STF retoma julgamento sobre sacrifício de animais; CDHM reúne movimentos sociais com o presidente do Tribunal

Por Pedro Calvi, CDHM

Na noite desta quarta-feira (27), a Comissão de Direitos Humanos e Minorias e a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados promoveram um encontro entre o presidente do STF, ministro Dias Toffoli e representantes do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (FONSAPTMA), do Movimento de Juventude dos Povos Tradicionais de Matriz Africana e da Frente Parlamentar em defesa dos Povos Tradicionais de Matriz África da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.

Participaram os deputados Érika Kokay (PT/DF), Marcon (PT/RS), Benedita da Silva (PT/RJ), presidente da Comissão de Cultura,  e o presidente do colegiado, Helder Salomão (PT/ES).

A audiência foi solicitada pelos deputados Marcon e Benedita da Silva.

É que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, nesta quinta-feira (28), o recurso extraordinário 494601, que discute a validade de lei do Rio Grande do Sul sobre o sacrifício de animais em ritos das religiões de matriz africana. O julgamento deve reiniciar com o voto ministro Alexandre de Moraes que pediu vista dos autos na última sessão em que o recurso foi analisado, em 9 de agosto de 2018. Naquele dia, o relator, ministro Marco Aurélio, votou no sentido de dar à lei estadual interpretação conforme a Constituição. O ministro Edson Fachin adiantou o voto dele e reconheceu a total validade da lei gaúcha. A lei acrescentou ao Código Estadual de Proteção de Animais gaúcho a possibilidade de sacrifícios de animais, destinados à alimentação humana, dentro dos cultos religiosos africanos.

 “Nossa comissão quer dar apoio às demandas dos povos tradicionais. Viemos ao STF para defender as garantias constitucionais. Nosso papel não é discutir religião, mas direitos humanos. Outro ponto a ser considerado, é que os povos tradicionais estão inseridos no contexto da agricultura familiar, e isso também permite a criação e o abate de animais”, explica Helder Salomão.

O presidente do STF ouviu as considerações dos parlamentares e dos representantes dos movimentos sociais, e se colocou à disposição da CDHM para novos debates e encontros com representantes da sociedade civil.

“Temos línguas próprias, visão de mundo, cultura e soberania alimentar. Ou seja, somos um povo tradicional assim como os ciganos ou pomeranos. Isso significa que, no contexto da soberania alimentar, temos direito à sacralização de animais para garantir nossos ritos religiosos e a alimentação. Defendemos o abate tradicional doméstico e, claro, de acordo com cada unidade territorial tradicional”, explica Tata Edson do FONSAPTMA.  

O recurso

O recurso em análise no STF foi feito pelo Ministério Público estadual contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que declarou a constitucionalidade da Lei 2.131/2004. O MP gaúcho considera que a lei invade a competência da União para legislar sobre matéria penal, e privilegia os cultos das religiões de matriz africana para o sacrifício e ritual de animais. Ainda de acordo com o MP gaúcho, isso ofenderia a isonomia e iria contra o caráter laico do país.

Além de Tata Edson, participaram Danieli de Paula da Silva, pelo  Movimento de Mulheres dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, Itanajara Almeida, da Frente Parlamentar em defesa dos Povos Tradicionais de Matriz África da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e Janaína Pereira Bitencourt, do Movimento  de Juventude dos Povos Tradicionais de Matriz Africana.

Histórico

No dia 9 de agosto de 2018 a CDHM promoveu uma audiência pública justamente para debater o recurso que está na pauta de hoje STF.

Regina Nogueira, do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais e Matriz Africana, esteve na audiência pública e contextualizou a situação.

“Os povos resistiram com sua língua e tradições. A nossa alimentação é um ritual e também um ato doméstico, sem nenhum tipo de sofrimento animal. Queremos direito a uma alimentação de quantidade e adequada ao que acreditamos. E isso é garantir que se cumpra a Constituição brasileira.  Não queremos ser franqueados pelo Estado. Tradição alimenta, não violenta. Difícil mesmo foi ser carregado da África”, afirmou Regina.

O decreto 6.040 de 2007, do governo federal, instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT). O decreto prevê, entre outros pontos, que a visibilidade dos povos e comunidades tradicionais aconteça através do pleno exercício da cidadania, do direito à segurança alimentar e nutricional, do desenvolvimento sustentável para promover a melhoria da qualidade de vida, tanto econômica como cultural.

No Congresso Nacional tramitam quatro proposições sobre o sacrifício de animais no contexto religioso.

Foto: STF

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