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), estiveram no Instituto com o objetivo de participar de reunião do Comitê Diretor que avaliou o caso.

Nenhum palmo de terra a menos 

De acordo com José Roberto Teixeira Braga, uma das lideranças da comunidade, em algum momento o Incra chegou a propor a elaboração de um novo Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID). “Já abrimos mão de muita terra para que o processo caminhe. Queremos o que é necessário para viver a realidade de hoje. Se for para começar do zero, vamos querer de volta a terra do tamanho que era antigamente, com os cerca de 9 mil hectares que é nosso, de direito”, defendeu.

Para Manoel Neres, do Coletivo Verdade Negra (CVN), a ideia de um novo estudo é mais absurda que a Resolução revogada. “Foram praticamente 13 anos de processo e de estudos para esta gestão do Incra fazer o que está fazendo. Significa deslegitimar o trabalho dos profissionais competentes que tem e a sua credibilidade institucional”, disse. Sandra Braga, liderança Mesquita, complementou recordando que os posicionamentos da instituição vão contra a normativa legal do próprio Incra, o regimento da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Decreto 4887/2003, que teve sua constitucionalidade aprovada praticamente por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal em 08 de fevereiro de 2018.

Avaliações críticas 

Na visão do MPF não há razão para o Incra voltar atrás de uma decisão que ele próprio tomou com base em estudos realizados por funcionários capacitados e comprometidos, dispondo de recursos públicos e que na qual não apresentou, em momento algum, qualquer posicionamento técnico contraditório.

De acordo com a Conaq, a atuação do MPF foi fundamental, pois, a Resolução nº 12 de 17 de maio de 2018 representou um grande risco aos quilombos de todo o país. Seria um precedente legal à redução de territórios quilombolas nos moldes da derrotada Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, também julgada como improcedente pelo STF por prever o marco temporal da Abolição como quesito à posse de terra.

Givânia Maria da Silva, coordenadora nacional da Conaq, ressalta que a vitória do Quilombo Mesquita representa um marco importante, resultante da mobilização quilombola. “A anulação da Resolução foi a melhor saída para a solução deste caso, já que ela foi feita com o único e exclusivo objetivo de prejudicar a vida do povo quilombola. Porém não é uma vitória que nos dá condições de sossego”, alertou recordando que o país vive um Estado de excessão num governo de golpe. “Este governo não tem qualquer compromisso com a população de modo geral, mas de forma particular com os negros e com as mulheres. Precisamos continuar vigilantes e atuantes”, enfatizou.

Histórico 

A denúncia referente à redução do território Mesquita foi oficializada pela Conaq durante a 14ª Mesa Nacional Quilombola, ocorrida no território Kalunga, em Cavalcante – GO, em 24 de maio de 2018, mesma data em que a Resolução foi publicada no Diário Oficial da União. Investigação realizada pela Polícia Federal (PF) confirmaram o esquema de lobby envolvendo o deputado Jovair Arantes e seu sobrinho Rogério Arantes – ex-diretor do Incra preso em junho – em benefício do senador José Sarney.

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