Indígenas guarani apresentam cápsulas e bala ao MP Federal e relatam ameaças

Por Marco Weissheimer, no Sul21

O Procurador da República Pedro Nicolau, do Ministério Público Federal de Porto Alegre, esteve neste sábado (12) na Retomada Guarani Mbya da Ponta do Arado, bairro Belém Novo, Porto Alegre, para conversar com a comunidade e colher maiores informações sobre o episódio do ataque a tiros e ameaças de morte contra a comunidade, na madrugada de sexta-feira (11).

Durante a visita do procurador, os indígenas relataram os fatos ocorridos e apresentaram cápsulas e bala de pistola que ficaram na areia da praia localiza em frente aos barracos onde vivem os indígenas. Segundo os indígenas, esses artefatos foram encontrados depois que a Polícia Civil esteve na área fazendo a perícia. Os policiais também encontraram cápsulas de arma de fogo deflagrada. Ainda segundo os indígenas, soldados da Polícia Militar estiveram no local neste sábado e disseram para a comunidade para que não cruzassem a cerca instalada no local pelo empreendimento imobiliário Arado Velho.

Para Roberto Liebgott, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi-Sul), a cerca é uma ilegalidade contra a comunidade, pois a obriga a viver em espaço limitado, sem acesso a estrada e a água potável. A empresa, assinala Liebgott, mantém guardas de segurança privada ao lado dos barracos dos indígenas durante as 24 horas do dia. Além disso, colocaram sobre a cerca sensores eletrônicos com o objetivo de controlar os movimentos dos Guarani. Na comunidade vivem cerca de 30 pessoas.

Neste domingo, a partir das 15h, ocorrerá uma vigília na praça central de Belém Novo em apoio à retomada Mbya Guarani na Arado Velho. Haverá coleta de alimentos que serão doados à retomada, em especial açúcar, arroz, mandioca, café, feijão, batata doce, erva mate, moranga e farinha de milho.

O Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Sul (CEDH-RS) divulgou nota neste sábado [abaixo], manifestando grave preocupação com o que define como “graves fatos ocorridos no Ponta do Arado Velho”. O CEDH-RS assinala que a situação “é objeto de processo judicial em curso e que há determinação judicial autorizando a permanência da Comunidade Guarani na área que ocupa”. Além disso, pede às autoridades, especialmente da Segurança Pública, para que “sejam adotadas as imediatas e urgentes medidas necessárias à preservação das vidas e da segurança de todas e todos integrantes daquela Comunidade Indígena”.

Na sexta-feira, a Arado Empreendimentos Ltda. divulgou nota afirmando que ˜está buscando informações acerca do que possa ter ocorrido e se efetivamente ocorreu, registrando que os funcionários da Fazenda não ouviram qualquer barulho anormal durante a noite”. “Por ser proprietária da área e ofendida diante da invasão ilegal que está em curso, a empresa é a maior interessada na elucidação dos fatos e na verificação acerca de efetivamente ter ocorrido algum incidente análogo ao que vem sendo divulgado”, diz ainda a nota.

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Nota pública sobre questão indígena no Arado Velho

Conselho Estadual de Direitos Humanos

O Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Sul (CEDH-RS) toma em conta com grave preocupação os graves fatos ocorridos no Ponta do Arado Velho, Belém Novo, Porto Alegre, RS, já reportados pela comunidade indígena atacada e amplamente divulgados pela imprensa e que dão conta de que na madrugada do dia hoje, 11/01/2019,  pessoas encapuzadas e municiadas de armas de fogo dispararam em direção à Comunidade Indígena Guarani composta por homens, mulheres, pessoas idosas e crianças,  seguida de ameaças de morte a todas as pessoas integrantes daquela comunidade, caso não se retirassem até domingo, dia 13/01/2019,  da área que ocupam.

O CEDH-RS lembra que os fatos narrados constam da Ocorrência Policial n.º 105/2019 feita junto à 7ª Delegacia de Polícia, de Porto Alegre e já comunicados ao Ministério Público Federal (PPF) em reunião realizada em 11/01/2019, na sede daquele Órgão, com a presença, além da representação deste Conselho, de integrantes da Comunidade Guarani, do Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI), do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e de representante dos Apoiadores da Retomada Guarani da Ponta do Arado.

O CEDH-RS alerta que a situação é objeto de processo judicial em curso e que há determinação judicial autorizando a permanência da Comunidade Guarani na área que ocupa. Diante da gravidade da situação configurada, ao mesmo tempo que expressa preocupação e alerta para os iminentes riscos envolvidos, sugere às autoridades competentes, especialmente da Segurança Pública, que, para além das providências que serão tomadas pelo Ministério Público Federal, sejam adotadas as imediatas e urgentes medidas necessárias à preservação das vidas e da segurança de todas e todos integrantes daquela Comunidade Indígena bem como, também com a urgência que o caso requer, sejam providenciadas medidas para investigação e punição dos responsáveis diretos e indiretos nas esferas cível e penal, de maneira a fazer cessar os atos de violência que vêm tomando proporções crescentes.

O CEDH-RS reafirma a necessidade de observância dos princípios constitucionais, dos direitos e individuais e coletivos, dos direitos sociais e dos direitos dos povos indígenas, bem como às disposições convencionais os Atos Internacionais relativos aos povos indígenas e o dever de observância a tais direitos e princípios, por parte do Estado e da sociedade. Preservar todos os direitos humanos de todas e todos é responsabilidade inarredável no Estado Democrático de Direito.

Porto Alegre, 12 de janeiro de 2019.

PAULO CÉSAR CARBONARI
Presidente do CEDH-RS 

Famílias da Retomada Guarani-mbya no Arado Velho vivem constantemente vigiados por guardas. Foto: Giovana Fleck /Sul21

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