Multinacional tem sido questionada pelas comunidades locais por suas práticas contra trabalhadores e comunidades
Marcos Hermanson, Brasil de Fato
Os moradores das cidades mineiras de Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas – onde se localiza o megaempreendimento de extração de ferro Minas-Rio – se manifestaram nesta quarta-feira (30) pelo imediato reassentamento de aproximadamente 400 pessoas que atualmente vivem no entorno das barragens de contenção de rejeitos.
O Minas Rio pertence a mineradora Anglo American e começou a operar em 2014, apesar de ter recebido as primeiras licenças em 2007. Hoje é o maior projeto em expansão em Minas Gerais, e conta com mina, estrutura de beneficiamento, barragem e um mineroduto de 529 km, que corta 23 municípios até o Porto do Açu, no Rio de Janeiro.
“Como o projeto está em expansão, eles estão ampliando a barragem de rejeitos, fazendo detonações em cima de várias comunidades vizinhas: Água Quente, São José do Jassém, Passa Sete, Turco, Cabeceira do Turco, Sapo, Gondó e Beco. Já tem anos que as comunidades lutam para serem reassentadas”, conta Juliana Deprá, da Coordenação Estadual do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM).
A principal barragem da Anglo American, instalada na região da comunidade do Sapo, tem aproximadamente 25 milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro. O projeto da terceira fase do Minas-Rio inclui o alteamento da barragem. Ela subiria dos atuais 40 metros para 60 metros.
“Quando teve o rompimento da barragem de Fundão [em Mariana, 2015], isso mobilizou muito. Houve várias audiências públicas de diálogo com a empresa e o Estado sobre a necessidade de reassentar essas famílias. Só que até hoje nada foi feito, então quando acontece o crime de Brumadinho, as famílias ficam desesperadas e resolvem sair às ruas para demarcar, dizer que estão em luta e que suas vidas estão em risco”, conta Deprá.
Manifestantes relataram que a marcha, iniciada no meio da madrugada, foi reprimida pela polícia com retirada das barricadas dispostas na pista e ameaças de alvejamento com balas de borracha.
No ano de 2016, a Anglo American registrou lucro líquido de R$ 6,7 bilhões no mundo todo. No Brasil, além do projeto Minas-Rio, ela detém negócios de extração de níquel em Goiás.
Em 2017, reportagem do Brasil de Fato mostrou que a mineradora tem histórico de trabalho escravo em suas operações no país. Em 2009, seis mil operários que trabalhavam na construção do projeto se rebelaram contra as condições insalubres de trabalho. A empresa foi condenada em 2013 por submeter 173 trabalhadores a condições análogas à escravidão. Um ano depois, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagrou outras 67 pessoas na mesma situação nos canteiros de obras.
Em seu site oficial, a Anglo American afirma o seguinte sobre sua relação com as comunidades afetadas pela atividade da companhia: “Para serem produtivas, seguras, responsáveis e sustentáveis, nossas operações devem estar ao lado de comunidades prósperas. Por isso, trabalhamos em conjunto com o governo local, líderes comunitários e ONGs para contribuir para as necessidades da comunidade: isso vai desde habitação e infraestrutura até saúde, educação e lazer”.
Deprá, no entanto, conta que, na prática, a postura da multinacional é outra. Em relação à demanda de reparação de danos do projeto Minas-Rio, como falta de água, excesso de poeira, tremores, mau cheiro e degradação dos cursos d’água ela conta que a empresa “fez uma proposta de negociação individual com as famílias, sem garantir uma série de direitos e reparação dos danos que elas vêm sofrendo desde 2007. As famílias reivindicam o direito a uma assessoria técnica para fazer um processo coletivo de levantamento de danos. Essa foi uma condicionante do licenciamento que vai garantir a exploração da região por mais 28 anos. Essa assessoria deveria ter sido contratada em abril de 2018 e até agora nada foi encaminhado”.
“A empresa tem se utilizado da estratégia de assediar famílias, pressionar pela negociação individual, e são famílias com pessoas idosas, camponesas, comunidades que são tradicionais ou quilombolas”.
Em 2017, O Ministério Público Estadual solicitou a inclusão das lideranças no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos e instaurou um Procedimento Investigatório Criminal na Promotoria de Justiça para apurar “autoria e materialidade das ameaças”. Em resposta ao The Intercept, a Anglo American afirmou que “não realiza ou participa de atos de intimidação de ativistas e lideranças locais e busca uma relação de boa convivência e ganhos mútuos com as comunidades na qual está inserida” e “condena qualquer forma de assédio ou violência”.
Ao DeFato Online, a empresa respondeu sobre as manifestações desta quarta (30), que está disposta ao diálogo com as comunidades: “A Anglo American preza pelo relacionamento com as comunidades vizinhas aos seus empreendimentos e mantém diálogo constante. A empresa reafirma sua disposição para encontrar soluções consensuais que garantam a segurança e a qualidade de vida dos moradores”.
Edição: Mauro Ramos.
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Imagem: Comunidades de Conceição do Mato Dentro protestam contra Anglo American em 2015 / Arquivo REAJA