Ação coletiva para gestão de resíduos é tema de debate no Complexo do Alemão

Por Daisy Longden, no Rio On Watch

No sábado, 23 de fevereiro, o Instituto Raízes em Movimento, organização comunitária de desenvolvimento social e cultural do Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro, sediou o evento “O Lixo: Políticas e Desafios“, reunindo moradores e palestrantes convidados para tratar da questão do lixo localmente, nas favelas, e em um contexto global. O evento teve como foco os impactos socioculturais dos resíduos e como, por sua vez, as dimensões socioculturais podem fazer parte da solução. Vinte moradores participaram do debate, realizado ao ar livre em frente da sede do Raízes no Alemão, para enfrentar o desafio cada vez mais urgente do lixo urbano.

A discussão, que fazia parte do projeto Vamos Desenrolar—uma iniciativa com o objetivo de promover a discussão sobre questões relevantes na comunidade, com ênfase no meio ambiente em 2018 e 2019— forneceu aos participantes o espaço para exprimir suas experiências e trocar ideias com os palestrantes convidados. Os especialistas em gestão de resíduos convidados a participar foram Dona Josefa Maria da Conceição, artesã e voluntária da organização ambiental Verdejar, que atua na região; Marcio Ranauro, antropólogo com foco em políticas públicas socioambientais;  Robson Borges, fundador da cooperativa de reciclagem Eu Quero Liberdade; e Aloísio Caetano de Carvalho, apelidado de “Sorriso” por seu carisma e sorriso contagiante, um famoso funcionário da COMLURB.

Dois pontos-chave surgiram durante a reunião de três horas. O primeiro: a necessidade de maior educação, tanto nas escolas como em toda a comunidade, para garantir que as crianças cresçam com consciência ambiental, que é crucial para as futuras gerações. De acordo com Robson—cuja cooperativa de reciclagem trabalha com indivíduos anteriormente encarcerados, reutilizando o lixo para eco construções— a educação ambiental é vital para possibilitar “uma série de benefícios, um efeito dominó” tanto local como globalmente. O segundo ponto chave: a necessidade de ação coletiva. Ricardo Moura, que trabalha com o Instituto Raízes em Movimento, concentrou-se nesse ponto, sugerindo que a mudança não virá de forças de cima para baixo, mas da própria comunidade—como é o caso de muitos dos desafios enfrentados pelos moradores do Alemão e outras favelas no Rio. Ricardo comentou: “Não podemos ter ação individual… [Para] o que fazemos aqui todos estarem conectados é fundamental”. Houve acordo sobre este ponto —a mudança positiva é essencial e deve ser liderada pela comunidade. Um morador comentou sobre a importância de discutir essas questões na comunidade: “Esse espaço é extremamente importante e necessário. Preciso estar aqui”.

Ambos os pontos centraram-se na necessidade de consciência da comunidade em torno do lixo. Discutindo a necessidade de consciência ambiental coletiva, Robson comentou: “Outras pessoas dependem da minha consciência, minha liderança, meu conhecimento”.

Robson e Aloísio falaram sobre suas experiências e trabalhos na área de gestão de resíduos. Ambos associavam a palavra “violência” à relação do Rio com o lixo. Robson descreveu o “ciclo de violência” que inclui a violência contra o meio ambiente, a violência contra a saúde pública e a violência contra as futuras gerações. Considerar o lixo como uma forma de violência reformula sua disposição inadequada como uma escolha, ou um ato deliberado (em vez de passivo), que causa danos ao indivíduo e àqueles ao seu redor. Esse entendimento fornece uma nova narrativa que pode ajudar a fortalecer a consciência ambiental que é necessária na comunidade. Ficou claro ao longo do debate que no Alemão e em outras favelas, a gestão de resíduos e o desenvolvimento humano são vistos como intrinsecamente ligados, e negligenciar um prejudica o outro.

Esta reunião ofereceu aos membros da comunidade espaço para discutir idéias e começar a enfrentar o que é um grande desafio não apenas no Alemão, mas em todo o Rio e além. Organizações como o Instituto Raízes em Movimento e eventos como esse nascem da resiliência inerente às favelas e são alimentados pela persistente necessidade de atuar coletivamente para solucionar os desafios da comunidade. A paixão e o amor dos moradores por sua comunidade ficaram evidentes durante toda a discussão. A reunião foi envolvente e inclusiva, dando origem à discussão de soluções socioambientais tangíveis e forneceu mais um exemplo da vitalidade e engenhosidade das favelas.

Moradores do Complexo do Alemão protestam pedindo paz na comunidade e justiça. Imagem: RioOnWatch

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